Sociedade civil cobra transição justa e metas firmes contra desmatamento na COP30
Por: Fred Santana
21 de outubro de 2025
MANAUS (AM) – Representantes de organizações e movimentos da sociedade civil entregaram no último dia 16 de outubro, em Brasília (DF), um documento com seis eixos centrais de propostas à presidência da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), que ocorrerá em Belém (PA), entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025.
O documento alerta que o mundo se aproxima da ultrapassagem do limite de 1,5 °C e que a COP30 não pode repetir os fracassos anteriores. As organizações defendem que Belém estabeleça mecanismos claros para implementação, financiamento, justiça climática e proteção de florestas, alinhando compromissos globais a ações práticas.
A iniciativa nasceu do evento “O Caminho para Belém: contribuições da sociedade civil”, realizado nos dias 14 e 15, reunindo especialistas nacionais e internacionais para definir o que a conferência precisa entregar diante do aumento dos eventos climáticos extremos e da crise de cooperação internacional. O objetivo é garantir resultados concretos que acelerem a ação climática, fechem lacunas de ambição e restaurem a confiança no processo multilateral.
“A primeira COP da Amazônia tem a oportunidade de implementar a meta urgente de deter e reverter o desmatamento e a degradação florestal até 2030, além de ampliar o financiamento climático público para países em desenvolvimento cumprirem seus compromissos de redução de emissões. A COP30 deve dar uma resposta firme à lacuna de ambição dos planos nacionais, as NDCs, e garantir que sejam implementadas”, afirmou Anna Cárcamo, do Greenpeace Brasil.

Eixos temáticos
O primeiro eixo defende uma resposta política ao gap de ambição de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDCs), com redução significativa das emissões ainda nesta década, em linha com a meta de 1,5 °C e com princípios de justiça e equidade. O documento propõe ainda um fórum anual de alto nível para acompanhar a implementação das NDCs com relatórios de especialistas.
O segundo ponto propõe criar um mapa do caminho para a transição energética, detalhando o que significa uma transição justa, ordenada e equitativa, com calendário baseado na NDC do Brasil e acompanhamento de alto nível. As organizações afirmam que os combustíveis fósseis seguem como a principal causa do aquecimento global e que a COP30 deve ir além da reafirmação da COP28.
“Não há resiliência possível, sem previsibilidade no financiamento da adaptação à mudança climática. Por isso, será fundamental acordar uma meta de financiamento para adaptação na COP30. Sem isso, vamos cair num abismo já no próximo ano”, disse Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa.
O terceiro eixo busca estabelecer um mecanismo global para transições justas, garantindo coordenação internacional para acelerar ações e facilitar o financiamento, o apoio técnico e a transferência de tecnologias, sem aprofundar desigualdades.
“Esta foi uma semana de articulação tanto entre representantes de países, quanto da sociedade civil. Os avanços nas negociações não acontecem na velocidade que se espera, mas o ambiente da Pré-COP Ministerial parece ter sido construtivo entre os países. A sociedade civil também articulou seus consensos e mostrou seu espírito colaborativo no documento entregue à presidência da COP30, o que deixa um sentimento de otimismo para a Conferência de Belém”, avaliou André Castro Santos, da LACLIMA.
O quarto ponto da proposta sugere consolidar um pacote de decisões de adaptação, concluindo o Marco UAE–Belém para Resiliência Climática Global e aprovando os indicadores do Objetivo Global de Adaptação (GGA). O documento exige atenção a meios de implementação e à inclusão de povos indígenas, territórios negros, quilombolas, comunidades locais e periferias urbanas.

“Nesta reta final para a COP30, é fundamental que tenhamos claro o que a conferência precisa entregar como resultados mínimos, e esse encontro foi importante para colocar a sociedade civil, especialmente latino-americana, na mesma página. Esta é uma COP diferente das outras, que ocorre no pior momento possível da cooperação internacional, mas o fracasso não é uma opção”, afirmou Claudio Angelo, do Observatório do Clima.
O quinto eixo pede a criação de um Programa de Trabalho sobre sinergias entre clima e natureza e a coordenação internacional para acabar com o desmatamento e a degradação florestal até 2030. Esse eixo inclui a articulação entre as Convenções do Rio e a adoção de um plano concreto que aborde financiamento, vetores de desmatamento e direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais.
“Queremos que as negociações sobre transição justa sejam a oportunidade definitiva para incorporar o entendimento sobre justiça climática às negociações da COP, que isso esteja no centro das discussões. A Conferência de Belém precisa garantir que as ações climáticas contribuam para reduzir – e não reproduzir – desigualdades”, destacou Beatriz Mattos, da Plataforma CIPÓ.
O sexto ponto defende um Roteiro Baku–Belém ambicioso para a Nova Meta Global Quantificada (NCQG), com foco em financiamento público, novo, adicional, concessional e previsível dos países desenvolvidos aos países em desenvolvimento. O texto também aborda a necessidade de alinhar fluxos financeiros ao Acordo de Paris, eliminar subsídios a combustíveis fósseis e fortalecer a confiança internacional.
“Defendemos que temas como adaptação e um mecanismo para transição justa estejam no centro do debate, mas outros pontos não devem ser excluídos. Natureza e florestas, por exemplo, embora ainda não sejam um item de agenda formal das negociações, precisam ter maior destaque, assim como um financiamento robusto e ambicioso. Contamos com a presidência do Brasil para avançar nesses pontos, reforçando que a participação da sociedade civil é decisiva para gerar resultados concretos”, afirmou Karen Oliveira, da TNC Brasil.
Para garantir coerência política entre clima, biodiversidade e solos, as organizações defendem uma governança que una os regimes climáticos globais e otimize recursos limitados dos países. Proteger ecossistemas estratégicos e evitar novas desigualdades é apresentado como condição para o sucesso da conferência.
“Hoje, como sociedade civil, temos uma visão mais clara dos resultados que devemos garantir na COP30. Essa visão inclui um compromisso global e um plano concreto para deter o desmatamento e a degradação florestal até 2030, bem como a proteção de outros ecossistemas estratégicos. Da mesma forma, precisamos tomar a decisão de articular o trabalho das Convenções sobre Biodiversidade, Mudanças Climáticas e Desertificação para otimizar os recursos e capacidades limitados de todos os países”, explicou Laura Juliana Arciniegas, da Transforma.
As organizações ressaltam que a COP30 deve ser a COP da implementação, com foco em resultados práticos e equitativos. “O documento apresentado hoje destaca pontos cruciais para o enfrentamento da crise climática, como as lacunas de ambição das NDCs, o fim do desmatamento, uma transição para longe dos combustíveis fósseis, além dos temas como financiamento, adaptação e transição justa. O texto reforça caminhos concretos e possíveis para que esta seja, de fato, a COP da implementação, com a garantia de um futuro sustentável para as pessoas e para o nosso planeta”, concluiu Mauricio Voivodic, do WWF-Brasil.
