Bolsonaro é indiciado em plano golpista e sabia da trama para matar Lula


Por: Ana Cláudia Leocádio*

21 de novembro de 2024
O ex-presidente Jair Bolsonaro (Composição de Weslley Santos/CENARIUM)
O ex-presidente Jair Bolsonaro (Composição de Weslley Santos/CENARIUM)

BRASÍLIA (DF) – A Polícia Federal (PF) concluiu, nesta quinta-feira, 21, o inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado e indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os ex-integrantes do governo dele pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.

As investigações apontam indícios de que Bolsonaro tinha conhecimento da trama para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o vice Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Com mais de 800 páginas, o relatório foi entregue ao STF e será encaminhado à Procuradoria Geral da República (PGR), que vai decidir se denuncia ou não os indiciados. Também há possibilidade de pedido de mais diligências.

As investigações abrangem o envolvimento nos atos de 8 de janeiro de 2023, quando ocorreu a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes; as tramas golpistas durante e após as eleições presidenciais de 2022; e o plano para assassinar o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o então vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSD) e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do STF, Alexandre de Moraes.

De acordo com informações do jornal O Globo e da Rede CNN, o relatório da PF concluiu também que Jair Bolsonaro tinha conhecimento do plano para assassinar Lula, Geraldo Alckmin e o magistrado. Conversas interceptadas entre os militares, registradas durante o mês de dezembro de 2023, mostram que o ex-presidente estava a par de todo o planejamento em curso para matar as autoridades.

A trama para executar Lula, Alckmin e Moraes veio à tona após a deflagração “Operação Contragolpe”, na terça-feira, 19, com a prisão do general do Exército Brasileiro (EB) Mário Fernandes e de três “Kids Pretos”, os militares Rafael Martins de Oliveira, Hélio Ferreira Lima e Rodrigo Bezerra de Azevedo. O policial federal Wladimir Matos Soares também foi preso na operação policial.

Conforme apurações do jornal O Globo, há “dados que comprovam” que Bolsonaro participou ativamente do processo de elaboração e tentativa de execução do golpe, inclusive alterando uma minuta de decreto que embasaria a consumação do golpe de Estado.

Mais 36 indiciados

Além do ex-presidente Bolsonaro, a PF apontou indícios de crimes contra outras 36 pessoas. Entre elas, estão o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno; o ex-ministro da Casa Civil e da Defesa e candidato a vice na chapa que perdeu a eleição de 2022, general Braga Netto; o ex-presidente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem; e o presidente nacional do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto.

Segundo nota da Polícia Federal, “a investigação apurou a existência de uma organização criminosa que atuou de forma coordenada, em 2022, na tentativa de manutenção do então presidente da República no poder”.

Foram realizadas diversas diligências policiais ao longo de quase dois anos, informou a PF, “com base em quebra de sigilos telemático, telefônico, bancário, fiscal, colaboração premiada, buscas e apreensões, entre outras medidas devidamente autorizadas pelo poder Judiciário”.

Os investigadores puderam constatar a existência de uma estrutura em seis grupos, o que permitiu a individualização das condutas dos 37 envolvidos. Os núcleos começam pela Desinformação e ataques ao sistema eleitoral e seguem por incitar militares a aderirem ao golpe de Estado. De acordo com a apuração das autoridades, havia também o Núcleo Jurídico, Operacional de apoio às ações golpistas, de Inteligência Paralela e o Núcleo Operacional para cumprimento de medidas coercitivas.

Militares ligados ao AM indiciados

Entre os 37 indiciados nesta quinta-feira, 21, dois são oficiais do Exército que atuam ou atuaram no Amazonas. O primeiro deles é o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima, ex-comandante da 3ª Companhia de Forças Especiais do Comando Militar da Amazônia (CMA) em Manaus. Ele foi preso na “Operação Contragolpe”, deflagrada pela PF, dia 19, por articular um plano para assassinar Lula, Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes.

O segundo indiciado é o general de brigada Nilton Diniz Rodrigues, comandante da 2ª Brigada de Infantaria de Selva em São Gabriel da Cachoeira (AM), município distante 852 quilômetros de Manaus. Segundo informações do Portal Metrópoles, a PF ouviu o general no dia 6 deste mês, porque ele trabalhou como assistente do general Freire Gomes, que comandou o Exército entre março e dezembro de 2022.

