Medo de contágio e desemprego em alta levaram quase 3 milhões de brasileiros para o SUS em maio, segundo IBGE

Com isolamento social e medo de contágio, lojas fecharam e desemprego registrou aumento no País. (Reprodução/SSP-AM)

Mencius Melo – da Revista Cenarium

MANAUS – Cerca de 17,7 milhões de pessoas não conseguiram procurar emprego na última semana de maio por causa da pandemia da Covid-19 ou por falta de oportunidade na região em que vivem. Nesse mesmo período, outros 10,9 milhões estavam desempregados e buscaram uma ocupação, mas não encontraram.

Os dados são da PNAD Covid-19, divulgados na terça-feira, 16, pelo IBGE. Eles mostram ainda que na quarta semana de maio, 3,6 milhões de pessoas com sintomas de gripe procuraram atendimento médico em unidades da rede pública e privada de saúde no País. Mais de 80% desses atendimentos foram na rede pública de saúde, o que corresponde a 2,88 milhões de pessoas.

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Com isso, o País alcançou a marca de 28,6 milhões de pessoas que queriam um emprego, mas enfrentaram dificuldades para se inserir no mercado de trabalho, seja por falta de vagas ou receio de contrair o novo Coronavírus.

O levantamento é uma versão da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua), realizada com apoio do Ministério da Saúde, para identificar os impactos da pandemia no mercado de trabalho e para quantificar as pessoas com sintomas associados à síndrome gripal.

A REVISTA CENARIUM resolveu esmiuçar mais sobre esses dois temas e conversou com o economista e deputado estadual Serafim Côrrea (PSB) e o sociólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Luiz Antônio.

O deputado e economista Serafim Corrêa pontuou sobre a presença do SUS na pesquisa. “O SUS é um sistema importante e fundamental para um país tão desigual como o nosso. Sem ele, os mais pobres não teriam a quem recorrer”, exaltou.

Para o deputado e economista Serafim Corrêa, SUS é fundamental para o povo e o home office é uma realidade imutável (Reprodução/Internet)

O parlamentar lamenta que o sistema tenha problemas. “O SUS sofre com o subfinanciamento e com a desorganização nos estados e municípios”, salientou. “O que precisamos é de um SUS com organização e racionalidade. No Amazonas, há 30 anos estamos na contramão do SUS e isso agrava muito a situação”, complementou.

Além disto, em maio, o IBGE estima que 84,4 milhões de pessoas estavam ocupadas no País, embora 169,9 milhões estivessem em idade para trabalhar. Isso significa que menos da metade (49,7%) estava trabalhando no mês passado.

A pesquisa mostra também que o País somava 29,1 milhões de trabalhadores na informalidade, que são os empregados do setor privado sem carteira; trabalhadores domésticos sem carteira; empregados que não contribuem para o INSS; trabalhadores por conta própria que não contribuem para o INSS; e trabalhadores não remunerados em ajuda a morador do domicílio ou parente.

Esse contingente, porém, caiu ao longo do mês. Na primeira semana de maio, a taxa de informalidade foi de 35,7%. Já na quarta, ela havia recuado para 34,5%, com a redução de 870 mil postos de trabalho informais em relação ao início do mês.

“A informalidade funciona como um colchão amortecedor para as pessoas que vão para a desocupação ou para a subutilização. O trabalho informal seria uma forma de resgate do emprego, portanto não podemos dizer que essa queda é positiva”, afirma o diretor adjunto de Pesquisas do IBGE, Cimar Azeredo, complementando que é necessário aguardar os próximos resultados para avaliar com mais precisão o impacto da pandemia nesse grupo.

Entre as 74,6 milhões de pessoas que estavam fora da força de trabalho (que não estava trabalhando nem procurava por trabalho) na última semana de março, 23,7% gostariam de trabalhar, mas não buscaram trabalho devido à pandemia ou por falta de oportunidade no local onde vivem.

