Bolsonaro ataca Moraes, urnas e vê como infundada a denúncia da PGR
Por: Ana Cláudia Leocádia
26 de março de 2025
BRASÍLIA (DF) – O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) atacou o ministro Alexandre de Moraes, as urnas eletrônicas e classificou como “grave e infundada” a denúncia que foi aceita, por unanimidade, nesta quarta-feira, 26, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). As declarações foram feitas em pronunciamento realizado, em uma das entradas do Congresso Nacional, minutos depois de se tornar réu junto a mais sete ex-auxiliares de seu governo. O ex-mandatário se negou a responder perguntas dos repórteres.
Ele responderá agora pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
“Eu espero hoje botar um ponto final nisso aí. Parece que tem algo pessoal contra mim. A acusação é muito grave, e são infundadas. E não é da boca para fora”, disse Bolsonaro. Ele criticou o ministro Alexandre de Moraes, cujo voto foi pela aceitação integral da denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR), no que foi seguido por unanimidade pelos demais membros do colegiado. A partir de agora, será instaurada ações penais contra os oito acusados, que deverão obedecer a prazos processuais até a sentença.
Para Bolsonaro, o ministro Moraes não é transparente e manobra seus inquéritos. “Ele bota o que ele quer lá, por isso seus inquéritos são secretos ou confidenciais”, acusou.

Em sua defesa, o ex-presidente afirmou que, logo após o segundo turno das eleições, no dia 2 de novembro de 2022, fez um pronunciamento e evitou um protesto massivo dos caminhoneiros, que ameaçavam fechar todas as estradas do país, em protesto contra o resultado do pleito.
Também destacou ter colaborado, no período de transição, com o indicado a ministro da Defesa, José Múcio, que solicitara acesso total a determinados ministérios e que, depois, também o pediu para nomear os nomes indicados por Luiz Inácio Lula da Silva para assumirem o comando das três forças, Exército, Marinha e Aeronáutica. “Se tivesse qualquer objetivo, não deixaria os indicados do presidente Lula assumirem”, justificou.
Segundo o ex-presidente, antes de partir para os Estados Unidos, no dia 30 de dezembro de 2022, porque se negava a passar a faixa a Lula, ele também realizou uma transmissão pela internet (live), mas lamentou que seu conteúdo não integre os autos do processo relatado pelo ministro Alexandre de Moraes.
Nessa live, ele destacou uma frase dita a seus apoiadores, o que reforçaria a tese de que não participou de tentativa de golpe: “Repito em nenhum momento fui procurado para fazer nada de errado, violentando seja o que for eu entendo que fiz a minha parte, estou fazendo até agora a minha parte. Hoje são 30 de dezembro, até hoje eu fiz a minha parte dentro das quatro linhas, não vamos achar que o mundo vai acabar dia 1º de janeiro. Vamos para o tudo ou nada. Não tem tudo ou nada. Inteligência. Mostrar que somos diferentes dos outros, nós respeitamos as normas, as leis”, relembrou.
Para a PGR, no entanto, o ex-presidente não tomou providências para desmobilizar os acampamentos da frente dos quartéis, que só foram retirados após os ataques de 8 de janeiro, aos prédios da Praça dos Três Poderes, em Brasília. O procurador-geral, Paulo Gonet, coloca-o na liderança da organização criminosa denunciada, que desempenhava um papel com divisões hierarquizadas de responsabilidades na execução do plano.
Dano ao patrimônio
Em quase uma hora de pronunciamento, o ex-presidente também falou sobre o crime de dano ao patrimônio, pois não estava mais no Brasil. “Um dos cinco crimes imputados a mim é contra o patrimônio. Só se for por telepatia”, ironizou.
Ao acompanhar o voto de Moraes, o ministro Cristiano Zanin, último a votar, chamou a atenção para o que prevê o Código Penal, quando aborda o concurso de pessoas para o crime, ou seja, o acusado que concorre para a ocorrência de determinado crime terá as penas culminadas sobre si também. “Não adianta dizer que a pessoa não estava no 8 de janeiro”, ressaltou.
A denúncia também é detalhista ao reconstituir os passos de Bolsonaro, sobretudo no período de transição, quando recebia assessores no Palácio da Alvorada, para supostamente tramar o golpe de Estado, com a elaboração e reelaboração da minuta que instauraria um estado de sítio ou de defesa no país, com intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Sobre esta minuta, que a PGR cita em vários momentos da denúncia, Bolsonaro não admitiu tê-la redigido, mas disse que não é crime discutir possibilidades legais. “Discutir hipóteses de dispositivos constitucionais não é crime”, afirmou. Ele alega que, se quisesse encampar a ideia, teria de convocar o Conselho da República, o que não aconteceu. “Golpe não tem lei, golpe tem norma”, disse.
Ataques às urnas eletrônicas
Bolsonaro também resgatou os questionamentos às eleições de 2014, feitas pelo PSDB, para voltar a atacar a confiabilidade do sistema eleitoral e defender o voto impresso. Ele chegou a destacar a mudança feita no sistema de votação eleitoral da Venezuela, que prevê agora a impressão do voto, uma alteração implantada pelo presidente Nicolas Maduro, segundo ele. “Não sou obrigado a confiar, a acreditar no programador (das urnas). Confio na máquina, não sou obrigado a confiar no programador”, atacou.
O ex-presidente também usou a maior parte de seu pronunciamento para criticar o governo do presidente Lula e dizer que o povo já estaria com saudade da sua gestão. Quando instado por duas vezes a responder especificamente sobre as acusações pelas quais foi denunciado, ele se recusou a responder e, ao final, se retirou do local.
Demais réus
Além de Bolsonaro, a Primeira Turma do STF aceitou instaurar ações penais por cinco crimes contra o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin depu), deputado federal Alexandre Ramagem; o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier Santos; o ex-ministro da Justiça, Anderson Gustavo Torres; o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Augusto Heleno Ribeiro; o ex-ajudante de Ordens de Bolsonaro coronel, Mauro Cesar Barbosa Cid; o ex-ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira; e, por último, o ex-ministro da Defesa e candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022, general Walter Souza Braga Netto.
Homem protesta contra Bolsonaro

O garçom e membro do movimento Vida Além do Trabalho (VAT) Luiz Jesus dos Santos, 49, fez um protesto contra o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, na tarde desta quarta-feira, 26, na entrada do Senado Federal, em Brasília, quando começou a gritar palavras de ordem contra o ex-mandatário. Bolsonaro havia acabado de fazer um pronunciamento à imprensa, minutos após ele e mais sete ex-auxiliares terem sido tornado réus, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por tentativa de golpe de Estado e outros quatro crimes.
“Seu filho é outro, que deixou você na mão, presidente canalha. Assassino, ajudou a matar um monte de gente nesse Brasil. Você é um covarde, você tem que ser preso, você e sua raça, você botou generais atrás das grades. Bandidos!”, bradava o homem, enquanto era afastado pelos seguranças do Senado para a área fora do estacionamento do Poder.