Segurança alimentar: ‘Vieram no momento certo’, diz mãe de 9 filhos ao receber cesta básica em comunidade do AM

A ação foi promovida pela Organização Não-Governamental (ONG) Visão Mundial (Ana Beauvoir/Cenarium)

Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium

MANAUS — Katiana Brasil da Silva, de 35 anos, e Paulo João, de 50 anos, são pais de nove crianças e adolescentes e vivem em uma das comunidades da zona rural do município de Iranduba (a 38 quilômetros de Manaus), a São Francisco. Eles foram uma das famílias beneficiadas pelo projeto “Resposta à COVID-19 no Brasil – Amazonas unido pela prevenção“. A iniciativa, promovida pela Organização Não Governamental (ONG) Visão Mundial, doou cestas básicas, levando segurança alimentar a moradores de comunidades da região e levou mais segurança alimentar aos comunitários.

Katiana e Paulo (ao fundo) posam para foto com os nove filhos (Ana Beaouvir/Cenarium)

Há sete anos, Katiana, o marido e os filhos decidiram morar na comunidade. A família encontrou uma oportunidade no local para recomeçar após sua casa entrar em situação de risco, em Manaus, e eles precisarem sair. Atualmente, a mulher está desempregada e o sustento dela e da família vem de auxílios emergenciais, como o Bolsa Família, e dos ‘bicos‘ do marido, que trabalha como pedreiro. Com o período de chuva, no entanto, fica difícil para João pegar serviço de construção.

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“Quando morávamos em Manaus, a nossa casa era de risco e nós tivemos que abandonar rápido, pois estávamos correndo risco de vida. Recebemos um auxílio de um aluguel social, mas ficamos sem casa e tivemos que vir para cá em busca de socorro. Aqui fomos acolhidos. Não penso em voltar para Manaus não, porque onde nós conseguimos refúgio foi aqui”, contou Katiana da Silva.

A família aguardando os demais filhos chegarem da escola (Ana Beauvoir/Cenarium)

Katiana disse à REVISTA CENARIUM que ela e a família ganharam um terreno de uma igreja local para que eles pudessem se instalar. A residência de alvenaria foi construída pelas mãos de Paulo João, com a ajuda da mulher e dos filhos mais velhos. Animado, o local ainda está em acabamento e tem três cômodos, um quintal na lateral e um pátio para alojar os animais.

Para Katiana, as cestas básicas surgiram no “momento certo”, pois a falta de oportunidade no mercado de trabalho estava impactando negativamente na família. “As cestas básicas vieram no momento certo. Antes, meu marido tinha que ‘se virar’ em busca de batalha. O meu Bolsa Família também não dava e faltava o gás, faltava isso, aquilo… Tudo, e o bico que meu marido fazia de pedreiro não era suficiente para o tanto de criança que tem aqui”, lembrou.

João, de igual modo, destaca que as doações chegaram em uma ocasião muito útil. Segundo o pedreiro, a comunidade sofre com escassez e com benefícios limitados por parte do poder público. Em Iranduba, lembra Paulo João, também são poucas as oportunidades de emprego e tem ficado cada vez mais difícil conseguir serviço para mão de obra. Quando a semana está boa, no entanto, o construtor chega a trabalhar em três diárias.

“Esse benefício veio num momento muito útil, devido à dificuldade que a gente enfrenta de trabalho. A gente vive numa comunidade escassa, onde o poder público limita os benefícios para o povo. Fica difícil a entrada, fica difícil a saída. No município, mão de obra também é muito difícil. Eu vivo de “bico” de construção civil, trabalho duas a três diárias na semana, mas tem semana que eu não trabalho e o benefício da Visão Mundial chegou no momento certo. A cesta tem ajudado muito e eu só tenho a agradecer”, declarou o pedreiro Paulo João.

“Quando pego uma semana completa, o rendimento é bom. Mas existem situações em que o camarada quer pagar menos. E como ele está precisando e a gente também está precisando, tem que ir, né. Mas, a gente não desanima. Cabeça erguida, para frente”, disse Paulo João.

Mão amiga nas comunidades

Janis de Oliveira e José Hélio Furtado são voluntários da ONG Visão Mundial e moradores da Ilha do Jacurutu, uma das comunidades da área ribeirinha que fica a cerca de 30 minutos de distância de Iranduba, que também recebeu a doação das cestas básicas. Eles forneceram uma embarcação de pesca para fazer o transporte da equipe da organização e das cestas de alimentos até a ilha.

Janis de Oliveira, dono do barco que levou as cestas básicas, e José Hélio Furtado, piloto da embarcação (Ana Beauvoir/Cenarium)

Na região, são atendidas 49 famílias pela ONG, boa parte delas vivem da agricultura. Localizado em uma área de várzea, o local passa seis meses do ano debaixo d’água, impactando o plantio e a moradia das pessoas. À CENARIUM, José Hélio falou, emocionado, que está, a todo momento, à disposição para quem precisa de ajuda.

