Covid-19 tirou a vida de um em cada 17 idosos com 90 anos ou mais no Brasil


03 de março de 2022
Dessas vítimas, 2,5 mil eram pessoas centenárias, segundo os dados dos cartórios (WILL OLIVER/EFE/EPA)
Dessas vítimas, 2,5 mil eram pessoas centenárias, segundo os dados dos cartórios (WILL OLIVER/EFE/EPA)

Com informações do UOL

MANAUS — O Brasil atingiu nessa quarta-feira, 2, a triste (mas esperada) marca de 650 mil mortos pela Covid-19. Em dois anos de pandemia no País, a doença causada pelo SARS-CoV-2 deixou uma sequela cruel especialmente entre os mais idosos.

A coluna levantou os dados do Portal da Transparência dos cartórios de registro civil. Até nessa quarta-feira, 2, foram registrados 43.910 óbitos de pessoas de 90 anos ou mais. O alto número se torna ainda mais assustador quando se compara com a população estimada no Brasil nessa faixa etária em 2019 (último ano antes da pandemia): segundo o IBGE, eram 774.304 idosos 90+.

Em cálculo simplório, sem pretensão científica, vemos que os óbitos pela Covid-19 representam 5,6% desses idosos que viviam no Brasil no antes da pandemia.

Dessas vítimas, 2,5 mil eram pessoas centenárias, segundo os dados dos cartórios. Aqui uma ressalva: não há dados atuais de pessoas com 100 anos ou mais morando no Brasil, segundo informou o IBGE à coluna. “Esse grupo etário é muito rarefeito e somente pode ser captado nos censos demográficos”, disse o órgão. No Censo de 2010, a população centenária medida foi de 23.760 pessoas no país.

Somente este ano, a Covid-19 já vitimou 4.600 idosos com 90 anos ou mais no País. Com o avanço da vacinação, como o UOL mostrou, os idosos com mais de 70 passaram a responder por 63% de todos os óbitos pela Covid-19 no País. Isso ocorre porque esse grupo etário tem maior fragilidade, e a Covid-19 pode causar problemas graves.

“O coronavírus não é mais aquele grande vilão causador da insuficiência respiratória, mas sim um agente que vai descompensar outros problemas. Isso não é só com os idosos, mas com adultos que tenham uma comorbidade, uma criança com uma doença cerebral. Essas pessoas têm uma fragilidade e estão em um ponto de equilíbrio tênue da saúde”, disse o geriatra Marco Polo Dias Freitas, doutor em saúde coletiva pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e membro da Comissão de Políticas Públicas da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG).

Vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a sanitarista Bernadete Perez, afirma que era esperado que a pandemia atingisse mais essa faixa etária no Brasil, como ocorreu em todo o mundo. “A doença é mais grave na população mais idosa. Quanto mais idade, maior é o risco, maior a letalidade”, conta.

Entretanto, ela afirma que o País cometeu erros e omissões que poderiam ter ajudado a salvar vidas.

“Precisaríamos ter enfrentado a pandemia com rede de atenção, vigilância epidemiológica, comunicação social, estratégias de proteção social para estas pessoas mais vulnerabilizadas, especialmente as mais idosas. Idade avançada não é comorbidade, é uma condição natural que precisa ser cuidada. É nossa memória, cultura, história, o que temos de mais valor”, reforça. Bernadete Perez, da Abrasco.

Ela diz ainda que o número de mortes nessa terceira onda não foi mais mortal por causa da vacinação. “Nosso problema é que a vacinação foi tardia, e hoje temos a necessidade da busca ativa. Isso é vinculado à atenção primária necessária para que a gente consiga cobrir 100% da população — ou perto disso— das pessoas com 90 anos e mais. É a forma de proteção mais efetiva”, completa.

Movimento para proteção

Durante a pandemia, para proteger os idosos, um grupo criou o movimento nacional “Vidas Idosas Importam” —que hoje existe em todos os Estados. “Ele defende a diversidade do envelhecimento —porque ninguém envelhece da mesma forma”, conta o gerontólogo e fundador do movimento, Crismedio Costa.

Ele afirma que a crise humanitária provocada pelo coronavírus ainda causa muitos danos, como o medo da morte por causa da alta letalidade da doença nessa faixa. “O pavor teve um impacto forte e negativo na vida dessas pessoas, então muitas chegaram a ficar atordoadas e levou a um isolamento por conta do medo”, diz.

Para ele, o preconceito é outro fator danoso. O chamado etarismo (a discriminação por idade) foi um dos fatores. “O fato dessas pessoas terem fragilidade na saúde, terem sido contaminadas com a Covid-19, serem internadas e irem a óbito fez com que a sociedade os isolasse”, relata.

“O Brasil caminha para ter a 6ª maior população do planeta de idosos, mas não criou ainda políticas efetivas para a dignidade no cuidado a essas pessoas. E a palavra de ordem é cuidado, segurança, dignidade ao envelhecer”, explica Crismedio Costa.

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