Drogas, seita religiosa, estupro e aborto: o que a polícia sabe sobre o ‘Caso Djidja’

Além dos cinco citados no mandado de prisão, Djidja Cardoso também era investigada (Composição: Weslley Santos/CENARIUM)
Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS (AM) – A investigação sobre o envolvimento da família de Djidja Cardoso e de funcionários do salão de beleza Belle Femme com drogas sintéticas e remédios anestésicos aponta a participação dos citados em uma seita religiosa chamada de “PAI, MÃE, VIDA“. A REVISTA CENARIUM teve acesso ao inquérito, que mostra que o “cabeça” da organização era o irmão da ex-item do Boi Garantido, Ademar Farias Cardoso Neto. Ele também é investigado por estupro e aborto causado sem o consentimento.

Quem são os investigados:

  • Dilemar Cardoso Carlos da Silva, a “Djidja Cardoso”: ex-integrante do Boi Garantido, morreu na terça-feira, 28, vítima de overdose. Era investigada pela polícia e acreditava ser “Maria Madalena” na seita “PAI, MÃE, VIDA”.
  • Ademar Farias Cardoso Neto: irmão de Djidja Cardoso, acreditava ser “Jesus” na seita “PAI, MÃE, VIDA”. É investigado por tráfico de drogas, associação para o tráfico e estupro.
  • Cleusimar Cardoso Rodrigues: mãe de Djidja Cardoso, acreditava ser “Maria” na seita “PAI, MÃE, VIDA”. É investigada por tráfico de drogas e associação para o tráfico.
  • Verônica da Costa Seixas: gerente do salão de beleza Belle Femme, também integrava a seita, além de fornecer drogas e aplicá-las nos funcionários. É investigada por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Também era usuária das substâncias.
  • Marlisson Vasconcelos Dantas: cabeleireiro do salão de beleza Belle Femme, integrava a seita, além de fornecer drogas e aplicá-las nos funcionários. É investigado por falsificar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, associação para o tráfico, curandeirismo, perigo de vida ou saúde de outrem. Também era usuário das substâncias.
  • Claudiele Santos da Silva: maquiadora do salão de beleza Belle Femme, integrava a seita, além de fornecer drogas e aplicá-las nos funcionários. É investigada por tráfico de drogas, associação para o tráfico, curandeirismo, perigo de vida ou saúde de outrem. Também era usuária das substâncias.
(Composição: Weslley Santos/Revista Cenarium)

O inquérito, coordenado pelo delegado Cícero Túlio, titular do 1° Distrito Integrado de Polícia (DIP), apurou que a família, formada por Ademar, Cleusimar e Djidja, administrava a organização que atuava também com “tráfico de substâncias entorpecentes de natureza sintética de uso veterinário” e “administração forçada de tais substâncias em seres humanos“. As ações, segundo a polícia, levavam os dependentes químicos à situação de “quase morte“.

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Trecho do inquérito (Reprodução)

Depoimentos de funcionários do salão Belle Femme, coletados no curso da investigação, indicam que além da família, os três funcionários do salão de beleza onde Djidja era sócia, Verônica da Costa SeixasMarlisson Vasconcelos Dantas e Claudiele Santos da Silva, integram a seita. Eles também usam as drogas e fornecem as substâncias ilícitas a terceiros. Marlisson é o único dos investigados que está foragido.

(…) o Ademar faz parte de uma seita identificada como PAI, MÃE e VIDA onde também participam os nacionais Marlisson, Verônica e ‘Clau Santos’; que os referidos nacionais faziam uso e administravam uma substância de nome ketamina, além de outras drogas; que os referidos nacionais administravam essas substâncias em funcionários da Belle Femme; que Verônica, juntamente com o Marlisson e também o Ademar compravam essas substâncias para fornecer aos usuários“, consta em um trecho do documento.

Trecho do inquérito (Reprodução)

A substância química ketamina, também escrita como cetamina ou quetamina, é um composto utilizado para induzir e manter anestesia (em pessoas e animais). O medicamento era fornecido ilicitamente pela clínica veterinária Maxvet, localizada no bairro Redenção, Zona Centro-Oeste de Manaus. O empreendimento foi alvo de mandado de busca e apreensão nesta sexta-feira, 31.

Trecho do inquérito (Reprodução)

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Seita religiosa

Os relatos presentes no inquérito explicam a organização da seita, na qual Ademar dizia ser “Jesus”, Cleusimar acreditava ser “Maria” e Djidja Cardoso representava “Maria Madalena”. A droga ketamina era usada com a finalidade de resolver “problemas“, como depressão ou ansiedade.

