‘Um respiro de esperança antirracista’, dizem ativistas sobre Anielle Franco, futura ministra da igualdade racial


22 de dezembro de 2022
Anielle Franco gained prominence from the tragedy of her sister, Marielle Franco, a Rio de Janeiro parliamentarian murdered in an ambush in Rio de Janeiro (Reproduction/Internet)
Anielle Franco gained prominence from the tragedy of her sister, Marielle Franco, a Rio de Janeiro parliamentarian murdered in an ambush in Rio de Janeiro (Reproduction/Internet)

Mencius Melo – Da Revista Cenarium

MANAUS – Anielle Franco, irmã da vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada no Rio de Janeiro e que virou símbolo da violência social, racial e de gênero no Brasil, é a ministra da igualdade racial. O anúncio foi feito nesta quinta-feira, 22, pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em coletiva em Brasília (DF). Anielle terá a missão de reconstruir uma pasta que contou com nomes como o controverso Sérgio Camargo, figurando em postos importantes como a Fundação Palmares.

Anielle Franco, irmã da vereadora Marielle Franco (PSOL) assassinada no Rio de Janeiro (Leo Martins/Agência O Globo)

Irmã de Marielle Franco é mais um nome feminino a compor o ministério de Lula. Sua indicação foi recebida com um sinal de mudança de polaridade. O sociólogo e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Luiz Antônio, fez a seguinte avaliação: “A composição do Governo Lula é resultado do esforço coletivo de muitos grupos, forças políticas e sociais. Vai do PSOL, passando pelo MDB, indo até as forças conservadoras, e a indicação de Anielle Franco é um sinal que o governo está emitindo mudança de polaridade”, avaliou.

Estamos saindo de um governo violento, excludente, racista, sexista e agressivo, com gente como Sérgio Camargo, um negro racista que assumiu a Fundação Palmares, para um governo que convocou gente do nível de Margareth Menezes, que é uma mulher incrível, chamou João Jorge, do Olodum, para a Fundação Palmares, que é um companheiro importante da Bahia. Ou seja, é um governo com agenda positiva, que indica para a sociedade uma mudança de gestão, e isso está sendo observado pela Europa, EUA e o mundo todo, que passa a nos ver com bons olhos. Teremos uma outra agenda“, ponderou Luiz Antônio.

Para o sociólogo Luiz Antônio, a indicação de Anielle Franco sinaliza a mudança de polaridade na condução do governo federal (Reprodução/Internet)

Ala feminina

Anielle Franco faz parte do pacote político do presidente Lula que tem como bandeiras a “inclusão e a diversidade”, conceitos amplamente refutados pelo último governo. As mulheres ganharam evidência ao serem escolhidas para seis pastas estratégicas: Saúde, Gestão e Inovação, Ciência e Tecnologia, Mulher, Cultura e Igualdade Racial. Ainda serão anunciados outros 13 ministérios. Junto com Margareth Menezes e Luciana Santos, Anielle Franco forma um núcleo de mulheres negras com trajetória de ativismo político, cultural e social.

Para a mestre em sociologia Marklize Siqueira, a nomeação é para se comemorar. “Anielle Franco assumir esse ministério é uma das decisões mais antirracistas que o novo governo poderia tomar. É abrir caminho para a construção de um Estado brasileiro que precisa, com urgência, combater o racismo e construir políticas de combate às desigualdades e ao extermínio do povo negro nas periferias brasileiras. Sem dúvida, uma alegria e um respiro de esperança para nós ativistas antirracistas”, destacou.

Ativista e engajada na luta antirracista, Marklize Siqueira acredita que o novo governo está na direção certa em suas políticas de inclusão (Divulgação)

Como mulher, a cientista social também aprovou a inclusão de outras mulheres a compor o comando da máquina pública federal, no Governo Lula. “Como mulher afro-ameríndia estou muito feliz com as indicações. Emocionada, porque esse governo nefasto de Jair Bolsonaro está finalizando e o povo brasileiro vai voltar a ser feliz de novo“, enalteceu Marklize Siqueira.

Parcela

Na análise da advogada, jornalista e ativista do movimento negro no Amazonas, Luciana Santos, o anúncio desta quinta-feira, principalmente, em relação ao nome de Anielle, traz representatividade. “Acredito que o primeiro ponto a se destacar é que Anielle tem a cara da maior parte da população brasileira, que é mulher e negra. E uma parcela da população que é a base da pirâmide social, sendo alvo de todas as desigualdades, fruto do racismo, do machismo e do capitalismo. Isso é de uma representatividade enorme, ainda mais no comando de uma pasta que retorna ao primeiro escalão do governo federal”, diz Luciana.

Ativista do movimento negro no Amazonas, Luciana Santos comemora a indicação de Anielle, mas pede mais mulheres no novo governo (Reprodução/Redes Sociais)

A ativista também destaca a aptidão e o currículo de Franco voltado para as pautas plurais. “Além disso, a nova ministra demonstrou sua capacidade de gestão à frente do Instituto Marielle Franco, com ações de empoderamento de mulheres negras e periféricas. Cito, como exemplo, ações como a Plataforma Antirracista nas Eleições, que apoiou candidaturas negras, e o projeto Escola Marielles, com formação política para meninas e mulheres negras, periféricas e LGBTQIA+“, exaltou Luciana Santos.

Mas, apesar do número de mulheres anunciadas por Lula, Luciana acredita que, matematicamente, ainda é pouco. “Quanto ao total de ministras, acredito que foi um avanço, mas que ainda não é o suficiente para garantir uma equidade. Como disse anteriormente, a população brasileira é composta, em sua maioria, por mulheres; assim, o ideal é que a composição dos ministérios reflita, o máximo possível, esse cenário“, apontou a ativista.

Mulheres ocuparão pastas estratégicas no Governo Lula (Mateus Moura/CENARIUM)

Trajetória

Anielle Franco nasceu na Maré, conjunto de comunidades na Zona Norte do Rio de Janeiro que até 1994 era considerado favela. Com a urbanização, passou a ser considerado bairro. Anielle é bacharel em Jornalismo e Inglês pela Universidade Central da Carolina do Norte, mestra em Jornalismo e Inglês pela Universidade da Flórida A&M e mestranda em Relações Étnico Raciais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Atualmente, Anielle Franco trabalha como professora, palestrante, escritora e é a atual diretora do Instituto Marielle Franco — que promove uma série de atividades para crianças, como cineclubes, rodas de conversa, oficinas com contação de histórias e lançamentos de livros. Ela também comanda a Escola Marielles e lançou seu primeiro livro intitulado “Cartas para Marielle”, uma coletânea de textos de parentes sobre a experiência de luto por Marielle Franco.

Sobre Marielle

Marielle Francisco da Silva atuava como vereadora na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, eleita pelo PSOL. Feminista, mulher negra e socióloga, mãe de uma menina, foi assassinada aos 38 anos a tiros no carro em que era transportada, na região central do Rio. Ataque que também tirou a vida de Anderson Gomes, motorista de Marielle.

Franco foi assessora parlamentar do deputado Marcelo Freixo, assumiu a coordenação da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia. Atuou em organizações da sociedade civil, como a Brasil Foundation e o Centro de Ações Solidárias da Maré (Ceasm).

Até o momento, não houve desfecho quanto às investigações sobre a morte de Marielle. Dois ex-policiais militares, Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, foram apontados como executores e estão presos há três anos. A dupla nega as acusações.

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