Subnotificação invisibiliza combate à violência contra comunidade trans, dizem especialistas
Cerca de 80 pessoas foram mortas no primeiro trimestre no Brasil (Reprodução/ Divulgação)
Priscilla Peixoto – Da Revista Cenarium
MANAUS – Especialistas em segurança pública e membros de associações voltadas à comunidade Trans apontam em entrevista nesta quarta-feira, 7, que a subnotificação de crimes invisibiliza o combate à violência contra travestis e transexuais. Cerca de 80 pessoas foram mortas no primeiro trimestre no Brasil, que ainda se mantém como o País que mais mata pessoas trans no planeta, os dados são do levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).
Para a presidente da Associação de Travestis, Transexuais e Transgêneros do Amazonas, (Assotram), Joyce Gomes, há várias problemáticas envolvidas. “A pandemia intensificou a violência na sociedade e no âmbito familiar. Temos notado uma migração, as pessoas têm medo de ficar na rua, a sensação de se ter mais liberdade para cometer violência, o ódio disseminado como forma de expressão têm incentivado para que ocorra a violência às identidades dessas pessoas”, explica Joyce.
Joyce também ressalta que, em breve, a Associação planeja monitorar os casos de violência contra travestis, transexuais e transgêneros ocorridos no Amazonas. “Já tivemos, ao menos, quatro casos de trans assassinadas. Queremos realizar o monitoramento para fazermos o relatório com dados locais mais precisos”, revela Joyce.
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Sensibilização
De acordo com o delegado da Polícia Civil do Amazonas (PC-AM), João Victor Tayah, todo registro de ocorrências policiais, conhecida popularmente como Boletim de Ocorrência (B.O.) depende de campos específicos no sistema informatizado, que permitam a inserção de dados capazes de identificar a violência contra a comunidade LGBTQIA+.
“Diante desta nova realidade, é necessário obter uma preocupação de gestão da Segurança Pública, que vise sensibilizar os agentes públicos para a importância da inserção destes dados, a fim de criar estatísticas que sirvam de base para as políticas públicas do Estado”, alerta o delegado.
Sistematização
Tayah ressalta que, até poucos meses atrás, o Sistema Integrado de Segurança Pública (Sisp) do Amazonas era deficiente quanto a esta caracterização. Mas que, desde junho, recebeu atualizações para um um programa mais avançado. Inclusive, já adotado em outros oito Estados da federação, que permitem o cadastro da identificação não binária de eventuais vítimas.
João Victor também sugere que a criação de uma delegacia especializada sobre o tema traria melhorias significativas no combate aos crimes de intolerância e afirma que a demanda deveria ser um prioridade dentre as políticas do Estado. “A violência contra este público demanda preocupação especial de todos os governos. E a Segurança Pública deve exercer papel fundamental em uma sociedade livre de preconceitos e discriminações, onde todos e todas possam viver em harmonia e com respeito mútuo”, declara o delegado.
Expectativa de vida
Além dos números alarmantes, outra preocupação seria a baixa na expectativa de vida que já não é longa para a população. Com uma estimativa de apenas 35 anos de vida, os assassinatos ocorridos no último semestre mostravam que a maioria das vítimas tinham menos que essa faixa etária.
Em Manaus, um dos casos que mais repercutiu e que entrou para a estatística de vidas interrompidas deste ano foi o caso “Manuela Otto”, a jovem de 25 anos, assassinada com um tiro nas costas e outro no braço no último dia 13 de fevereiro, em um motel na Zona Norte de Manaus. O suspeito seria um policial militar identificado como Jeremias Silva, pertencente a 12º Companhia Interativa Comunitária (Cicom).
Mesmo na condição de artista, empreendedora, professora do Liceu de Artes Claudio Santoro, professora do Sesc e de tantos outros trabalhados realizados, para os representantes da “comunidade T” no Amazonas, Manuela Otto, foi reduzida à figura de uma simples travesti sem contribuições expressivas para a sociedade.
Na ocasião, pessoas ligadas aos movimentos LGBTQIA+ e, principalmente, a questões voltadas à luta trans, como a presidente interina da Assotram Michele Pires, repudiaram não só a morte de Manuela, mas a forma como parte da mídia abordou a morte da artista e a violência presente de forma mais intensa no cotidiano da comunidade.
De acordo com Michele Pires, o homicídio endossou, além da violência, a constatação da falta de políticas que promovam o respeito, inclusão e a diminuição dos crimes contra a população LGTBQIA+. “A população trans é a que mais sofre e o Amazonas, apesar de não ter um senso voltado para a produção de dados, é um dos que mais mata e agride transexuais”, finalizou Michele.
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