Temporada de queimadas em biomas no País será maior após desmonte de órgãos e programas de fiscalização

Vegetações dos biomas Cerrado, Pantanal e Amazônia (Reprodução/Internet)

Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS – Seguindo a tendência dos últimos dois anos, o número de incêndios propositais na Amazônia e no Pantanal correm o risco de aumentar ao longo de 2021. O fim de programas de combate a crimes ambientais e o desmonte dos órgãos de fiscalização nessas regiões contribuem com essa perspectiva. As queimadas cresceram em média 16% nestes dois biomas em 2020 – na comparação com 2019 – nos períodos considerados por especialistas como mais “seco”. Apesar da tendência de aumento nessas duas regiões, no Cerrado houve redução nos focos de calor.

De acordo com dados do painel Monitoramento dos Focos Ativos por Bioma do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) analisados pela REVISTA CENARIUM, as queimadas aumentaram 21% na Amazônia, entre julho e novembro, nos anos de 2019 e 2020. São nesses meses que a região tem geralmente o ‘Verão Amazônico’, quando o clima da região é mais seco, de acordo com o ambientalista Carlos Durigan.

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“A questão do período de queimadas está diretamente relacionada com o período que é conhecido como o ‘Verão Amazônico’, que vai entre julho e novembro aproximadamente. Têm anos que o verão inicia mais cedo ou custa um pouco mais, então o período de maior concentração de queimadas é nesse período mais seco”, afirmou Durigan, que também é geógrafo e mestre em Ecologia.

Segundo o especialista, as queimadas na região são usadas por comunidades tradicionais na preparação de terrenos para a agricultura, mas também são causadas por criminosos que devastam grandes áreas de terras da União e até mesmo terras destinadas à preservação ambiental.

“Tradicionalmente, as queimadas são utilizadas para agricultura tradicional, indígena e ribeirinha. As pessoas em geral preparam o terreno para agricultura meses antes de entrar no período seco e quando entra nesse período, aquelas áreas específicas são queimadas para o plantio. Isso também é feito por criminosos”, destacou Carlos Durigan.

Já no Pantanal, as queimadas aumentaram 271%. Na contramão, o Cerrado registrou queda de 11% nos focos de calor. Nesses biomas, as queimadas também têm maior incidência no período de seca.

“O período de seca é entre março e agosto, que corresponde ao inverno no hemisfério sul, e a dinâmica de queimadas também tem um aspecto muito ligado à agricultura, mas principalmente à pecuária. Há uma ligação forte das queimadas em áreas de pecuária extensiva, em que produtores ateiam fogo nos campos para renovação de pastagem e essas queimadas comumente perdem o controle e fogem para áreas de preservação natural”, lembrou ainda o ambientalista.

Queimadas e desmatamento

Não por coincidência, o desmatamento na Amazônia foi recorde em 2020, segundo o sistema de Alerta de Desmatamento do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). No Pantanal, o ano foi o que teve mais registros de fogo desde o fim da década de 90, quando o monitoramento do Inpe começou. Em setembro do ano passado, investigações da Polícia Federal apontaram que ao menos cinco fazendeiros foram responsáveis pelas queimadas.

O desmate na Amazônia cresceu 30% no ano passado. Entre janeiro e dezembro de 2020, a floresta perdeu 8.058 km² de área verde. Em comparação com 2019, foram derrubados 6.200 km² de floresta. Só em dezembro de 2020, os satélites registraram 276 km² de devastação, o que também significa recorde para a década.

O incêndio no Pantanal foi o maior em 14 anos na região e destruiu nove vezes mais do que o desmatamento nos últimos dois anos. Todos os municípios do Pantanal registraram focos de incêndio entre julho e setembro. Os incêndios atingiram cinco Terras Indígenas, três parques estaduais, um nacional, uma área de proteção ambiental, duas reservas particulares e uma estação ecológica.

De acordo com o monitoramento realizado pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa), o Pantanal teve mais de 2,3 milhões de hectares atingidos pelo fogo entre 1º de janeiro e 7 de setembro, o equivalente a duas vezes o tamanho da cidade do Rio de Janeiro. Somente nos meses de julho e agosto foram atingidos 1.654.000 hectares.

A relação desmatamento e queimada é percebida no aumento desses números, já que o primeiro passo para transformação de uma área é a retirada da mata e o segundo é o atear fogo. Nos grandes focos de calor registrados, as queimadas são geralmente causadas pela ocupação ilegal de terras públicas.

“Os processos estão ligados, hoje sabe-se que o aumento do desmatamento e o aumento das queimadas anualmente está diretamente relacionado à ocupação ilegal de terras públicas. Então essas terras são aquelas que ainda não foram destinadas para uso ou são também áreas protegidas, territórios indígenas e quilombolas, onde tem havido muita invasão pra ocupação ilegal”, destacou ainda o ambientalista Carlos Durigan.

Desmonte da fiscalização

A Amazônia ficará órfã a partir de abril de 2021 da Operação Verde Brasil 2, que tem as Forças Armadas atuando na proteção da região por meio da Garantia da Lei e da Ordem (GLO). As Forças Armadas também foram designadas para proteger Terras Indígenas (TI), Unidades de Conservação (UC) Ambientais Federais, além de atuar em outras áreas sob responsabilidade do Executivo nos nove Estados que compreendem a região.

A nível nacional, o Ministério do Meio Ambiente (MMA), sob o comando de Ricardo Salles, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) sofrem, desde 2019, um desmonte da política ambiental, fator que levou ao desligamento de servidores atuantes na fiscalização das florestas.

“A fragilização da políticas de prevenção e combate a incêndios afeta esses biomas da mesma forma, porém com um grau até mais complicado porque os outros biomas [Cerrado e Pantanal] não possuem programas que prevenção a queimadas como é o caso da Amazônia, há aí uma diferenciação histórica de programas voltados a combater essas questões”, lembrou o ambientalista Carlos Durigan.

A reportagem questionou as assessorias de comunicação do MMA, Ibama e ICMBio sobre que estratégias devem ser adotadas após o encerramento da GLO e referente a ações que estão sendo feitas no combate às queimadas no Pantanal e Cerrado, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

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