Ainda conforme o portal, ele foi chamado a depor somente agora “porque seu nome apareceu em novas mensagens obtidas recentemente pelos investigadores, após nova perícia em equipamentos apreendidos na apuração”.

Pelo menos 25 dos indiciados são militares das Forças Armadas, seja da ativa ou da reserva. Entre os civis, consta o padre José Eduardo de Oliveira e Silva, da diocese de Osasco, na Grande São Paulo. Ele é suspeito de participar de uma das reuniões para planejar o golpe, no Palácio do Planalto.

Penas previstas:

  • Golpe de estado: 4 a 12 anos de prisão;
  • Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: 4 a 8 anos de prisão;
  • Integrar organização criminosa: 3 a 8 anos de prisão.
Nota da PF

A Polícia Federal encerrou nesta quinta-feira (21/11) investigação que apurou a existência de uma organização criminosa que atuou de forma coordenada, em 2022, na tentativa de manutenção do então presidente da República no poder.

O relatório final foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal com o indiciamento de 37 pessoas pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.

As provas foram obtidas por meio de diversas diligências policiais realizadas ao longo de quase dois anos, com base em quebra de sigilos telemático, telefônico, bancário, fiscal, colaboração premiada, buscas e apreensões, entre outras medidas devidamente autorizadas pelo poder Judiciário.

As investigações apontaram que os investigados se estruturaram por meio de divisão de tarefas, o que permitiu a individualização das condutas e a constatação da existência dos seguintes grupos:

a) Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral;
b) Núcleo Responsável por Incitar Militares à Aderirem ao Golpe de Estado;
c) Núcleo Jurídico;
d) Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas;
e) Núcleo de Inteligência Paralela;
f) Núcleo Operacional para Cumprimento de Medidas Coercitivas

Com a entrega do relatório, a Polícia Federal encerra as investigações referentes às tentativas de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

