Sistema de pesquisadores da UFPA reduz tempo de processamento do cacau e triplica lucros
15 de julho de 2024

Alessandra Leite – Especial para a Agência Cenarium
SÃO PAULO – Um novo sistema apresentado por pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) promete reduzir em até 70% o tempo de trabalho de processamento do cacau ainda no primeiro ano da implementação da máquina e quase triplicar o lucro anual dos produtores paraenses, cujo Estado contribui com mais da metade da produção nacional do fruto, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O Brasil é o sétimo maior produtor de cacau do mundo, e o Pará contribui com mais da metade da produção nacional do cacau.
O experimento ocorreu em uma fazenda da região cacaueira de Novo Regimento, no Pará, cuja produção anual é de 55 toneladas de cacau, embora em um fluxo considerado inconsistente que depende, em grande parte, do trabalho manual. As pesquisas iniciaram no ano de 2017.
De acordo com o estudo, publicado nesta segunda-feira, 15, na revista Engenharia Agrícola, o novo sistema – que consiste em uma máquina para quebrar vagens de cacau e outras inovações – pode aumentar o retorno financeiro em duas vezes e meia após o período de três anos. O trabalho aponta que o lucro do ano corrente da fazenda na produção de cacau, de cerca de 59 mil dólares, passaria para quase 150 mil dólares no terceiro ano de implementação da nova prática.
Os pesquisadores da UFPA calcularam a viabilidade técnica e econômica de possíveis mudanças na produção, com o intuito de otimizar o espaço e maximizar a eficiência. Além da máquina para quebrar as vagens, mudanças no posicionamento dos estágios de fermentação e secagem do fruto também foram recomendadas. No cálculo, os pesquisadores consideraram os custos das mudanças propostas e as expectativas de retorno nos três anos seguintes.
O pesquisador da UFPA e coautor do trabalho, André Mesquita, explica que hoje o processo de quebra é feito manualmente, embora alguns produtores já estejam começando a avaliar o uso das máquinas, que ainda não são suficientes para dar conta dos gargalos na produção do cacau.
“Deve ser implementado um sistema de gestão da fermentação com múltiplas caixas (cochos) de fermentação com a nossa proposta a partir dos resultados do estudo. A valorização do cacau vem com a produção, que é empregado para a produção de chocolate de alta qualidade. Porém, a fermentação que é realizada nas fazendas é uma etapa fundamental e um gargalo para a produtividade”, explica o professor do Laboratório de Fluidodinâmica e Particulados da UFPA.
Os maiores gargalos citados pelo pesquisador estão relacionados à logística e aos recursos, tendo sido a pesquisa realizada com fundos próprios do Tecnólogo, Parque de Tecnologia do Lago de Tucuruí, ligado à Universidade do Pará e com recursos de um produtor que adquiriu a máquina e investiu em uma nova casa de fermentação.
Ainda de acordo com o artigo, a tecnologia pode beneficiar as pequenas propriedades paraenses especialmente na produção de cacau fino, produto com sabor e aroma considerados superiores, utilizado em preparos da alta gastronomia. Mesquita explica que esse cacau pode custar o triplo do que é vendido em bolsa de valores, ou seja, como commodity.
“Hoje, esse tipo de produto é pouco rentável para pequenos produtores por causa do custo da colheita seletiva e da fermentação de alta qualidade envolvidos em sua produção. Nossa pesquisa pode contribuir na redução do custo e no aumento da produtividade de fermentação, possibilitando melhor condição de mercado”, esclarece o pesquisador.
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Centro de Inteligência do Cacau
Além da otimização dos processos, os resultados do experimento motivaram os pesquisadores a proporem a criação de um Centro de Inteligência do Cacau no Estado do Pará. Conforme Mesquita, o objetivo é gerar rentabilidade aos produtores locais, de maneira compatível com a qualidade dos seus produtos.
O coautor do trabalho enfatiza que a região cacaueira do Pará, em especial do Tuerê, vem se destacando no cenário do cacau, inclusive ganhando premiações em concursos especializados de cacau fino. “No entanto, essa qualidade demonstrada não chega, de fato, ao bolso dos produtores, se esvaindo da cadeia produtiva após a saída da amêndoa de suas fazendas. É nesse sentido que temos a intenção de fazer o centro atuar”, explica.
A proposta é constituída por pesquisadores da UFPA Campus de Tucuruí, UFPA Campus de Tomé Açu e da Universidade Estadual de Santa Cruz na Bahia. A criação do Centro e Inteligência está em análise para receber financiamento do Fundo de Desenvolvimento da Cacauicultura do Pará (Funcacau), um fundo do Governo do Pará para o desenvolvimento do cacau. “Esse pode ser um passo na solução desses entraves para o desenvolvimento do setor e especialmente dos produtores”, finaliza.