TJAM revê decisão e mantém matérias da CENARIUM sobre blogueira e empresário
Por: Jadson Lima
19 de novembro de 2024
MANAUS (AM) – O Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) suspendeu nesta terça-feira, 19, os efeitos da decisão judicial que tirou do ar as matérias da CENARIUM as quais deram transparência ao contrato no valor global de R$ 87 milhões entre a Secretaria de Educação do Amazonas (Seduc/AM) e a Hapvida Assistência Médica LTDA., via Provisa Corretora de Seguros Ltda. A corretora tem sociedade composta por Francisco de Assis Alexandre e Janary Wanderlei Gomes Rodrigues, marido da blogueira Cileide Moussallem.
A decisão judicial foi publicada na tarde desta terça-feira e assinada pelo desembargador Lafayette Carneiro Vieira Júnior. O magistrado cessou os efeitos da decisão da desembargadora Onilza Abreu Gerth, publicada nessa segunda-feira, 18, que estabelecia a retirada das matérias do ar por violação à imagem dos três envolvidos.
O magistrado destacou que a decisão que retirou os conteúdos jornalísticos do ar merece reparo. Segundo Vieira Júnior, a suspensão das matérias poderá “causar risco de lesão grave ou de difícil reparação ao agravante, bem como fere o direito de liberdade de imprensa e expressão, uma vez que não vislumbro excesso nos conteúdos das notícias”. Veja trecho:

“Defiro a Tutela de Urgência, para suspender os efeitos da decisão fustigada, para garantir à Recorrente o retorno das publicações veiculas objeto do presente recurso até o julgamento de mérito dessa insurgência, ou, ulterior deliberação deste relator”, diz outro trecho da decisão. Veja:

No recurso contra a decisão que havia determinado a remoção das matérias, a CENARIUM afirmou que a medida configura “censura prévia“, expressamente vedada pela Constituição Federal de 1988. A jurídico também apontou que “não há evidencias robustas de que as matérias tenham causado danos efetivos à imagem [do empresário dono da Provisa]”.
Os conteúdos jornalísticos publicados pela CENARIUM abordam fatos de interesse público, “sendo frutos de apurações jornalísticas legítimas”. A liberdade de imprensa deve prevalecer “salvo abuso evidente, o que não foi demonstrado no caso concreto”, segundo consta na decisão.
“Ficando evidenciado que o juízo de origem privilegiou a proteção à honra de forma desproporcional, desconsiderando o impacto negativo que a remoção das matérias tem sobre o direito da sociedade de ser informados, e a tutela poderia ter determinado medidas alternativas, como o direito de resposta proporcional ao agravo, sem necessidade de remoção das publicações, preservando tanto a liberdade de imprensa quanto a reputação do agravado”, cita outro trecho da decisão.

Entenda o caso
A Hapvida Assistência Médica LTDA. teve contrato de R$ 87 milhões rescindido pelo Governo do Amazonas por ineficiência no atendimento a servidores da Secretaria de Educação do Amazonas (Seduc/AM). A empresa do ramo de saúde tem ligação com o marido da blogueira Cileide Moussallem, o empresário Janary Wanderlei Gomes Rodrigues.
A relação se dá por meio da Provisa Corretora de Seguros Ltda., que tem Janary como sócio-administrador. A corretora Provisa vende opções de planos de saúde da operadora de saúde Hapvida, conforme site oficial da empresa, no qual as duas pessoas jurídicas aparecem como parceiras.

Atendimento ineficaz
Em dezembro de 2022, após apresentar ineficácia na prestação dos serviços de saúde a colaboradores da Secretaria de Educação do Amazonas (Seduc/AM), assim como o risco de falência, a Hapvida NotreDame Intermédica teve convênio suspenso pelo Governo do Amazonas.
O contrato 007/2022 foi firmado pela Seduc para fornecer atendimento médico aos servidores da secretaria, na capital e no interior do Amazonas, que somavam, aproximadamente, 20 mil beneficiários. O valor do contrato era de R$ 87 milhões.

Na época, o Sindicato dos Trabalhadores da Educação do Amazonas (Sinteam) afirmou que a empresa não conseguia atender a demanda e resistia às melhorias solicitadas pelos servidores. A Hapvida também estava com 28% de probabilidade de insolvência no Ibovespa.
Diante deste cenário, a Seduc rescindiu, em 2023, o contrato com a Hapvida, conforme mostra publicação do Diário Oficial do Estado (DOE) do dia 1° de março daquele ano. A rescisão do contrato ocorreu, segundo consta na Portaria GS N° 179, a partir de relatório da Comissão Permanente de Apuração de Irregularidades Contratuais (Caic). (Veja abaixo)

Ameaças de Cileide
Após a publicação das matérias, a diretora da CENARIUM, Paula Litaiff, passou a ser alvo de ataques. Em 11 de novembro, três dias após a publicação da reportagem intitulada “Empresa que negligenciou plano de saúde na Seduc/AM é ligada à blogueira e marido”, a blogueira atacou Litaiff no grupo de mensagens de WhatsApp “Grupo dos Jornalistas do Amazonas”, e citou as filhas da jornalista.
“(…) ela vai pagar caro (…) Ela tem filhas. Ela sabe onde está se metendo. Quem paga são os filhos. A vida tem volta. (…) Pode escrever. Vai ter o que merece. Ela tem filhas. Paula Litaiff, meus filhos te acharam até o inferno. Agora vou ter que te achar nem que seja no inferno (sic)”, ameaçou Cileide Moussallem, por meio do número de telefone (92) 99269-xxxx. Veja prints:


As ameaças foram repudiadas por entidades nacionais da imprensa, como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), a Associação de Jornalismo Digital (Ajor) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), por meio do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Amazonas (Sinjor/AM).
A Abraji apelou à apelou à Secretaria de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM) e ao Ministério Público do Amazonas (MP-AM) a apuração com rigor das ameaças de morte relatadas. Já a Ajor defendeu uma investigação “criteriosa e detalhada do caso”, que foi denunciado às autoridades do Amazonas na quarta-feira, 13.
Além das entidades, o Sinjor-AM defendeu, também na quinta-feira, 14, que um inquérito policial seja instaurado pela Delegacia Geral de Polícia Civil do Amazonas para apuração das denúncias relatadas às autoridades pela diretora da CENARIUM.
Veja a íntegra da decisão: