Amazônia Legal concentra o menor investimento em educação por criança, mostra pesquisa

Aluno da Amazônia espera lancha-escola para ir para aula em registro antes da pandemia. (Divulgação)
Com informações do Infoglobo

BRASÍLIA – Três a cada quatro crianças que vivem em Estados da Amazônia Legal moram em cidades em que o investimento médio em educação é inferior à média nacional. Apesar de essas localidades investirem valores consideráveis em relação ao PIB municipal, o montante é insuficiente para suprir as necessidades dos alunos e isso acaba refletido na perpetuação do baixo desempenho em avaliações nacionais.

Esse é o principal achado da equipe do economista Carlos Eugênio da Costa, professor da Fundação Getúlio Vargas e pesquisador do projeto Amazônia 2030, divulgado no relatório Finanças Públicas na Amazônia — Serviços e Resultados Educacionais.

O grupo analisou os dados de investimentos em educação e o desempenho em avaliações nacionais como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e o Indicador de Nível Socioeconômico (Inse) referentes a 2019 para comparar o desempenho dos nove Estados da Amazônia Legal em relação ao restante do País.

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O recorte temporal foi escolhido para avaliar qual a situação anterior à pandemia da Covid-19, já que as cicatrizes produzidas neste período afetarão a todos os alunos, com mais peso para aqueles que vivem em regiões mais carentes. Para Costa, o principal ponto é analisar como uma política pública promove a qualidade de vida das pessoas ponderando as diferenças regionais. No caso da Amazônia Legal, dois fatores ajudam a explicar a insuficiência nos gastos por aluno:

“O que a gente tem é um esforço no sentido de uma dedicação de porcentagem grande do PIB, mas quando faz a conta do quanto isso se transforma em gasto por estudante, dois fatores fazem com que os gastos sejam menores que a média nacional: a pobreza da região e sua demografia. O gasto ainda é menor por ter uma população relativamente mais jovem”.

Investimento insuficiente

Nenhuma região investe mais em educação proporcionalmente em relação ao PIB, no agregado de Estados e municípios, do que os Estados que compõem a Amazônia Legal, que somam 7,14% ante 4,03% das demais regiões.

O problema vem quando se analisa quanto esses valores representam por aluno em idade escolar. É esse o critério que faz a Amazônia ficar para trás. O investimento per capita, de R$ 4.491,73, está abaixo da média das demais regiões e é o segundo pior resultado do País, que é de R$ 5.050,90.

Apenas o Nordeste tem um desempenho inferior, de acordo com a pesquisa. A região também reserva um percentual alto do PIB para edução – 6,57% –, mas ao dividir esses recursos por aluno, o resultado é de R$ 3.977,66 por estudante. Para comparação, a região Sudeste é a que tem o maior investimento por estudante, com R$ 5.577,63, e o menor porcentual em relação ao PIB – 3,49%.

O menor investimento por aluno é um dos fatores que ajudam a explicar o pior desempenho nas avaliações de desempenho escolar. A média do Ideb para os municípios que compõem a Amazônia legal é de 4,90 para os anos iniciais do ensino final e de 4,15 para os anos finais. Para a média nacional, os valores apurados, respectivamente, são de 5,87 e 4,69.O economista Carlos Eugênio da Costa argumenta que essa diferença de desempenho não é causada apenas pelo investimento por aluno:

“O principal fator para explicar isso é o ambiente socieconômico em que elas vivem. A criança que está em um lar em que os pais têm pouca escolaridade, pouco acesso a bens materiais, já sai com desvantagem. Aí tem um Estado que por mais que se esforce, não consegue igualar o gasto educacional e isso reflete em uma perpetuação da desigualdade”.

As condições socioeconômicas das crianças na região foram evidenciadas com a análise do Inse, calculado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O indicador para a Amazônia Legal é de 4,31, ante 4,80 para as demais regiões. Em três quartos dos municípios desses Estados, o índice está abaixo da média nacional.

O estudo destaca que, apesar do esforço dos gestores para elevar os gastos totais com educação, o quadro socieconômico mais frágil e a demografia da região, caracterizada pelo maior número de jovens, acabam tornando esse esforço insuficiente. O volume maior de dinheiro acaba “minguando” quando dividido entre mais crianças e adolescentes.

Para os pesquisadores, esse é um quadro desalentador para as crianças da região. “Elas já fazem parte de uma realidade socioeconômica pior e, em vez de gastos maiores para compensar a diferença, veem sua desvantagem ser potencializada por gastos inferiores à média nacional”, diz o relatório.

Eles ainda ponderam que, para além do rastreio mais óbvio dos recursos, há uma parcela do mau desempenho escolar que não é explicada apenas pelas informações do gasto público. “Ela está possivelmente relacionada a especificidades da região que dificultam a efetividade desse gasto como o alto grau de isolamento de uma parcela substantiva de sua população”, dizem.

Região heterogênea

A Amazônia Legal é composta por oito Estados – Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins – e parte do Estado do Maranhão. Apesar de o conjunto apresentar resultados ruins, a heterogeneidade na região é enorme.

“O Mato Grosso é um mundo à parte, um Estado rico, ao contrário do restante da região. Tem especificidades para os Estados que são ex-territórios, como o Acre, e Pará e Maranhão estão em desvantagem em quase tudo”, observa Costa.

No caso específico da análise sobre educação, o desempenho do Mato Grosso destoa do restante da região. O Estado investe mais do que a média nacional, tanto em percentual do PIB quanto por aluno.

Em contrapartida, Pará e Maranhão, que concentram maior população, também vivem situação mais crítica, em que mais de três quartos das crianças vivem em municípios com indicador de nível socioeconômico menor que a média nacional. No Maranhão, o investimento por aluno também é inferior à média do País.

Costa alerta que esses dados trazem um panorama pré-pandemia, e que o ensino remoto trará um adicional para todos os Estados, mas que se acumulará mais entre aqueles que são mais pobres, como é o caso da Amazônia Legal.

“Uma criança que foi colocada em ensino remoto, em uma casa cujos pais não tem um nível educacional elevado e muitas vezes não tem qualidade de internet para acompanhar as aulas, a quem ela recorre na hora da dúvida? Essa desigualdade vai ser agravada. A pandemia vai deixar feridas, cicatrizes, e as formas serão maiores nas crianças mais pobres, o que significa que daqui para frente, o esforço será ainda maior”, pondera.

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