Lista dos indiciados
  • AILTON GONÇALVES MORAES BARROS: Capitão reformado do Exército envolvido no caso de inserção ilegal de dados no cartão de vacinação da Covid de Bolsonaro;
  • ALEXANDRE CASTILHO BITENCOURT DA SILVA: Coronel do Exército e um dos autores da “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, que segundo a PF, foi usada como instrumento de pressão ao então comandante do Exército, General Freire Gomes, para que aderisse a um golpe de Estado em 2022;
  • ALEXANDRE RODRIGUES RAMAGEM, deputado federal, ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e delegado da Polícia Federal;
  • ALMIR GARNIER SANTOS, ex-comandante da Marinha, suspeito de apoiar a trama do golpe;
  • AMAURI FERES SAAD, advogado citado na CPI dos Atos Golpistas como “mentor intelectual” da minuta do golpe encontrada com Anderson Torres;
  • ANDERSON GUSTAVO TORRES, ex-ministro da Justiça, suspeito de participar da elaboração da minuta do golpe e de omissão no dia da invasão da Praça dos Três Poderes;
  • ANDERSON LIMA DE MOURA, coronel do Exército, um dos autores da “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, que segundo a PF, foi usada como instrumento de pressão ao então comandante do Exército, General Freire Gomes, para que aderisse a um golpe de Estado em 2022;
  • ANGELO MARTINS DENICOLI, major da reserva do Exército que chegou a ocupar cargo de direção no Ministério da Saúde na gestão Eduardo Pazuello;
  • AUGUSTO HELENO RIBEIRO PEREIRA, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional e general da reserva do Exército;
  • BERNARDO ROMÃO CORREA NETTO, coronel do Exército, suspeito de integrar um núcleo responsável por incitar militares a aderirem a uma estratégia de intervenção militar para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva;
  • CARLOS CESAR MORETZSOHN ROCHA, engenheiro, dono do Instituto Voto Legal (IVL) – contratado pelo PL, para descredibilizar as urnas eletrônicas;
  • CARLOS GIOVANI DELEVATI PASINI, coronel da reserva do Exército, um dos autores da “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, que segundo a PF, foi usada como instrumento de pressão ao então comandante do Exército, General Freire Gomes, para que aderisse a um golpe de Estado em 2022;
  • CLEVERSON NEY MAGALHÃES, coronel do Exército e ex-oficial do Comando de Operações Terrestres, suspeito de integrar parte do núcleo operacional das ações golpistas, atuando em reuniões de planejamento e execução de medidas;
  • ESTEVAM CALS THEOPHILO GASPAR DE OLIVEIRA, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército (Coter);
  • FABRÍCIO MOREIRA DE BASTOS, coronel do Exército, ex-Adido Militar em Israel;
  • FILIPE GARCIA MARTINS, ex- assessor especial para assuntos internacionais da Presidência da República no governo Bolsonaro;
  • FERNANDO CERIMEDO, consultor argentino que atuou com aliados de Bolsonaro para atacar o sistema eleitoral e fazer falsas imputações de fraude na eleição presidencial de 2022;
  • GIANCARLO GOMES RODRIGUES, subtenente do Exército, suspeito de ser fazer monitoramento clandestino usando ferramentas como o sistema First Mile;
  • GUILHERME MARQUES DE ALMEIDA, coronel do Exército, suspeito de participação na trama do golpe;
  • HÉLIO FERREIRA LIMA, tenente-coronel do Exército, um “kid preto”, identificado em trocas de mensagens com o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Barbosa Cid, preso por participar na trama para matar o presidente Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alesxandre de Moraes;
  • JAIR MESSIAS BOLSONARO, ex-presidente da República, ex-deputado, ex-vereador do Rio de Janeiro e capitão da reserva do Exército;
  • JOSÉ EDUARDO DE OLIVEIRA E SILVA, padre da diocese de Osasco, na Grande São Paulo, suspeito de participar de uma das reuniões para planejar o golpe no Palácio do Planalto;
  • LAERCIO VERGILILO, coronel do Exército, suspeito de participar das tratativas para o golpe;
  • MARCELO BORMEVET, ex-agente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
  • MARCELO COSTA CÂMARA, coronel da reserva, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, apontado integrante do “núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral”;
  • MARIO FERNANDES, general, ex-número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, general da reserva e homem de confiança de Bolsonaro, preso por coordenar a operação “Punhal Verde Amarelo”, trama para matar o presidente Lula, o vice Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes;
  • MAURO CESAR BARBOSA CID, ex-ajudante de ordens da Presidência, tenente-coronel do Exército (afastado das funções na instituição), autor de delação premiada que foi mantida pelo STF;
  • NILTON DINIZ RODRIGUES, general de brigada do Exército, comandante da 2ª Brigada de Infantaria de Selva, em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas;
  • PAULO RENATO DE OLIVEIRA FIGUEIREDO FILHO, neto do ex-presidente da ditadura João Figueiredo, foi investigado em fevereiro por “propagação de desinformação golpista e antidemocrática”;
  • PAULO SÉRGIO NOGUEIRA DE OLIVEIRA, ex-comandante do Exército, apontado pela PF por manipular relatório técnico das Forças Armadas sobre o sistema eletrônico de votação, “postergando-se a sua divulgação em vista de não terem sido identificadas vulnerabilidades no sistema eletrônico de votação”;
  • RAFAEL MARTINS DE OLIVEIRA, major e integrante do grupo ‘kids pretos, preso por suspeita de participação na trama para matar o presidente Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes;
  • RONALD FERREIRA DE ARAUJO JUNIOR, tenente-coronel do Exército, apontado de participação na discussão sobre termos de uma minuta para um golpe de Estado;
  • SERGIO RICARDO CAVALIERE DE MEDEIROS, major do Exército, suspeito de fazer parte do núcleo de desinformação e ataque ao sistema eleitoral;
  • TÉRCIO ARNAUD TOMAZ, ex-assessor de Bolsonaro e considerado um dos pilares do chamado “gabinete do ódio”;
  • VALDEMAR COSTA NETO, presidente do PL, partido pelo qual Jair Bolsonaro e Braga Netto disputaram as eleições de 2022. Foi o fiador dos questionamentos à urna eletrônica e, portanto ao resultado das eleições;
  • WALTER SOUZA BRAGA NETTO, ex-ministro da Defesa e candidato a vice de Bolsonaro em 2022, general da reserva do Exército, apontado como chefe do núcleo da trama do golpe;
  • WLADIMIR MATOS SOARES (Policial Federal preso junto com os militares por envolvimento na trama para matar Lula, Alckmin e Moraes. Integrou o setor de inteligência Secretaria da Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) em 2008 e atuou na PF em Salvador antes de ser transferido para Brasília).
Leia mais: Bolsonaro recebeu minuta que previa golpe, aponta PF
Editado por Adrisa De Góes e Jadson Lima

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