Que os integrantes dessa espécie de seita falavam que o uso da ketamina auxiliava a resolver os problemas e por isso convenciam funcionários e amigos e iniciar com o uso dessa droga“, consta em um trecho.

Trecho do inquérito (Reprodução)
Trecho do inquérito (Reprodução)

Ao ser questionado por jornalistas que acompanhavam a prisão, nessa quinta-feira, 30, se havia cometido o crime de estupro contra Djidja, Ademar negou e ainda fez um pedido: “Ouçam as Cartas de Cristo no YouTube”, afirmou.

O pedido referiu-se a um podcast que pode ser acessado no link disponibilizado no perfil do Instagram de Ademar. “Um incomparável tratado sobre a personalidade humana e suas possibilidades, para a compreensão de nosso mundo e de nossa função como seres humano“, indica a sinopse do conteúdo.

Perfil de Ademar no Instagram indica o link do podcast e o nome da seita “PAI, MÃE, VIDA” (Reprodução/Instagram)
Perfil de Cleusimar no Instagram indica o nome da seita “PAI, MÃE, VIDA” (Reprodução/Instagram)
Estupro e aborto

Os relatos de estupro, aborto e cárcere privado partiram da família de uma ex-companheira de Ademar Cardoso, assim como da própria vítima, de 28 anos. A estudante começou a fazer uso das drogas junto com Ademar e chegou a ser mantida em cárcere privado pelo ex-companheiro, de quem foi resgatada em várias ocasiões pelos familiares.

Gabrielle também chegou a pedir ajuda da família para ser internada e tratar o vício, relatando que sofreu um aborto ao ser drogada e estuprada pelo companheiro. A mãe de Ademar e Djidja, Cleusimar, também é citada nos depoimentos.

Ademar injetava muita droga na declarante […] até a mesma perder os sentidos; que Ademar fazia sexo com a vítima sem o seu consentimento por muitas vezes; que, inclusive, a declarante chegou a sofrer um aborto há cerca de um mês (…) a declarante foi resgatada da casa de Ademar, foi resgata ensanguentada, sangrando pela vagina, do aborto que estava sofrendo, totalmente despida… a mesma não tomava banho há dias, só se drogando; que Cleusimar dizia que era necessário para a declarante se curar“, indica o inquérito.

Trecho do inquérito (Reprodução)

Cárcere privado foi denunciado, também, em Boletim de Ocorrência (B.O) registrado no dia 24 de abril deste ano, no 6° Distrito Integrado de Polícia (DIP), em Manaus, por familiares de Djidja Cardoso. Tias da ex-integrante do Boi Garantido também apontaram Ademar Cardoso como fornecedor de drogas.

As comunicantes informam que a Sra. Dilemar Cardoso, vulgo Djidja, encontra-se em estado lamentável por estar sendo usuária de drogas e que ninguém permite que esta receba visitas e esta não pode sair de casa já que se encontra em estado de entorpecida, que a família toda é usuária e não permitem que esta receba ajuda”, diz um trecho do B.O.

Trecho do B.O registrado no 6º DIP (Reprodução)
Prisões

Quatro dos investigados — Ademar, Cleusimar, Verônica e Claudiele foram presos nessa quinta-feira, 30, em cumprimento a mandado de prisão preventiva. Os três primeiros foram flagrados por uma equipe policial do 1° Distrito Integrado de Polícia (DIP) tentando fugir da residência onde Djidja morava, no bairro Cidade Nova, Zona Norte de Manaus. Marlisson é considerado foragido.

Medicamentos apreendidos na casa de Djidja Cardoso e no salão Belle Femme (Carol Veras/Revista Cenarium)

No endereço, a polícia apreendeu vários frascos do medicamento Cetamin, anestésico usado em animais, além de seringas e luvas. A polícia indica que a alta dosagem do medicamento foi o que causou a morte por overdose de Djidja Cardoso, na terça-feira, 28.

Relatório preliminar do Instituto Médico Legal (IML), no entanto, indica que a causa da morte é considerada “indeterminada”, ocasionada por “depressão dos centros cardiorrespiratórios centrais bulbares; congestão e edema cerebral“.

Trecho do relatório do IML (Reprodução)

O médico Nelson Barbosa explicou à CENARIUM o que o termo médico significa: “A depressão cardiorrespiratória significa que o uso de alguma substância, de alguma coisa ou alguma doença de base que a pessoa tinha, fez com que o sistema cerebral respiratório diminuísse a sua respiração. E aí a pessoa morre, porque você não está respirando, não está tendo troca gasosa, não está tendo troca do CO2 pelo oxigênio. E essa consequência do edema cerebral é o que acontece também quando há uma depressão do sistema cardiorrespiratório”, analisou.

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