Sem férias e 13º: minirreforma acentuará desigualdades

Medida foi aprovada pela Câmara e aguarda votação no Senado (Ricardo Oliveira/Cenarium)
Bruno Pacheco – Da Cenarium

MANAUS (AM) – A modalidade de trabalho sem direito a férias, 13º salário e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), aprovada pela Medida Provisória (MP) nº 1.045/2021 na Câmara dos Deputados, que aguarda votação no Senado Federal, conhecida como “minirreforma trabalhista”, é vista com preocupação por especialistas. Segundo eles, apesar de pontos que podem gerar mais emprego, a proposta vai na contramão das necessidades dos trabalhadores brasileiros e pode acentuar desigualdades.

O texto, de autoria do deputado Christino Áureo (PP-RJ), surge quatro anos após a reforma aprovada pelo Governo Michel Temer, em 2017. Para a economista Denise Kassama, vice-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), entre as propostas contidas na minirreforma, a que mais se destaca é a medida que prevê que trabalhadores de 18 a 29 anos possam ser contratados sem a carteira assinada.

Impactos

Essa forma de contratação, segundo Denise, ocorre sem direitos trabalhistas ou previdenciários, tendo como único documento o Termo de Compromisso de Inclusão Produtiva (TCIP), que é uma forma de vínculo empregatício. Com isso, o trabalhador só tem direito ao pagamento de salário, vale-transporte e seguro contra acidentes pessoais, por exemplo.

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“Há uma urgência para reduzir o desemprego que cresce significativamente. Há muitos brasileiros que em situação tão crítica aceitariam abrir mão de direitos trabalhistas para ter uma subsistência. Por outro lado, temos a classe empresarial, que também está precisando recompor perdas geradas pela pandemia. Dependendo do setor, o custo de mão de obra tem um peso significativo nos custos. Entretanto, as medidas acabam impactando mais no bolso do trabalhador”, afirma a economista.

Contramão

Para o advogado e sociólogo Carlos Santiago, a proposta vai na contramão das necessidades dos desempregados brasileiros. Ele lembra os trabalhadores de transporte de passageiros via aplicativos, que atuam sem qualquer direito, além dos milhões de brasileiros exercendo a profissão de entregador de mercadorias também sem carteira assinada e nenhum direito trabalhista ou qualquer seguro de vida.

“É quase uma escravidão”, afirma o sociólogo sobre o trabalho informal. Para ele, quando o governo não fiscaliza, o trabalho precário e o informal se proliferam e o, ainda, Poder Executivo Federal não tem política de governo e de Estado para o desenvolvimento econômico e social do País.

“Até hoje, [o governo federal] não apresentou um programa para criação de emprego e de renda. A atual reforma trabalhista visa a tão somente precarização do trabalho com salário insignificante. Assim, o Brasil vai continuar desigual, com muita pobreza e injusto”, lamentou.

Mudanças

Além de criar a modalidade de trabalho sem direito a férias, 13º salário e FGTS, a nova minirreforma trabalhista cria outra modalidade sem carteira assinada, o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip). Sem direitos trabalhistas e previdenciários, cujo trabalhador recebe uma bolsa e vale-transporte.

O texto prevê também a criação do Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), que é um programa de incentivo ao primeiro emprego, para jovens e de estímulo à contratação de maiores de 55 anos que estão desempregados há mais de 12 meses. Nele, o empregado recebe um bônus no salário, mas seu FGTS é menor.

Entre outras mudanças do projeto estão a redução do pagamento de horas extras para algumas categorias profissionais, como bancários, jornalistas e operadores de telemarketing.

A economista Denise Kassama lembra dos direitos do trabalhador que serão afetados, caso a medida seja instituída, como o auxílio de acidente de trabalho, que deixará de existir. “Se alguém nesta condição se acidentar gravemente, não poderá se licenciar ou aposentar pelo INSS, pois não é contribuinte. Poderá ser demitido a qualquer momento sem receber absolutamente nada”, alertou.

Para Denise, que chama atenção para redução do depósito do FGTS, que normalmente é descontado do funcionário, e, portanto, não incide em custos adicionais para empresa (exceto a multa rescisória), acabar com férias e 13º é não reconhecer o esforço laboral, que, geralmente, são os responsáveis pela produtividade de qualquer empresa. “A necessidade de geração de renda não pode servir de desculpa para a exploração do trabalhador. Geração de renda é importante. Mas qualidade de vida também”, finalizou.

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