Varejistas da ZFM reclamam de exclusão do setor na Reforma Tributária
Por: Ana Cláudia Leocádio
19 de novembro de 2024
BRASÍLIA (DF) – Os representantes do comércio varejista da Zona Franca de Manaus (ZFM) reclamaram, nesta terça-feira, 19, que o setor foi excluído do texto do Projeto de Lei Complementar 68, que regulamenta a Reforma Tributária, e prometem ingressar na Justiça no dia seguinte à aprovação da proposta, caso os dispositivos permaneçam como vieram aprovados pela Câmara dos Deputados, e que agora estão em análise no Senado.
Em audiência pública realizada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o relator da matéria, senador Eduardo Braga (MDB-AM), reuniu representantes dos setores da indústria, comércio, Ministério da Fazenda e Secretaria de Fazenda do Estado do Amazonas (Sefaz) para discutir de que forma a proposta de regulamentação da Emenda Constitucional 132, que instituiu a Reforma Tributária, em dezembro de 2023, vai afetar a ZFM.
O representante da Câmara de Dirigentes Lojistas de Manaus (CDL/Manaus), Amilton da Fonseca Caminha, lembrou que a ZFM nasceu como uma área de comércio de importados e, somente depois, veio se consolidar como um polo industrial de produtos acabados que, atualmente, fornece 93% de sua produção para o mercado interno brasileiro, enquanto 7% são comercializados no Estado do Amazonas.

O projeto de Lei Complementar 68 (PLP 68/2024), que regulamenta a Reforma Tributária, vai substituir cinco tributos por três: o Imposto Sobre Circulação de Serviços (ICMS) pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)- de nível estadual; o PIS, Cofins e IPI dará lugar à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS)- da esfera federal; e o ISS, hoje da alçada municipal, se tornará o Imposto Seletivo (IS).
A reclamação dos representantes do comércio está na incidência da CBS, que a partir da regulamentação será de alíquota zero apenas para contribuintes de fora da ZFM, deixando de fora os comerciantes de Manaus, que passarão a ser tributados.
O assessor Jurídico Tributário da Federação do Comércio do Estado do Amazonas (Fecomércio), Milton Carlos Silva e Silva, explicou que a regra anterior já era como está no texto atual da regulamentação, porém com a cobrança de PIS e Cofins, mas os comerciantes de Manaus consideraram injusta essa falta de isonomia e ingressaram na Justiça, conseguindo a isenção para todo o setor.
Agora, os varejistas pedem que essa isonomia seja assegurada por lei, para evitar a judicialização, mas ainda não obtiveram nenhuma resposta, uma vez que essa proposta foi rejeitada pela Câmara. “Do jeito que está no dia um que for aprovado, haverá judicialização”, afirmou Silva. A Fecomércio prevê um encarecimento dos produtos em torno de 9,7%.
O senador Eduardo Braga disse que, diante das demandas dos varejistas, e dos riscos ao comércio do Estado, está se buscando uma proposta para ser levada ao ministro da Fazenda Fernando Haddad, na próxima semana, quando se reúne para discutir a Reforma Tributária. Ele solicitou dos representantes estudos com números exatos para serem levados ao ministro e também apresentar aos senadores, na tentativa de aprovar as emendas apresentadas.
“Há um impacto muito grande se não houver ajustes no comércio varejista, e isso tem um impacto no custo de vida do povo manauara. Portanto, só para que todos compreendam, é como se fosse comprar um fogão numa loja em Manaus e esse fogão fosse mais caro do que se eu comprasse pela internet no comércio eletrônico”, exemplificou.
Segundo a Fecomércio, o setor varejista emprega 219,8 mil trabalhadores diretos, entre formais e informais.
Demanda da Indústria
Em relação ao setor industrial da Zona Franca de Manaus, a principal demanda foi em relação ao crédito presumido nas saídas das mercadorias (IBS), que ficaram definidas em dois terços do imposto apurado, o que para o setor retira toda a competitividade do modelo. A proposta do Governo do Amazonas é de que o texto defina quatro faixas de incentivos fiscais com os percentuais de créditos presumidos, baseados nos dados fornecidos pela Sefaz ao Ministério da Fazenda.
Outro ponto que foi solicitado mudança é sobre o crédito de IBS sobre os bens da ZFM, porque o texto só assegura alíquota de 100% para bens de informática, prejudicando setores considerados importantes para o polo industrial.
Na avaliação do relator, foi um lapso do texto que passou na Câmara porque o setor de ar-condicionado, por exemplo, emprega 18 mil pessoas em Manaus e fabrica modelos seja de gaveta ou split, constituindo-se no segundo maior polo do segmento no mundo. “Então, esse é um ponto que eu acho que é central. Nós estamos falando de 18 mil empregos diretos na Zona Franca”. afirmou.
Uma outra demanda é sobre a utilização de créditos presumidos alterando de 180 dias para cinco anos, mas nem mesmo o relator da matéria na CCJ está convencido desta necessidade. “Sendo sincero, acho que essa é uma questão não resolvida ainda. E não há ainda um convencimento geral sobre esse tema. Até a próxima quinta-feira, teremos muitas horas de conversa, de debate, para que haja um convencimento sobre o tema” disse.
O presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo), Marcos Antônio Bento de Sousa, disse que, como representante do maior polo da ZFM não quer que pedir nada além do que está garantido na Constituição, que já estabeleceu os “mecanismos necessários, com ou sem contrapartidas, para manter, em caráter
geral, o diferencial competitivo assegurado à Zona Franca de Manaus”.
De acordo com o Executivo, o Polo de Duas Rodas fatura R$ 33 bilhões e fabrica 1,8 milhão de motocicletas, sendo o maior polo de produção fora do eixo da Ásia, gerando 150 mil empregos no País.
O coordenador do Comitê de Assuntos Tributários Estratégicos (Cate) da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz), auditor fiscal Nivaldo das Chagas Mendonça, disse que o Estado do Amazonas entregou uma nota técnica ao Senado apresentando todas as demandas que acha importante serem acolhidas na proposta em tramitação na Casa.
Sobre as divergências de números entre a Sefaz e o Ministério da Fazenda, Mendonça disse que os técnicos federais olham a ZFM como um todo, enquanto o modelo precisa ser analisado com seus pormenores, por cada setor, e assim compreender que os incentivos incidem diferente localmente.
Ministério da Fazenda
Ao contrário dos representantes do Amazonas, o secretario Extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, avaliou que a proposta que tramita no Senado contempla todas as vantagens comparativas da Zona Franca de Manaus, previstas na Constituição.
Para Appy, a criação de um fundo de sustentabilidade e desenvolvimento, previsto na proposta de Lei Complementar, será importante para o Estado do Amazonas fomentar novas atividades econômicas para substituir a Zona Franca de Manaus, cujos incentivos fiscais foram prorrogados até 2073.
Zona Franca de Manaus
A Zona Franca de Manaus foi criada pelo Decreto 288, de 28 de fevereiro de 1967. Criada inicialmente como Porto Livre, em 1957, o modelo foi se alterando ao longo do tempo, tendo se destacado pelo comércio de importados, que entrou em decadência com a abertura do Brasil às importações, no governo de Fernando Collor de Mello (1990-1992). Com incentivos previstos até 2013, a última prorrogação ocorreu em 2014, quando foram dados mais 50 anos para o modelo, válido agora até 2073.
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Editado por Adrisa De Góes