Voto feminino: 91 anos da conquista que marca a luta pela equidade de gênero no Brasil
24 de fevereiro de 2023

Ívina Garcia – Da Revista Cenarium
MANAUS – Há 91 anos, as mulheres no Brasil passaram a ter a garantir da participação na escolha dos representantes políticos por meio do voto. Exatamente no dia 24 de fevereiro de 1932, o então presidente Getúlio Vargas reconheceu o direito por meio do Decreto N° 21.076 que instituiu o Código Eleitoral.
O movimento pelo sufrágio feminino, que contava com a participação de homens e mulheres que lutavam pelo direito ao voto, garantiu a incorporação das brasileiras na lista de eleitores da nova Constituição de 1933. Maiores de 18 anos, alfabetizadas, sem restrição ao estado civil; antes, o voto era apenas obrigatório para servidoras públicas.
A bióloga Bertha Lutz e a professora Maria Lacerda de Moura foram os principais nomes por essa conquista no País. Responsáveis pela fundação da Liga para a Emancipação Internacional da Mulher, que lutava pela igualdade política das mulheres, ambas estiveram à frente dos movimentos feministas do Brasil.

A primeira mulher a se alistar para votar foi a professora Celina Guimarães, de Mossoró, Rio Grande do Norte. O Estado foi o primeiro a aprovar uma lei que garantia o direito de voto às mulheres (Lei Estadual 660, de 25 de outubro de 1927).
Dados
Quase 100 anos após a conquista, as regras foram flexibilizadas e o direito ao voto se tornou mais acessível para todos. Com isso, segundo levantamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dos mais de 156,4 milhões de eleitores aptos a votar no pleito de 2022, pouco mais de 82,3 milhões (53%) são do gênero feminino e 74 milhões do masculino (47%).
Apesar disso, a representação feminina nos postos de poder político ainda não alcança, sequer, a metade da representatividade. No atual governo de Luiz Inácio Lula da Silva, de todos os ministros, 26 são homens e 11 são mulheres.
Já no âmbito estadual, apenas dois dos 26 Estados e o Distrito Federal são governados por mulheres eleitas no pleito de 2022, sendo elas Fátima Bezerra (PT), no Rio Grande do Norte e Raquel Lyra (PSDB), em Pernambuco. Ao todo, o Brasil chegou ao número de 10 governadoras eleitas desde 1994, quando a primeira mulher assumiu o cargo por voto popular.

No total, 311 mulheres se elegeram nas eleições de 2022, que teve concorrentes aos cargos de presidente, governador e deputados federais e estaduais. O número é aproximadamente 2% maior do que o do pleito de 2018, quando 287 candidatas foram escolhidas pelo eleitorado. A quantidade de candidaturas também aumentou em torno de 2%. Atualmente, elas são 34% do total de candidatos.
Para a cientista política e jornalista Liege Albuquerque, os anos após a conquista têm caminhado lentamente para a mulher na política. “Quase 100 anos e a gente caminha a passos de tartaruga. A maioria das eleições sempre elege uma a mais, mas às vezes fica estagnado. É aí, então, quando a gente percebe quanto o feminismo pode ajudar a mudar isso“, avalia.
Na visão da especialista, a mídia precisa ajudar a mudar como as pessoas entendem o feminismo para que, então, a equidade de gênero seja alcançada. “A busca pela equidade não é ser maior do que o homem, e sim deixar de lado o papel de submissão feminino“, explica.

A equidade de gênero é uma noção social que permeia em volta da ideia de que, se igualadas aos homens, as mulheres ocupariam um lugar de opressão, como o realizado pelo patriarcado, enquanto equidade trata da divisão justa entre homens e mulheres, sem ter um gênero dominante.
“A questão do feminismo precisa ser bem mais explicada pela mídia para ser aceita, para mudar de uma forma mais rápida esse cenário que nunca é igualitário. Mesmo que a maioria das cidades tenha como maioria o eleitorado feminino, mulher não vota em mulher“, pontua Albuquerque.
Porém, a especialista ressalta que a importância de votar em figuras femininas não deve ultrapassar os requisitos básicos para se escolher um representante. “Não é votar em qualquer mulher só porque é mulher. Infelizmente, a gente sabe que os partidos, para cumprir cotas, colocam qualquer pessoa, inclusive, laranjas, então é preciso ter esse cuidado também”, alerta.
Coletividade
Para Aline Ribeiro, feminista, abolicionista, doutoranda do PPGAS/Ufam, pesquisadora vinculada ao Coletivo de Pesquisa Ilhargas – Cidades, políticas e violências. Membro da Coletiva Banzeiro Feminista e Frente Estadual pelo Desencarceramento no Amazonas, a sociedade precisa estar coletivamente compromissada com as conquistas femininas. “Quem permanece escondida desse projeto que se pretende inclusivo e igualitário?“, questiona a socióloga.
“Hoje não é o dia do voto feminino, é o dia da conquista do direito ao voto feminino. Antes dessa data, somente mulheres atreladas a algum homem poderiam ter direito ao voto, ou seja, as casadas e com a permissão de seu marido, ou aquelas que eram viúvas e tinham status financeiro”, lembra.
A socióloga lembra que politizar temas como as conquistas do feminismo colaboram para o avanço do debate. “Além de entender o contexto histórico de reivindicação que este é oriundo, é justamente avançar sobre a crítica da baixa representatividade nos partidos políticos”, onde muitos usam de malabarismo para falsear dados sobre as candidaturas femininas, mas não apresentam compromissos com as pautas feministas“, reflete.
“Essa data é representativa de nossas conquistas enquanto mulheres, num País alastrado por violência de todos os gêneros, e em um território como o nosso, que se propaga, ainda hoje, uma noção de vazio demográfico. Permanecemos de pé e estabelecendo essa data como uma vitória que precisa ser ampliada para a representação ser pautada em equidade no cenário eleitoral”, destaca.