Tema da redação do Enem traz oportunidade para reflexão, avaliam ativistas do movimento negro


Por: Marcela Leiros*

03 de novembro de 2024
O tema da redação do Enem “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil” (Composição: Weslley Santos/CENARIUM e Midjourney)
O tema da redação do Enem “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil” (Composição: Weslley Santos/CENARIUM e Midjourney)

MANAUS (AM) – O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste domingo, 3 — “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil” — traz uma oportunidade para reflexão e lança luz sobre uma população comumente invisibilizada, avaliaram ativistas do movimento negro à CENARIUM.

Outro ponto citado pelos ativistas é que o tema considerou o mês de novembro, conhecido como “Novembro Negro” e dedicado à luta antirracista. No dia 20 deste mês, é celebrado o Dia da Consciência Negra.

O historiador e ativista do Amazonas Juarez Silva avaliou que o tema não deve ser difícil para a maioria dos participantes, uma vez que tem sido explorado anualmente nas escolas desde 2003 e é recorrente na mídia e nas redes sociais. Ele destaca a oportunidade para reflexão e consideração de um grupo invisibilizado.

“O tema, como esperado, não foge da já ‘tradição’ de temas reflexivos de relevância, considerando grupos socialmente minoritários e que desviam de um viés hegemônico. Também não deveria ser surpresa, sendo novembro, que o tema rondaria a questão afro-brasileira”, mencionou.

Quanto à abordagem, ele vê um “leque” de opções a serem exploradas. “É possível trabalhar [o tema] a partir de variadas facetas, como artística/cultural, preconceito e discriminação, racismo religioso, ações afirmativas, enfim. O ponto-chave está no enunciado, ‘desafios’; quem entender como desenvolver a partir dessa premissa não terá problemas”, analisou.

O historiador e ativista Juarez Silva (Raphael Alves/TJAM)

A cientista social e secretária-geral do Movimento Negro Unificado (MNU) de Tocantins, Ana Cleia Kika, também destacou o fato de novembro ser dedicado à luta racial, acrescentando a oportunidade de reflexão sobre a resistência da população negra e a necessidade de ocupar os espaços que também lhes são de direito, especialmente nas universidades públicas.

“Quando se inicia o mês, a gente já começa a trazer várias reflexões, trazendo justamente os desafios que ainda precisamos enfrentar para que a população negra, de fato, venha ocupar todos os espaços que são de direito, sem essa desigualdade que ainda sabemos que existe. Somos a maioria da população, mas ainda somos a minoria em determinados espaços da sociedade”, refletiu.

Ana Cleia Kika também mencionou, como algo a ser abordado neste tema, a Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que incluiu no currículo oficial da rede de ensino brasileira a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”.

É muito importante a gente pensar hoje sobre a importância da Lei 10.639, que vem justamente para a valorização da cultura afrodescendente. O que se tinha no caso negro era muito da desvalorização. Eu vi nos livros de História, quando fiz o Ensino Médio, que havia textos extremamente racistas, preconceituosos (…) isso aí era natural ver nos livros, a gente não tinha uma lei que justamente traz essa esse debate da valorização da cultura afro-brasileira“, avaliou.

A ativista Ana Cleia Kika (Reprodução/Instagram @anacleiakika)

Para a vice-presidente da União de Negras e Negros pela Igualdade do Amazonas (Unegro Amazonas), Regina de Benguela, o tema da redação do Enem é necessário justamente para mostrar, aos jovens, o que foi, o que é e o que ainda será a luta do povo negro.

É uma luta diária de muita resistência, de muita resiliência. Tentam nos silenciar, invisibilizar. Aqui mesmo na Amazônia dizem que não tem negro. Como não tem negro? E os afro-indígenas? Então, é muito importante quando nós pensamos que o Enem, que abrange o território nacional, traga essa discussão. Eles nos levam a uma reflexão de toda uma sociedade, seja o povo negro, seja o povo branco, mas a reflexão precisa ser feita, porque precisamos de respeito, dignidade, é isso que o povo negro quer“, concluiu.

A vice-presidente da Unegro Amazonas, Regina de Benguela (Reprodução/Arquivo pessoal)
Quanto vale a redação no Enem?

A redação representa 20% da nota final. É a única área do exame, por exemplo, em que é possível chegar à nota mil, o que resulta em um peso relevante na média final do candidato.

O texto da redação é corrigido a partir de cinco competências, com valor de 200 pontos cada uma: o domínio do português, compreensão do tema e aplicação de conceitos, articulação de informações, coesão e proposta de intervenção.

Esta última competência é uma inovação do Enem e não costuma ser cobrada em outros vestibulares. É nela que os alunos das redes estaduais têm as piores notas na comparação com quem estudou em escolas particulares, segundo a pesquisa.

Veja quais foram os últimos temas da redação do Enem
  • 2023 — Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil
  • 2022 — Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil
  • 2021 — Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil
  • 2020 — O estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira
  • 2019 — Democratização do acesso ao cinema no Brasil
  • 2018 — Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet
  • 2017 — Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil;
  • 2016 — Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil;
  • 2015 — A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira;
(*) Com informações da Folhapress

O que você achou deste conteúdo?

VOLTAR PARA O TOPO