Especialistas alertam sobre exposição nociva do celular para crianças durante pandemia

De acordo com o psicólogo, o desenvolvimento social pode ser afetado (Reprodução/internet)
Priscilla Peixoto – Da Revista Cenarium

MANAUS – Que as crianças hoje em dia já dominam objetos eletrônicos desde os primeiros aninhos de vida, isso ninguém duvida. Ver um pequeno brincando ou assistindo desenho no celular ou tablet se tornou algo comum. Mas, em tempos de pandemia, as horas de exposição nesses dispositivos aumentaram consideravelmente. Em maio deste ano, Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) fizeram um alerta, alegando que horas em frente à tela do celular podem ser nocivas às crianças. E que é preciso dar um limite na hora de recorrer à distração tecnológica oferecida aos filhos.

Em entrevista cedida para a Agência Brasil, a coordenadora do Programa Primeira Infância Plena da UFMG, Delma Simão, afirma que o uso do aparelho deixou de ser uma alternativa para se tornar única via.

“A situação que a gente vive hoje é de uma falta de alternativa muito grande para os pais que estão em trabalho remoto, muitas vezes sem ajudante em casa, e que precisam de alternativa para a recreação da criança no momento que precisam trabalhar ou fazer atividades domésticas. A questão é que o uso da tela se tornou muito mais que uma alternativa, tornou-se a única via e isso nos preocupa”, diz a coordenadora.

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Ainda durante a entrevista, a pesquisadora ressalta que não recomenda contato com os aparelhos para as crianças que tenham até um 1 ano de idade. Após este primeiro ano, a indicação vai mudando conforme a idade, mas desde que estejam cientes de que, até os 6 anos, o máximo de tempo em exposição às telas não ultrapasse duas horas ao dia.

Para o psicólogo Afonso Brasil, uma criança que fica demasiadamente em frente ao celular sofre vários efeitos nocivos, principalmente no quesito relações socais, desenvolvimento de vínculos e imposições de limites.

“Uma criança que passa o dia todo com um dispositivo nas mãos, as relações sociais dela vão ficar depreciadas. Talvez essa criança não esteja tendo tanto convívio familiar ou com outras crianças da mesma idade para se desenvolver no aspecto social. Aí você nota os malefícios nesse processo de desenvolvimento. Pois nós precisamos dessas relações, desde a imposição de limites, ao se espelhar em comportamentos que possam servir de aprendizado e tudo isso se dá dentro das relações sociais, se o nível dessa relação diminui, o desenvolvimento da criança também vai diminuir”, explica o psicólogo.

Os especialistas aconselham, no máximo, duas horas de uso do aparelho por dia (Reprodução/internet)

Criança em casa não é fácil

Para muitos pais e responsáveis, procurar alternativas bem mais atrativas que o celular, nem sempre é fácil. O aparelho eletrônico, por meio da internet, oferece uma vasta opção de jogos, desenhos, filmes entre outras distrações obtidas apenas com um click. Às vezes, nem mesmo as tradicionais brincadeiras de bola, amarelinha, boneca, casinha são suficientes para gastar energia e entreter os pequenos.

É o caso de Bianca Alcântara. Com apenas 8 anos de idade, a menina já dominava os comandos dos smartphones. Após a pandemia, a facilidade de manuseio do aparelho e tempo de exposição à tela aumentou. De acordo com a mãe, Daniela Silva, de 34 anos, a necessidade de se recolher, a suspensão das aulas e toda uma vida com afazeres foi uma situação delicada e inesperada que pode ter contribuído para o aumento de tempo em que a filha fica no celular.

“Ela tinha uma rotina, ia para escola, fazia aula de balé, atividade extras. Quando chegava, era normal ir brincar com a bonecas, brinquedos e de vez em quando usar o celular. Mas o que era para ser passageiro, perdurou, e quando percebemos, brincar muito tempo sozinha com os brinquedos já não distraia nossa filha. O celular se tornou o principal coleguinha, usa para ver desenhos, vídeos, jogos e falar com as coleguinhas de escola”, conta a mãe.

Daniela se preocupa com as consequências do uso excessivo e conta que notou uma diferença de comportamento no último mês, tanto em casa quanto no desenvolvimento escolar.

“Ela tem ficado mais distante, calada e caiu um pouco o rendimento nos estudos. Resolvemos limitar o tempo de uso, por mais que ela seja sozinha e o celular seja uma opção para ela se conectar com o mundo. Tentamos distraí-la como dá, conversando, interagindo, desenhando, colorindo, comprando brinquedos que coloquem a família para interagir. Não tem sido fácil, pois o uso do aparelho se torna um vício para nós adultos, imagine para uma criança”, avalia.

Questões pedagógicas

Na avaliação do pedagogo e educador infantil, Abel Santos, no quesito ensino aprendizagem, os recursos tecnológicos como os smartphones e tablets ou qualquer outro recurso, só atinge a um propósito educativo se as relações forem bem estabelecidas.

“Eles são meios para se chegar a um fim. Como estamos tratando de crianças, temos o fator atenção. Os pequenos perdem o interesse ou a atenção bem mais rápido. Um exemplo disso são as videoaulas que geralmente possuem um tempo menor, necessitando que o professor seja bem objetivo em sua explanação”, explica o pedagogo.

O pedagogo também alerta para os pontos negativos e positivos enquanto educador. Ele considera que os aparelhos eletrônicos são itens básicos de interação no momento de distanciamento social, até mesmo para os pequenos que de forma muito particular, também sentem os efeitos da mudança brusca de rotina. Na avaliação de Abel, além de imposição de limites, é possível explorar a ferramenta de forma educativa e estimulando até mesmo o não uso do celular por horas seguidas.

“Acredito que dá para transformar o uso do celular a favor das crianças. Os pais podem sentar com os filhos e procurar por vídeos que estimulem brincadeiras para entreter os pequenos quando não estiverem com o aparelho nas mãos. A chave não é proibir, mas monitorar e usar de forma mais inteligente e proveitosa possível.

O supervisionamento dos pais é importante para que as crianças não consumam conteúdos impróprios (Reprodução/ ISTOCK)

Acompanhamento

O psicólogo Afonso Júnior também alerta para a importância de acompanhamento das crianças durante o uso do telefone celular. O uso sem o monitoramento pode causar a precipitação de informações na qual a criança ainda não tem maturidade para assimilar com conteúdo impróprios.

“É um perigo real. Expor a criança a conteúdos impróprios pode evidenciar questionamentos fora de hora a partir disso”, alerta o especialista. O psicólogo também completa que bens materiais e ferramentas do tipo jamais irão substituir a necessidade de afeto para o desenvolvimento saudável do ser humano.

“Nunca e jamais isso vai suprir a necessidade de afeto que o ser humano tem para seu próprio desenvolvimento. A conversa, carinho e socialização são fundamentais para o progresso de qualquer indivíduo. É importante que tudo seja equilibrado, a palavra-chave é equilíbrio e observar o comportamento e o desenvolvimento pós-pandemia”, orienta o psicólogo.

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