Ativista pela inclusão, ator e campeão de judô com síndrome de Down sonha fazer novela

Breno Viola tem títulos mundiais no seu currículo de atleta de judô (Foto: Divulgação/Daniela Dacorso)
Com informações da Infoglobo

RIO — Atleta, ator, palestrante, filho, irmão, marido e cidadão. A descrição de um certo tijucano “da gema” se assemelha à de muita gente. Mas uma característica faz Breno Viola — faixa preta de judô que coleciona medalhas e conquistas — ser visto como diferente. O auxiliar-técnico do Instituto Reação tem síndrome de Down, condição com características físicas específicas, como olhar oblíquo e mãos menores, e algum comprometimento intelectual, mas que não impede o exercício de uma profissão, a inserção no mercado de trabalho, tampouco a construção de uma vida afetiva plena.

Nascer com esta alteração genética, no entanto, obriga o protagonista do filme “Colegas”, lançado há dez anos e que terá a sua continuidade rodada este ano, a ser um corpo político a serviço da luta pela inclusão de pessoas com algum tipo de deficiência em todos os espaços. Mostrar que ser diferente é normal faz parte da rotina deste homem, de 41 anos, que amplia sua voz através de lives na internet, em visitas a escolas e em palestras em empresas. O seu sonho é viver em um mundo onde o preconceito não encontre morada. Desejo possível ou utopia? Com a palavra, Breno Viola:

“Ainda falta muito para que as pessoas com deficiência não sofram preconceito e discriminação. A acessibilidade ainda é precária em todos os sentidos. Evoluímos, sim, mas a caminhada para um mundo ideal é longa. O que posso fazer para tentar acelerar o processo é exigir, dia e noite, que as autoridades cumpram as leis que garantem os nossos direitos. Outra necessidade urgente é combater a violência. A pessoa com deficiência é mais vulnerável a ser vítima de assaltos, agressões e abuso sexual. É preciso que se olhe para a gente com lupa e afeto”.

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Além de atleta, Breno Viola é ator e tem o sonho de fazer uma novela Foto: Divulgação/Daniela Dacorso
Além de atleta, Breno Viola é ator e tem o sonho de fazer uma novela Foto: Divulgação/Daniela Dacorso

Não sai da mente de Viola o que dia em que ouviu uma ofensa ao descer de um ônibus.

“Há muitos anos, um motorista me chamou de “doente”. Eu respondi que não era doente, anotei a placa do ônibus, o horário do ocorrido e denunciei. Lutei por uma punição, mas não deu em nada. Quero acreditar que hoje em dia seria diferente. No passado, era chamado de coitadinho, mongoloide. Isso não acontece mais comigo, felizmente, mas a minha luta é para que não aconteça com ninguém. Nunca mais”, frisa.

É para tentar impedir que episódios semelhantes ao vivido naquele ônibus se repitam, entre outras pautas pertinentes, que o atleta de judô, campeão mundial, tricampeão do Aberto europeu e participante de duas Olimpíadas Especiais — competição esportiva para pessoas com deficiência mental promovida por uma organização internacional chamada Special Olympics — tornou-se um ativista.

Na Rio 2016, Breno Viola foi um dos condutores da Tocha Olímpica Foto: Divulgação/Rio 2016/Marcos de Paula
Na Rio 2016, Breno Viola foi um dos condutores da Tocha Olímpica (Foto: Divulgação/Rio 2016/Marcos de Paula)

“Quando dou aulas de judô, faço palestras e lives, trabalho como ator ou simplesmente saio de casa sozinho ou com a minha mulher, seja para passear ou para ir ao mercado, estou defendendo uma bandeira, estou mostrando que Síndrome de Down não é uma doença, que é injusto tentarem nos excluir das escolas, da vida profissional. Todo mundo tem direito de viver a vida plenamente” ressalta o atleta, que está no Instagram com o perfil @breno.viola.

No Instituto Reação — organização em São Conrado criada pelo medalhista olímpico Flávio Canto para promover a inserção social por meio do esporte —, Viola, para surpresa de muitos, ensina judô para crianças e adolescentes, em sua maioria sem qualquer tipo de deficiência.

“No momento, não tenho alunos com síndrome de Down. Mas duas crianças que treinam comigo têm autismo. No geral, a inclusão é algo tão natural no instituto que as crianças “normais” não estranham o fato de ter um professor com deficiência. Eles, inclusive, me admiram porque sou faixa preta há 20 anos”, diverte-se.

Breno Viola dá aulas de judô no Instituto Reação Foto: Divulgação/Daniela Dacorso
Breno Viola dá aulas de judô no Instituto Reação Foto: Divulgação/Daniela Dacorso

O esporte sempre foi um aliado deste morador da Tijuca.

“Comecei a treinar de brincadeira, em casa, aos 3 anos. Aos 6, já era atleta do Flamengo. Uma pessoa com Down tem capacidade para fazer o que quiser. Basta ter dedicação e disciplina. O esporte me ajudou na socialização e também a manter o peso ideal, já que uma característica da síndrome é a tendência à obesidade”, explica.

A previsão é que, no segundo semestre, Viola esteja de volta aos sets de filmagens para rodar “Colegas 2”. Este fato é motivo de alegria, mas, como ator, o atleta ainda não alcançou o pódio.

“Sonho ser convidado para fazer uma novela. A minha mulher (a atriz Samanta Quadrado) atuou em “Um lugar ao sol”, da TV Globo. Fiquei muito feliz por ela, que, com seu belo trabalho, certamente vai abrir portas para outros atores com síndrome de Down também mostrem a cara na TV”, torce.

Breno Viola e Samanta Quadrado estão juntos há nove anos Foto: Acervo pessoal
Breno Viola e Samanta Quadrado estão juntos há nove anos (Foto: Acervo pessoal)

Viola e Samanta moram juntos há sete meses em um apartamento na Rua Itacuruçá, na Tijuca. O relacionamento, iniciado nove anos atrás, já sofreu preconceitos.

“Há quem pense que a pessoa com síndrome de Down não tem desejo sexual, não pode namorar. Nós vivemos como qualquer casal e está nos nossos planos ter um filho. Um médico nos disse que existe 50% de chance de a criança ter a síndrome. Enfrentamos desafios, claro, mas a vida com Down também é boa”, conclui.

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