Travessia Belém–Arapari: rio conecta vidas, economia e esperança na Região Metropolitana de Belém
Por: Marx Vasconcelos
21 de agosto de 2025
BELÉM (PA) – Em meio à vastidão da Amazônia, onde os rios são mais do que paisagens – são caminhos, sustento e história –, a travessia fluvial entre Belém e o Porto do Arapari, em Barcarena, no Pará, se destaca como uma das conexões mais importantes da Região Metropolitana da capital paraense. Todos os dias, milhares de pessoas cruzam as águas da Baía do Guajará não apenas por necessidade, mas por sobrevivência, trabalho, estudo e vínculos familiares.
Essa travessia, operada principalmente por lanchas rápidas e embarcações de médio porte, é uma alternativa prática e econômica à Alça Viária, especialmente para quem mora em comunidades como Vila do Conde e Vila dos Cabanos, em Barcarena. A cidade, com cerca de 126 mil habitantes segundo o Censo de 2022, é um dos principais polos industriais paraenses e abriga o Porto de Vila do Conde, que movimenta cargas nacionais e internacionais, e gera empregos diretos e indiretos.

A distância entre Belém e Barcarena é de aproximadamente 102 quilômetros por rodovia, mas o trajeto terrestre pode levar mais de 2h30 em horários de pico. A opção fluvial é mais eficiente e a travessia entre os ponto leva de 45 minutos a 1h10.
A tarifa média para passageiros gira em torno de R$15, podendo variar conforme o tipo de lancha e os serviços oferecidos. As embarcações contam com ambiente climatizado, poltronas confortáveis e, em alguns casos, serviço de bordo. O pagamento é preferencialmente em dinheiro, por conta da instabilidade de sinal de internet nos terminais.

Conexão que vai além do transporte
A travessia Belém–Arapari não é apenas uma rota de deslocamento, é um elo que conecta trabalhadores que atuam em Belém, estudantes que frequentam universidades e escolas técnicas, famílias que mantêm vínculos entre os dois municípios, e comerciantes que dependem do fluxo constante de pessoas e mercadorias.
Entre os milhares de usuários que dependem diariamente desse serviço está Roberta Mascarenhas, estudante de Psicologia que mora na Vila dos Cabanos e estuda em Belém. A rotina dela começa cedo, com o deslocamento até o porto do São Francisco para embarcar em uma das lanchas das 7h ou 7h30. Após as aulas, ela retorna pelo terminal do Ver-o-Peso, completando o trajeto com uma van até a comunidade em que vive.

Roberta considera a travessia essencial para sua formação acadêmica, mas aponta que o serviço está longe de atender às necessidades dos passageiros. “Acredito que esse serviço não seja devidamente valorizado pelas autoridades, já que a fiscalização é limitada e não considera aspectos como conforto e acessibilidade,” afirma. “Também não percebo grande valorização por parte da população, pois muitas pessoas aceitam as condições atuais, mesmo quando a estrutura deixa a desejar e a lotação é excedida”, complementa.
Ela relata que, em dias de maré agitada, o trajeto pode se tornar desconfortável e até assustador para quem não está habituado. “Às vezes, a maré pode estar mais agitada na travessia da baía em frente a Belém, o que pode assustar quem não está acostumado,” conta.

“Em algumas ocasiões, por problemas no barco, ficamos parados no meio do trajeto até que o defeito seja resolvido ou que outro barco venha nos buscar”, conta e estudante. Nessas situações, a transferência entre embarcações é feita em pleno rio, o que, segundo ela, “pode ser complicado para cadeirantes ou para pessoas que não têm o hábito de andar de barco.”
Outro ponto crítico mencionado por Roberta é a prática de venda de passagens acima da capacidade permitida. “Alguns proprietários vendem passagens além do número de assentos disponíveis, entregando bancos de plástico para acomodar os passageiros extras, visando apenas o lucro, sem oferecer conforto,” denuncia.

Mesmo com o recente reajuste no valor da passagem, que passou de R$15 para R$17,58, ela afirma que não houve qualquer melhoria perceptível na estrutura ou no atendimento oferecido aos usuários. “A gente paga mais caro, mas continua enfrentando os mesmos problemas. Não há transparência, nem compromisso com o bem-estar dos passageiros”, ressalta.
Para Roberta, garantir acessibilidade e respeito à lotação não é apenas uma questão técnica, mas um compromisso com a dignidade dos passageiros que dependem da travessia todos os dias. “Gostaria que a fiscalização também adotasse critérios de acessibilidade para todas as lanchas, garantindo que estivessem preparadas para receber cadeirantes, pessoas com obesidade, entre outros passageiros com necessidades específicas,” defende.
“Os donos de lanchas lucram diariamente, pois praticamente em todos os horários há passageiros suficientes para encher as embarcações. Se fossem obrigados a melhorar a estrutura para continuar lucrando, certamente o fariam”, avalia a estudante.
Infraestrutura precária e desafios diários
Apesar da importância estratégica, os terminais hidroviários ainda enfrentam problemas estruturais. A falta de iluminação pública adequada, espaços de espera desconfortáveis, ausência de fiscalização no embarque de pedestres e atrasos frequentes nos horários são reclamações recorrentes.
A sensação de insegurança aumenta à noite, especialmente pela ausência de policiamento e iluminação nos arredores dos terminais.
Importância econômica e social
Estudos da Universidade Federal do Pará (UFPA) apontam que o transporte hidroviário é fundamental para o desenvolvimento regional, especialmente em áreas com baixa cobertura rodoviária e alta densidade populacional ribeirinha.
A travessia Belém–Arapari, nesse contexto, é um exemplo de como o transporte fluvial pode ser eficiente, sustentável e socialmente justo. Além de reduzir custos operacionais e emissões de carbono, o modal aquaviário promove a integração entre comunidades, acesso a serviços essenciais e fortalecimento da economia local. No entanto, para que esse potencial seja plenamente aproveitado, é necessário investir em infraestrutura, regulação, fiscalização e educação para o uso seguro e consciente do transporte fluvial.