EDITORIAL – ‘O céu vai desabar’, por Paula Litaiff
07 de junho de 2024
Os efeitos da crise climática são globais.
(Composição: Weslley Santos/Midjourney)
“A floresta está viva. Só vai morrer se os brancos insistirem em destruí-la. Se conseguirem, os rios vão desaparecer debaixo da terra, o chão vai se desfazer, as árvores vão murchar e as pedras vão rachar no calor. Então morreremos, um atrás do outro, tanto os brancos quanto nós. Quando não houver mais nenhum deles vivo para sustentar o céu, ele vai desabar”.
Trechos do livro “A Queda do Céu: palavra de um xamã Yanomami” (2010), que traz o relato de um dos maiores porta-vozes do povo Yanomami, David Kopenawa, mostram, com clareza, a cosmovisão indígena sobre a ação do homem sobre o clima, as florestas, os rios e o risco aos povos indígenas e não indígenas desaparecerem.
No século 19, Svante Arrhenius (1859-1927) considerou, pela primeira vez, em 1896, a capacidade humana de mudança do clima, ao afirmar que a adição de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera aqueceria a temperatura média da Terra. A pesquisa de Arrhenius foi reforçada, décadas depois, por outros estudiosos, que apontavam para urgências climáticas. Nesta edição, a REVISTA CENARIUM traz à memória previsões ancestrais que passaram a ser consideradas pela academia científica, inclusive em pesquisas antropológicas dentro do campo de saberes e conhecimentos tradicionais, e faz um paralelo com a tragédia do Rio Grande do Sul, onde mais de 170 pessoas perderam a vida em decorrência dos efeitos da crise climática.
Mas não é só o Rio Grande do Sul que sofre no País com esses efeitos. Na Amazônia, o Estado do Acre registrou uma das maiores cheias no ano passado, deixando milhares de famílias desalojadas e muitas mortes foram invisibilizadas por serem de uma região fora do contexto Sul-Sudeste. O Amazonas, Pará e Roraima também sofreram e ainda sofrem com a estiagem nos rios, que fez com que milhares de famílias ficassem sem alimentos e esse cenário não virou matéria com destaque na mídia sulista.
Os efeitos da crise climática são globais. A união de esforços também deveria ser mundial, mas o negacionismo aos saberes tradicionais dos povos originários e às pesquisas científicas nos jogam no epicentro desta aflição, que não escolhe etnia, cor de pele, classe social, mas coloca na linha de frente da morte quem protege as florestas e vive nas periferias, isolado pelo racismo ambiental.
A “queda do céu” não é mais uma previsão ancestral distante para as gerações futuras. Ela está acontecendo agora e é uma realidade para nós e nossos filhos. A pergunta é o que nós, dentro da realidade de cada indivíduo, podemos fazer para parar a tragédia climática? A resposta não está no presente, ela está e sempre esteve no passado.
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