Crônicas do Cotidiano: para onde caminham os Meios de Comunicação

Marshall McLuhan, nos anos 60 do século passado, no prefácio da sua obra seminal, Os Meios de Comunicação como Extensões do Homem (1964), anunciou a Era das Comunicações e do Globalismo: “Hoje, depois de mais de um século de tecnologia elétrica, projetamos nosso próprio sistema nervoso central num abraço global, abolindo tempo e espaço (pelo menos naquilo que concerne ao nosso planeta). Estamos nos aproximando rapidamente da fase final das extensões do homem: a simulação tecnológica da consciência, pela qual o processo criativo do conhecimento se estenderá coletiva e corporativamente a toda a sociedade humana”. E é verdade! Isto está já acontecendo com a Inteligência Artificial e a Internet das Coisas. Mas, como todas as previsões messiânicas, nunca são previstos os seus efeitos colaterais. O tempo de suas realizações lhes confere a entropia e a complexidade necessárias para que todo o ideal de igualdade seja alcançado ou negado. É certo que essa euforia do progresso humano nos cânones do capitalismo já era pedra cantada e a apropriação socializada dos meios de produção tecnológicos e do conhecimento científico foram fracassando, de forma inversamente proporcional. E o que temos? A perplexidade do que não veio (a coletivização do saber) e a simulação tecnológica, feita pelos algoritmos, que levam as consciências para o moinho das vontades de um poder concentrador e universal, que dita as batidas dos sinos a reger o nosso despertar, o nosso fazer e o nosso adormecer. Primeiro foi o universo e a natureza, depois os meios e, agora, a humanidade, transformados em discurso.

Era de se supor que os Meios de Comunicação de Massa que se fizeram as instituições mais referenciadas da segunda metade do século XX – instrumentos do capitalismo liberal e de sua ideologia, bem como sendo eles, na teoria maluhaniana, a própria mensagem ou as Massagens (idade das massas) – fossem capazes de suportar as transformações avassaladoras do capitalismo e das tecnologias. Tudo indica que fracassaram e sua derrocada aponta para um vazio que nenhuma das transições por nós vistas (da pintura para a fotografia, desta para animação do cinema, do telégrafo para o rádio e do rádio para a TV) se igualam. O problema não é a transição de um modelo de comunicação para outro e sim para o desconhecido. Poderíamos responder: para o “celular”! Não se trata de mudança de um meio tecnológico para outro segmentado, embora o celular já reúna funções de vários meios tecnológicos. Qualquer novo modelo pressupõe um novo modo de vida, de práticas sociais, de relações comportamentais e afetivas, econômicas e sistêmicas, muito especiais. Não seria por outras razões que os Estados, fundados nos princípios liberais do direito, da liberdade de expressão e da igualdade entre os sujeitos de direito, estão empenhados em regular “a mídia”, hoje operando sem o alcance de uma “legislação apropriada”, visto não serem esperados os problemas de natureza tão diversa nas relações individuais, coletivas e institucionais por ela provocados.

A presença dos Meios de Comunicação tradicionais sempre foi forte entre nós, mas a força das novas mídias é avassaladora, o que nos coloca em proeminência mundial como internautas e consumidores de todos os produtos do cardápio midiático, apesar das nossas desigualdades sociais. As consequências têm sido drásticas, desorganizando todo o convívio social, as relações dos sujeitos entre si e com as instituições permanentes do Estado e da Sociedade. O uso das redes sociais para disseminação de fake news é, apenas, uma parte ínfima dos problemas ideológicos. Já os modelos de negócio a que estavam acomodados os conglomerados de comunicação, estes se esfacelaram e não há como recuperá-los. O espelho disso é o fim dos astros da mídia – as celebridades -, o fim do jornalismo investigativo, o fim das editoras e livrarias e das galerias e exposições de artes. É latente o receio: com a Inteligência Artificial; com o ímpeto do metaverso, da educação a distância, da medicina virtual, da Escola High Tech; com as Big Techs e Big Datas, que tudo veem e guardam. A transição é de um sistema fechado para um sistema autopoiético, algo que desconhecemos, mas com o “vínculo fecundante e a comunicação verbal: carne e espírito, corpo e cultura”, como no dizer de Darcy Ribeiro sobre o romance da vida toda (Testemunho, 2022).

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Jornalista Profissional

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(*)Jornalista Profissional, graduado pela Universidade do Amazonas; Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo; Professor Emérito da Universidade Federal do Amazonas.

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