Afastamento

Já entre as 84,4 milhões de pessoas ocupadas, na última semana do mês, 14,6 milhões estavam temporariamente afastadas do trabalho devido ao isolamento social, o que representava 17,2% do total de empregados. Da primeira para a quarta semana de maio, o número de trabalhadores afastados caiu em aproximadamente 2 milhões.

Ainda entre os ocupados, a PNAD Covid-19 mostra que 8,8 milhões trabalharam de forma remota na última semana de maio. Isso representa 13,2% da população ocupada e não afastada do trabalho em virtude da pandemia.

Na primeira semana, esse número era de 8,6 milhões de trabalhadores em regime de home office ou teletrabalho.

Apesar das filas e das deficiências, o SUS foi e é fundamental para atender às demandas provocadas pelo impacto da Covid-19 (Reprodução/Internet)

SUS

O sociólogo Luiz Antônio confrontou os números da pesquisa e opinou, primeiramente, sobre o SUS. “O Sistema Única de Saúde [SUS] não é um sistema perfeito, tem muitas falhas. E, mesmo após 30 anos de sua criação, ainda não foi minimamente implementado”, considerou.

Para o professor da Ufam, a responsabilidade passa necessariamente pelos governantes. “A implementação não aconteceu porque o País não é capaz, mas porque não o trataram como uma prioridade nacional”, criticou.

Ainda segundo Antônio, a pandemia da Covid-19 serviu para desmistificar certos discursos. “A saúde privada tem muito glamour, mas, entrega muito pouco, fora que deve R$ 50 bilhões ao governo e ainda usa de uma artimanha interessante que é atender um paciente com um simples curativo e, na hora de trata-lo na área da complexidade, o encaminha para o Hospital 28 de agosto”, constatou.

Para o especialista, o SUS é fundamental para o povo brasileiro. “O SUS sempre foi fundamental, sem ele, com essa pandemia, seria um caos! Olhe para os Estados Unidos sem sistema público de saúde, são mais de 100 mil mortos, agora imagina isso no Brasil?”, instou.

‘Quem gera riqueza é o trabalhador…’

Já sobre os dados voltados ao home office, Luiz Antônio exortou os fundamentos teóricos da filosofia econômica. “Quem produz a riqueza no mundo são os trabalhadores. O capital fica ali, parado, imobilizado no prédio, na máquina, na matéria prima e isso não gera riqueza, quem gera riqueza é o trabalho”, postulou.

Em sua avaliação, o home office tem dois lados a serem observados. “O home office é uma modalidade de trabalho quase sempre exploradora e que remunera mal o trabalhador, porque grande parte desses profissionais está gastando sua água, sua energia elétrica, sua internet, fora que o tempo livre se mistura com o tempo de trabalho e, para completar, esses custos quase sempre não são remunerados pelo contratante”, criticou.

Mas, Luiz Antônio vê o lado positivo da questão. “O home office mostra que é possível incorporar tecnologias para reduzir, por exemplo, a jornada de trabalho sem reduzir salários. A modalidade pode aumentar ainda a oferta de trabalho porque, ao reduzir a jornada para seis horas, por exemplo, o contratante pode contratar o dobro de trabalhadores”, equacionou.

SUS, uma luta histórica

O Sistema Único de Saúde (SUS) é resultado da luta direta do povo brasileiro, para garantir proteção social. É o resultado concreto de décadas de experiências em saúde pública envolvendo profissionais da área sanitária, médica, biológica e social.

É um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, sendo o Brasil o único País com mais de 100 milhões de habitantes, a garantir assistência integral e completamente gratuita.

O SUS foi criado em 1988 pela Constituição Federal Brasileira, que determina que é dever do Estado garantir saúde a toda a população brasileira.

Seu início se deu nos anos 1970 e 1980, quando diversos grupos se engajaram no movimento sanitário, com o objetivo de pensar um sistema público para solucionar os problemas encontrados no atendimento da população defendendo o direito universal à saúde.