“Eu moro na ilha há 56 anos. Estou em Jacurutu para somar e multiplicar. A hora que precisarem de mim, estou aqui para ajudar, seja quem for. Esse rancho que chegou foi uma benção de Deus. Uma coisa que vem para a comunidade, jamais iremos dizer não. E eu faço isso com um prazer enorme”, comentou José Hélio.

O projeto

O projeto “Resposta à Covid-19 no Brasil” doou 244 cestas e 269 créditos de cartão alimentação em Iranduba, um dos dez municípios atendidos pela Visão Mundial. A iniciativa, financiada pelo Escritório de Assistência Humanitária (BHA) da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), também incentiva a vacinação contra a Covid-19 nas comunidades rurais e ribeirinhas, e conta com uma equipe de profissionais da saúde para as pessoas que queiram ser imunizadas contra o vírus.

Além de ser voltado para a segurança alimentar, o projeto tem outras três frentes de atuação: o fortalecimento da rede de proteção à criança, entrega de kits de higiene e desinfecção e a distribuição de itens de prevenção para a rede de saúde. Dentro das iniciativas, as famílias recebem palestras sobre planejamento de refeições, para evitar o desperdício de comida e informações sobre como denunciar violência doméstica.

Angela Karinne, gerente do projeto (Divulgação/Visão Mundial)

“O projeto visa dar resposta à pandemia e veio, na sua primeira versão, trabalhando a prevenção, as informações e entregando kits de higiene às famílias. Nesta segunda rodada, nós percebemos nas comunidades a necessidade da segurança alimentar, onde há muitas famílias em situação de insegurança. Pensando nisso, a Visão Mundial está fazendo um trabalho para mitigar essa problemática”, destacou a gerente do projeto, Angela Karinne Mota.

Segurança alimentar calculada

Segundo Angela, as cestas básicas foram pensadas e calculadas por uma equipe técnica para levar segurança alimentar às famílias das comunidades. A gerente do projeto explica ainda que as oficinas são elaboradas por nutricionistas, conforme a realidade de cada comunidade.

“Em comunidades ribeirinhas, por exemplo, trazemos elementos que podem ajudar as famílias a economizar alimentos, como os medidores. Trazemos informações como higiene na cozinha para trazer segurança e prevenir doenças, falamos sobre a água. Muitos não têm saneamento básico e trazemos pequenas informações que podem agregar no dia a dia dessas famílias, como o cuidado com a água, lavar frutas e verduras”, reforçou a Angela Karinne.

Moradores de São Francisco recebem palestras sobre segurança alimentar (Ana Beauvoir/Cenarium)

A ONG Visão Mundial também dá atenção especial à saúde e ao bem-estar emocional das pessoas impactadas pela pandemia, com o fornecimento de atendimento psicológico na comunidade. Andreia Cristina é uma das pessoas que recebem o serviço especializado. Segundo ela, as consultas com psicólogo têm ajudado na melhora do convívio familiar.

“Antes, eu era uma senhora sem esperança. Cheguei a ter depressão. Confesso que cheguei a me entristecer por conta dessa pandemia e foi quando veio essa ONG para as nossas vidas. Hoje, posso dizer que somos uma família unida. A ONG está sendo a cura nas nossas vidas”, comemorou Andreia.

Aos 43 anos, Andreia é diarista, casada e tem dois filhos adolescentes. O marido é vigilante de uma empresa em Iranduba. A família também foi uma das beneficiadas com as cestas básicas doadas pela Visão Mundial à comunidade, o que tem ajudado eles e dado mais esperança de um futuro melhor.

Dados

De acordo com dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, divulgado em 2021 pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN), de 211,7 milhões de brasileiros, em 2020, 116,8 milhões conviviam com algum grau de Insegurança Alimentar e, destes, 43,4 milhões não tinham alimentos suficientes e 19 milhões de brasileiros(as) enfrentavam a fome.

Segundo a pesquisa, os resultados do inquérito mostram que, nos três meses anteriores à coleta de dados (setembro, outubro e novembro de 2020), de amostra representativa de 2.180 domicílios brasileiros, menos da metade dos domicílios (44,8%) tinha seus moradores em Segurança Alimentar. O estudo diz que, do 55,2% que se encontravam em Insegurança Alimentar, 9% conviviam com a fome, ou seja, estavam em situação de IA grave, sendo pior essa condição nos domicílios de área rural (12%).

Segundo pesquisa da Visão Mundial Internacional, divulgada em setembro de 2021, referente a dados de 2020, estima-se que, a cada minuto, 11 pessoas morrem por falta de comida no mundo, enquanto sete morrem a cada minuto pelo novo coronavírus (dados reais). O estudo aponta que 131 milhões pessoas entraram na linha da pobreza devido aos impactos da Covid-19 e que, por conta de doenças e desnutrição, cerca de 250 crianças podem morrer diariamente até o final de 2022.

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