Guerra: explosão destrói parte de ponte estratégica que liga Rússia à Crimeia

Com informações da Folhapress

MANAUS – Em meio a um momento delicado da Guerra da Ucrânia, com Moscou sofrendo reveses no front e acenando as cartas de uma ameaça nuclear, uma forte explosão destruiu neste sábado (8) parte da ponte que conecta o território russo à península da Crimeia, anexada pelo Kremlin em 2014. A estrutura é considerada uma rota crucial de abastecimento para as tropas de Vladimir Putin no país invadido.

Autoridades russas afirmaram que um caminhão-bomba explodiu, o que na sequência provocou um incêndio em sete tanques de um trem que transportava combustível. Ao menos três pessoas morreram, segundo informações preliminares, que estariam em um carro ao lado do veículo.

Trem que transportava combustível pega fogo na ponte Kerch, que liga o território russo à Crimeia
Trem que transportava combustível pega fogo na ponte Kerch, que liga o território russo à Crimeia – AFP

Segundo a imprensa de Moscou, Putin determinou a criação de uma comissão para apurar as causas e esclarecer a explosão, destacando o FSB (Serviço Federal de Segurança, uma das agências sucessoras da KGB) para reforçar medidas de proteção na ponte e na estrutura de eletricidade e gás que abastece a península.

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O Comitê de Investigação da Rússia, que lida com crimes graves no país, informou ter identificado o proprietário do caminhão, que seria morador da região de Krasnodar. O tráfego local chegou a ser interrompido e, com o controle do incêndio, voltou parcialmente para carros e em definitivo para os trens.

Seguindo o padrão de grandes ataques no conflito, a ação iniciou uma guerra de versões —ainda que nenhum dos lados tenha culpado o outro com todas as letras. Alas mais radicais em Moscou definem o caso como declaração de guerra de Kiev, demandando uma resposta forte. A porta-voz da chancelaria, Maria Zakharova, declarou que a destruição de infraestrutura civil “prova o caráter terrorista do Estado ucraniano”, palavras que já foram ouvidas com sinal trocado do outro lado.

Um assessor do presidente Volodimir Zelenski, por sua vez, insinuou responsabilidade de Moscou. “O caminhão foi detonado, segundo as indicações, entrando na ponte pelo lado russo, então respostas devem ser buscadas na Rússia”, escreveu Mikhailo Podoliak. Sem reivindicar a ação, ele também usou o Twitter para dizer que a ação era “só o começo”. “Tudo que é ilegal deve ser destruído, toda a ocupação russa deve ser expulsa.”

Após a queda do governo pró-Kremlin da Ucrânia em 2014, Moscou capturou a península da Crimeia sem um único tiro. A gigantesca ponte, de 19 km de extensão, sobre o estreito de Kerch, que separa os mares Negro e de Azov, foi inaugurada com grande alarde pelo próprio Putin quatro anos depois, tornando-se um dos símbolos da anexação russa.

Mais do que simbólica, a estrutura hoje representa uma importante rota de abastecimento para as forças do Kremlin em Kherson, no sul da Ucrânia, e para o porto de Sebastopol, principal cidade da Crimeia.

Vídeos publicados nas redes sociais neste sábado mostram partes das estruturas rodoviária e ferroviária destruídas, enquanto um trem é consumido pelas chamas. Uma câmera de segurança teria registrado o momento da explosão, que atingiu carros que passavam pelo local. Outras imagens capturadas a distância mostram fumaça espessa no horizonte.

Nas últimas semanas, ataques contra alvos russos na Crimeia levaram pânico aos moradores da península. Os êxitos da contraofensiva ucraniana aumentaram a pressão sobre Putin, que determinou no mês passado a mobilização de 300 mil reservistas para lutar no conflito. Após a decisão, o mandatário russo registrou a primeira queda de sua popularidade desde a invasão do vizinho em fevereiro —a aprovação caiu de 83% para 77%, segundo o instituto de pesquisas Centro Levada, ainda independente na Rússia.

Outras autoridades ucranianas fizeram comentários irônicos sobre a explosão deste sábado. O chefe do Conselho Nacional de Segurança e Defesa da Ucrânia, Oleksii Danilov, publicou nas redes sociais um vídeo da ponte em chamas ao lado de outro vídeo de Marilyn Monroe cantando “Feliz aniversário, senhor presidente”, em referência a Putin que completou 70 anos nesta sexta (7).

Parcela do governo de Kiev vinha expressando o desejo de destruir a ponte de Kerch. O serviço postal da Ucrânia informou neste sábado que imprimirá um selo especial para comemorar a explosão. Várias ações de sabotagem foram atribuídas à Ucrânia desde o início do conflito.

A destruição da estrutura ocorre em um momento em que a Rússia vem sofrendo sucessivas derrotas no front. Após os reveses, Putin fez novas ameaças de guerra nuclear contra o Ocidente. Nesta semana, o Ministério da Defesa russo passou a divulgar que parte dos reservistas mobilizados está sendo treinada para lutar num ambiente de guerra nuclear, química ou biológica.

Em meio ao crescente descontentamento na elite russa com o conflito, o Exército russo anunciou a nomeação do general Serguei Surovikin, 55, como comandante para o que ainda chama de “operação militar especial” na Ucrânia.

O general é um veterano da guerra civil no Tadjiquistão nos anos 1990, da segunda guerra da Tchetchênia (anos 2000) e da intervenção russa na Síria, lançada em 2015. Segundo relatório de julho do ministério da Defesa russo, Surovikin liderava agrupamento das forças ao Sul na Ucrânia.

O nome de seu antecessor nunca foi revelado oficialmente, mas de acordo com a mídia russa, era o general Alexander Dnornikov, outro veterano da segunda guerra tchechena e comandante das forças russas na Síria de 2015 a 2016.

Também neste sábado, o ministro das Relações Exteriores russo, Serguei Lavrov, acusou países do Ocidente de recorrer a “mentiras e manipulações” para elevar ainda mais a tensão no conflito. Segundo ele, os EUA e seus aliados tentam introduzir a retórica nuclear sobre a Ucrânia na agenda global.

“O Ocidente distorce tudo na tentativa de mostrar que é a Rússia que supostamente está expressando ameaças nucleares”, disse Lavrov em entrevista ao jornal russo Argumenty i Fakty, segundo a agência de notícias Tass. “Várias manipulações e mentiras descaradas são exploradas [pelo Ocidente]. No entanto, estamos acostumados com isso.”

Na quinta, o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, afirmou que a Otan deveria atacar o território da Rússia “preventivamente” para que os russos “saibam o que acontecerá com eles se usarem” armas nucleares. A declaração atraiu críticas do Kremlin.

Na quarta (5), Putin finalizou a sanção das leis regulando a anexação do equivalente a cerca de 18% da Ucrânia, a maior tomada territorial à força na Europa desde a Segunda Guerra Mundial —Moscou já havia anexado a Crimeia, 4,5% do vizinho.

O Kremlin continuou sem definir exatamente quais fronteiras estão previstas na absorção denunciada como ilegal no exterior. O motivo são avanços de Kiev nas regiões de Donetsk (leste) e Kherson. Os ataques testam a retórica belicista de Putin, que prometeu usar até armas nucleares para defender o que considera novas partes da Rússia.

Numa tentativa de conter o avanço ucraniano, o Ministério da Defesa diz já ter alistado 200 mil dos 300 mil reservistas que deseja para combate, e que alguns poderão estar em ação já em novembro.

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