Amazonas debate liberação de garimpo sem estudo de impacto ambiental
14 de fevereiro de 2023
A atividade de garimpo de cooperativas, no Amazonas, só é permitida mediante a emissão do Eia/Rima (Ricardo Oliveira/ Revista Cenarium)
Paula Litaiff – Da Revista Cenarium*
MANAUS – O Conselho Estadual de Meio Ambiente do Amazonas (Cemaam) debate a flexibilização da legislação ambiental para a operação de garimpo de cooperativas, substituindo o Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (Eia/Rima), pelo chamado Plano de Controle Ambiental (PCA), a ser aplicado nas diretrizes do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam). A mudança altera o artigo 4° da Resolução 11/2012, do Cemaam.
A proposta foi formalizada pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Amazonas (Sedecti), ao Conselho Estadual de Meio Ambiente, no dia 22 de outubro de 2022, e, em 16 de dezembro do mesmo ano, o Cemaam instituiu a Câmara Técnica Provisória de Recursos Minerais, formada por nove instituições, para apresentar um parecer sobre o assunto em um prazo de até 90 dias. A próxima reunião da câmara ocorre nessa quarta-feira, 15.
De acordo com o documento da Sedecti, as justificativas apresentadas pela pasta para liberar o Eia/Rima das cooperativas de garimpo baseiam-se, essencialmente, em argumentos de senadores constituintes que defenderam a proteção constitucional do garimpeiro, na forma definida no segundo anteprojeto de Bernardo Cabral e Ademir Andrade, há mais de 30 anos.
Entre as justificativas está a que diz que as grandes empresas mineradoras conseguem alvarás de exploração, no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), porque têm geólogos, ato previsto no Código de Mineração. Essas empresas, segundo a Sedecti, expulsam “centenas, milhares de garimpeiros que estavam trabalhando nas áreas, muitas vezes, há dezenas de anos”.
Outra justificativa usada pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico para dispensar o Estudo de Impacto Ambiental para o garimpo é a de que os garimpeiros, na Amazônia e no Brasil, são responsáveis por 80% da produção de ouro e, de acordo com a Sedecti, não recebem incentivo do governo, nem financiamento ou isenção.
“Ao passo que as mineradoras, além de receberem todos os benefícios do governo, pagam o mesmo imposto que o garimpeiro paga, nem um centavo a mais, nem um centavo a menos”, diz o documento da Secretaria de Desenvolvimento Econômico.
A Sedecti reproduz os argumentos dos constituintes, os quais alegavam que é importante defender a “democratização da exploração da riqueza mineral porque, na realidade, os garimpeiros são os prospectores naturais de recursos minerais, são eles que descobrem a maioria dessas riquezas”, diz o documento da secretaria.
Veja a justificativa, na íntegra, da Sedecti para dispensar o Eia/Rima no garimpo:
Legislação federal
A Constituição Federal, em seu capítulo sobre a ordem econômica e financeira, aborda a atividade econômica de garimpagem, no Art. 174, no qual está descrito que: “Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado”, conforme parágrafos abaixo:
§ 3° O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros.
§ 4° As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis nas áreas onde estejam atuando e naquelas fixadas de acordo com o art. 21, XXV, na forma da lei.
De acordo com a Resolução 38/2022, do Conselho Estadual de Meio Ambiente do Amazonas, a Câmara Técnica Provisória de Recursos Minerais para analisar a dispensa do Eia/Rima para cooperativas de garimpo é formada por representantes da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), da Comissão de Agricultura, Pecuária, Pesca, Aquicultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Assembleia Legislativa do Amazonas (Comapa/Aleam).
Na Câmara, há, também, representantes do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Amazonas (Faea), da Associação dos Engenheiros Ambientais do Amazonas (AENAMBAM), do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Amazonas (CREA/AM), da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), além de técnicos da própria Sedecti.
O assessor do CNS, Clodoaldo Pontes, informou que defende a legislação atual na qual exige o Eia/Rima para cooperativas de garimpo por entender que a flexibilização das regras para operação dessa atividade pode comprometer rios, florestas e saúde dos povos tradicionais.
Morador do município de Autazes (AM) que “trabalhou” – em condições subumanas – no garimpo ilegal por falta de emprego em 2021 (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
Para Pontes, é necessário buscar alternativas ao garimpo na geração de renda aos moradores do interior do Amazonas. “Percebo que estão tentando empurrar os povos da floresta para o garimpo e precisamos ver alternativas sustentáveis. É necessário aprofundar esse debate”, observou.
A REVISTA CENARIUM tentou ouvir o titular da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Amazonas, Pauderney Avelino, mas, até o fechamento da matéria, o gestor não se manifestou sobre o assunto.
Após a publicação deste conteúdo, a assessoria de imprensa do presidente Conselho Estadual de Meio Ambiente do Amazonas, Eduardo Taveira, emitiu nota sobre a discussão da dispensa do Eia/Rima para a operação de garimpo de cooperativas.
Segundo a nota, a proposta da Sedecti segue em análise na Câmara Técnica do conselho, onde passará por uma avaliação a respeito da sua viabilidade. O grupo tem até o dia 15 de março deste ano para apresentar parecer.
Nota do Cemaam
O Conselho Estadual do Meio Ambiente (Cemaam) recebeu a proposta em outubro de 2022. Conforme previsto no Regimento Interno do Cemaam, toda instituição integrante tem o direito de propor pautas para avaliação do Conselho.
Como parte do rito, a proposta segue para análise da Câmara Técnica, onde passará por uma avaliação a respeito da sua viabilidade.
O grupo terá até 15 de março para apresentar um parecer. Apenas depois disso, a proposta segue para discussão na plenária do Cemaam, onde será analisada por 34 instituições públicas e da sociedade civil.
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