Sobre opinião

Fui convidada para escrever artigos de opinião para esta revista. Tema livre, posso falar sobre o
que eu quiser. Posso mesmo? Tenho refletido há algum tempo sobre o significado de opinião e
o impacto que isso representa nas nossas vidas e no nosso convívio social. Acredito que seja
uma boa forma de começar.

Em uma realidade em que basta ter um celular para ser capaz de dizer o que pensa em redes
sociais, o espaço para reflexão é curto e o risco do equívoco é grande. No livro Nudge, Richard
Thaler e Cass Sustein explicam que a ilusão cognitiva é tão poderosa que a maioria das pessoas
nem sequer está disposta a crer na possibilidade de suas crenças estejam erradas.

Motivadas por uma forma de gatilho – o nudge – que aciona seus sistemas automáticos, as pessoas
acabam agindo de um certo modo não porque refletiram sobre o assunto, mas concordam com
as descrições das coisas, já que se assemelham com o que de fato pensam. Assim, enxergam
padrões em acontecimentos aleatórios que, muitas vezes, distorcem a percepção da realidade.
O fato é que nossas escolhas estão sendo influenciadas a todo momento e nossa opinião
também. No ambiente digital somos estimulados a curtir, comentar e dizer o que pensamos
sobre os mais variados assuntos.

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Não percebemos os “nudges” pelo caminho e quando nos damos conta já temos opinião sobre
geopolítica, biomedicina e hermenêutica constitucional. Como resultado temos a propagação
massiva de (des)informações que tomam conta da sociedade digital, mas essas informações,
muitas vezes não passam de uma opinião. Em sociedades democráticas isso pode ser
considerado um efeito natural da ampliação do diálogo, mas acredito que estamos perdendo
parâmetros.
É preciso perceber que opinião não é argumento. Alguns assuntos demandam conhecimento
técnico e método para chegar-se a uma conclusão racional. E, nesse aspecto, o método
científico foi desenvolvido como um caminho racional para a descoberta da verdade, ainda que
essa verdade seja uma verdade temporária.

Sob o argumento da liberdade de expressão, opinamos basicamente sobre tudo, ainda que
nosso contato com o assunto tenha sido superficial. É verdade, a Constituição Federal de 1988
garante a liberdade de opinião no artigo 5º, IV (livre manifestação de pensamento). Mas, se
continuarmos lendo o artigo 5º veremos, por meio de uma interpretação sistemática, que a
liberdade de opinião é limitada até mesmo pela própria Constituição quando veda o anonimato
e, logo no inciso V, assegura o direito de resposta e indenização por danos morais, materiais ou
à imagem.

Isso significa que, no exercício da minha liberdade de opinião não posso ofender terceiros, sob
pena de ser responsabilizada. Além disso, o sistema jurídico cuida de criminalizar certas
condutas ofensivas, como o racismo, mas o sistema moral também acaba exercendo um papel
relevante no controle do excesso das opiniões e, pior, de modo automático. O caso Monark
demonstrou para todos que uma opinião descuidada pode gerar prejuízos pessoais até mais
graves do que aqueles previstos pelo sistema jurídico.

Então eu posso falar o que eu quiser? Tenho essa liberdade? Sim, mas devo suportar o peso da
responsabilidade pelas minhas atitudes, pois não há liberdade sem responsabilidade.

Carolina Nobre Castello Branco
Doutora em Direito Constitucional pela Unifor. Mestre em Direito Constitucional e especialista em Processo Civil pela PUC-SP. Membro da Associação Brasileira de Direito Processual Constitucional. Advogada e professora de cursos de graduação e pós-graduação
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