Sem provas, defesa de militares nega estupro de indígena em delegacia
Por: Jefferson Ramos
28 de julho de 2025
MANAUS (AM) – Da mesma etnia da mulher indígena que denunciou ter sido estuprada durante nove meses por cinco agentes da Polícia Militar do Amazonas (PM-AM) e um guarda municipal, a advogada Viviane Batalha Cacau, do povo Kokama, que atua na defesa dos policiais, informou ter provas que inocentam os suspeitos que foram presos preventivamente no sábado, 26. É o que afirmou em coletiva de imprensa nesta segunda-feira, 28.
Sem apresentar as evidências, a advogada alegou que a vítima teve visitas íntimas no mesmo período em que o crime de estupro ocorreu. Os abusos sexuais, segundo o Ministério Público do Amazonas (MP-AM), ocorreram dentro do 53° Distrito Integrado de Polícia (DIP), no município de Santo Antônio do Içá (AM), a 880 quilômetros de Manaus entre novembro de 2022 e agosto de 2023.
“Ela não foi violentada pelos policiais tendo em vista que a gente consegue comprovar que ela recebia visitas íntimas permitidas e inclusive as não permitidas pelo próprio companheiro dela. O mesmo que violentava ela fisicamente no período de puerpério”, declarou a advogada.
Segundo a defesa, em uma dessas visitas, o casal teria sido flagrado pelos policiais da delegacia de Santo Antônio do Içá consumindo entorpecentes durante a madrugada. “Eles foram flagrados pelos policiais que ela acusa, entendeu? Então, isso seria uma forma vingança contra eles”, emendou aos jornalistas.

A advogada afirma que atua na delegacia onde os fatos ocorreram, mas que nunca recebeu nenhum relato da vítima. A defensora dos suspeitos também alega que nem o advogado da mulher violentada recebeu denúncia sobre abuso sexual.
“Como atuo lá, eu observava ela e não tinha criança nenhuma com ela. Ela podia ter pedido ajuda a mim, se quisesse, ou a outras advogadas que atuam no município. Não contou isso nem mesmo ao advogado dela como podemos observar nos autos do processo”, declara.
Ao ser interpelada por um jornalista sobre a relação das visitas íntimas que teoricamente teriam ocorrido, com o crime de estupro, a advogada respondeu que a nova “informação precisa ser analisada“.
Sobre o laudo que comprova conjunção carnal e fissuras na região genitália da vítima condizentes com violação sexual, a advogada relata que a prova seria “inconclusiva” considerando que o exame foi executado “72 horas após o suposto ato”.
E conclui diante da própria narrativa que o laudo realmente apresenta “inconformidades”, mas responsabiliza o histórico médico da vítima. “Ela já apresentava algumas patologias antes de ser presa”, apontou sem dar mais detalhes.
Estratégia
A advogada indígena Inory Kanamari aponta que a abordagem adotada pela defesa é uma estratégia antiga nos casos de crimes de violência sexual. Para ela, o fato de a advogada se auto declarar indígena do povo Kokama integra a mesma tática dos acusados.
“Essa advogada que se diz indígena não honra o povo dela e muito menos a história e cultura, porque se trata de fatos reais. Ela tampouco conhece a realidade do interior do Estado e nem das mulheres que seguem sendo vítima de violência. Falo isso porque a minha avó, bisavó e minha tia foram vítimas de estupro por parte de não indígenas”, rebateu Kanamari.
A operadora do direito avalia que na Justiça quando uma mulher indígena está na condição de vítima, a voz dela tem “pouco valor”.