Amazônia Legal tem mais de 80 mil áreas de garimpo, diz Ipam

Garimpo de cassiterita na Terra Indígena Tenharim do Igarapé Preto, Amazonas - (Vinícius Mendonça/Ibama)
Jacildo Bezerra – Da Revista Cenarium

BOA VISTA (RR) – Uma nota técnica publicada pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) nesta sexta-feira, 26, mostra que há 80.180 pontos de garimpo na Amazônia brasileira em uma área de 241 mil hectares – mais de duas vezes o tamanho da cidade de Belém.

Cerca de 10,5% dessa área, ou 25 mil hectares, está em 17 terras indígenas diretamente invadidas. Segundo a análise do Ipam, outras 122 estão em bacias hidrográficas garimpadas, totalizando ao menos 139 territórios e seus rios contaminados pela atividade.

Mesmo a mineração localizada fora dos limites de terras indígenas não está tão longe assim. Ocupando uma área de 84,3 mil hectares, 44% desses pontos de garimpo se fixaram em um raio de até 50 quilômetros das bordas dos territórios.

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Terra Indígena Pirititi, Roraima (Felipe Werneck/Ibama)

A constatação ratifica o que havia sido divulgado em 2023 pela Agência WWF em agosto de 2023 a pedido da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), de que a atividade ilegal despeja mais de 150 toneladas de mercúrio por ano na região. Para chegar a esses dados, os pesquisadores consultaram 100 estudos a respeito.

Como 68% da floresta está em território brasileiro, os ribeirinhos brasileiros são os que mais sofrem. Segundo os estudos, a concentração média de mercúrio em humanos nessas comunidades é de 15,4 ppm. A quantidade máxima estipulada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de 10 partes por milhão (ppm). Ou seja, acima desse limite, os efeitos para a saúde são graves e irreversíveis.

O aumento do garimpo ilegal nos últimos anos foi facilitado por decisões políticas, acarretando em sérias violações ambientais e dos Direitos Humanos em comunidades indígenas e tradicionais. E a proliferação de garimpos ilegais em Terras Indígenas e Unidades de Conservação está diretamente ligada à fragilidade das leis, ausência de monitoramento efetivo, negligência das autoridades e fragilidade socioeconômica das áreas exploradas.

Foi o que afirmou o geógrafo Alexandre Bezerra, especialista em Meio Ambiente pela Universidade Federal do Pará e Consultor no Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). Alexandre disse ainda que a omissão dá espaço para a ocorrência de uma série de ilegalidade nos territórios.

Para o consultor, além das mazelas causadas ao meio ambiente, a contaminação por mercúrio proveniente do garimpo ilegal na região Amazônica pode levar ao desenvolvimento de doenças neurológicas, imunológicas e falhas reprodutivas tanto em seres humanos quanto na fauna local. “Segundo as análises às quais tivemos acesso, cerca de um quinto dos peixes consumidos na região apresentam níveis de mercúrio acima dos limites considerados seguros pela FAO e a Anvisa”, declarou Alexandre. 

O pesquisador afirmou ainda que os danos provocados pelo garimpo ilegal no meio ambiente são extremamente preocupantes, causando graves impactos nos ecossistemas naturais, devido à redução da vazão dos rios, o aumento do acúmulo de sedimentos e à contaminação gerada pelos resíduos das atividades garimpeiras.

“A contaminação por mercúrio está se expandindo e se tornando mais frequente entre as populações e a biodiversidade amazônica, especialmente na vida aquática. A situação que é observada no corpo humano, como mencionado anteriormente, pode causar diversas doenças degenerativas. Pesquisas apontam para níveis de metal pesado significativamente acima do normal na fauna. No entanto, ao contrário dos seres humanos, ainda não há certeza sobre os impactos desse excesso de mercúrio nos organismos desses animais”, disse.

Garimpo causa devastação e contamina água – (Vinícius Mendonça/Ibama)
O avanço sobre as Terras Indígenas

A Nota do Ipam elucida que o ápice da invasão de terras indígenas amazônicas pelo garimpo ocorreu de 2016 a 2022, durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro. Nesse período, os povos originários viram a atividade crescer 361% em suas  terras.

A maior parte (78%) da área invadida por garimpeiros em terras indígenas surgiu nesse período. Entre 1985 a 2022, a área garimpada cresceu 16 vezes dentro dos territórios; e 12 vezes em todo o bioma. As terras indígenas Kayapó, Munduruku e Yanomami, nessa ordem, são as mais invadidas.

O território Kayapó, habitado por povos Mebêngôkre e isolados às margens do rio Xingu, no Pará, tem 55% de toda a área garimpada em terras indígenas na região. Juntas, as três concentram 90% da área indígena invadida por garimpos.

Dentro das terras Kayapó, a mineração ilegal cresceu 1.339% em 38 anos. No território Munduruku, também no Pará, o aumento foi de 129 vezes no período. E na terra Yanomami, em Roraima e no Amazonas, o garimpo ampliou em mais de 20 mil vezes a área invadida, no mesmo intervalo.

Terra Indígena Kayapó devastada pelo garimpo ilegal de ouro – (Felipe Werneck/Ibama)

Uma análise do histórico de regulamentação das atividades minerárias, desenvolvida no estudo, revela direções diferentes adotadas pela legislação. “O impacto do garimpo tem um alcance muito maior do que a área diretamente afetada por essa atividade. Com isso, os poluentes contaminam rios, solos, fauna e flora que acabam afetando a saúde dos povos indígenas da região”, diz Martha Fellows, coordenadora do núcleo de estudos indígenas do Ipam.

“Há uma disputa legal para regulamentar a atividade minerária. De um lado, mecanismos legais que buscam garantir a segurança socioambiental; do outro, tentativas de afrouxar e até desrespeitar os direitos indígenas fundamentais”, acrescenta Fellows.

Leia mais: Amazônia: garimpo avança 361% em Terras Indígenas entre 2016 e 2022
Editado por Aldizangela Brito

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