Desde então, o SUS é patrimônio do povo brasileiro e, apesar de duramente criticado e por muitas vezes mal gerido, é a guarida de milhões que por ele buscam, para sanar simples ou complexos problemas de saúde.

O sintoma mais frequente, segundo a PNAD Covid-19, foi a dor de cabeça, relatada por 10,2 milhões, seguido por nariz entupido ou escorrendo, queixa de 8,3 milhões, pela tosse, estimada em 6,5 milhões, e por dor muscular, relatada por 5,9 milhões de pessoas.

Dor de garganta (5 milhões), febre (4,8 milhões), perda de cheiro ou de sabor (3,7 milhões), fadiga (3,3 milhões) e dificuldade de respirar (2,9 milhões) foram outros sintomas de gripe captados pela pesquisa.

Isolamento reduziu pessoas com sintomas

Os resultados da pesquisa mostram que entre a primeira e quarta semana de maio, caiu de 26,8 milhões para 22,1 milhões o número de pessoas que relataram sinais de gripe, bem como diminuiu a frequência de todos os sintomas nesse período.

Segundo a coordenadora de Trabalho e Rendimento, Maria Lucia Vieira, é possível que esse recuo seja efeito do distanciamento social. “As medidas de isolamento fizeram com que pessoas acabem não se infectando, porque estão em suas casas. Por exemplo, quem tem filhos sabe que eles pegam gripe na creche e na escola, o que não ocorre com a suspensão das atividades”, explicou Maria Lucia.

Quase 60% dos doentes se automedicaram

A PNAD Covid-19 mostrou, também, que 83,5% das pessoas com sintomas gripais não procuraram nenhum atendimento ou estabelecimento de saúde.

Entre as 18,4 milhões de pessoas que, apesar de terem tido algum sintoma, não procuraram estabelecimentos de saúde, na semana de 24 a 30 de maio, 82,4% disseram ter ficado em casa; 58,6% tomaram remédio por conta própria; 13,3% tomaram remédio por orientação médica; 4,8% ligaram para algum profissional de saúde e; 2,4% receberam visita de algum profissional de saúde do SUS.

“Quando a gente conseguir uma série maior, com resultados de sintomas e atendimento médico por sexo e faixa de idade, inclusive com informações por estado, será possível um melhor mapeamento. Além disso, a pesquisa ajudará a conhecer os setores do mercado de trabalho mais afetados e que poderão ser favorecidos por políticas públicas”, destacou Maria Lucia.

PNAD Covid-19

As entrevistas começaram no dia 4 maio, e estão sendo feitas, exclusivamente, por telefone, devido ao distanciamento social. Pouco mais de dois mil agentes do Instituto estão ligando para 193,6 mil domicílios distribuídos em 3.364 municípios de todos os estados do país.

Para definir a amostra da nova pesquisa, o IBGE utilizou a base de 211 mil domicílios que participaram da PNAD Contínua no primeiro trimestre de 2019 e selecionou aqueles com número de telefone cadastrado.

Em maio, foram realizadas mais de 48 mil entrevistas por semana. As entrevistas duram em torno de 10 minutos e os moradores que receberem o telefonema podem confirmar a identidade dos agentes de coleta por meio do site Respondendo ao IBGE ou do telefone 0800 721 8181, e informar matrícula, RG ou CPF do entrevistador.

Os dados divulgados nessa terça correspondem às quatro semanas de maio. A partir da próxima divulgação, os indicadores agregados serão divulgados toda a semana.

Na última semana do mês, com os dados mensais consolidados, o IBGE vai apresentar dados por grandes regiões e unidades da federação, idade e sexo, entre outros indicadores mais detalhados de afastamento do trabalho e trabalho remoto.

A coleta está prevista para acontecer até um mês após o fim das medidas de distanciamento social.

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