Crônicas do cotidiano: Quando o jornalismo renuncia à liberdade de expressão

Aprende-se que são funções sociais do jornalismo: informar, analisar, opinar, orientar, apoiar iniciativas sociais positivas e combater o obscurantismo. E deve fazê-lo com honestidade, decência, independência, responsabilidade e liberdade. A liberdade de imprensa, calcada na liberdade de expressão, é assegurada nos países livres e inscrita na nossa CF de 1988, na Lei de Imprensa, recepcionada pela mesma Carta e por farta jurisprudência, que assegura não só a liberdade de informar, mas, também, afasta todas as formas de censura por parte do Estado, instituições, grupos ou sujeitos que, por uso de força arbitrária, tentem impedir o direito à informação.

O que vemos, no entanto, apesar de todas as garantias, é um afastamento desses princípios em nome de interesses econômicos, de interesses explicitamente político-ideológicos ou, ainda, o que é mais grave, para escamotear a verdade “em nome da fé, da falsa moral e dos bons costumes” ou, não raro, com o fito de promover a desinformação e a mentira na propalada “guerra cultural”.

A grande imprensa é a responsável pela disseminação da informação em larga escala; pela orientação dos segmentos da opinião pública; pela educação para a cidadania, o que favorece a tomada de consciência, com reportagem dos fatos, análise do contexto onde acontecem e da opinião sobre os mesmos na vida social em geral e na comunidade em particular.

PUBLICIDADE

Essa visão liberal do jornalismo é a preponderante nos países capitalistas que adotaram o liberalismo e, também, a democracia como forma política de Estado. Isso não implica em aceitar a falácia da “imparcialidade no jornalismo” e não avaliar seus conteúdos. O Estado Democrático de Direito, no Brasil, consagra todos os princípios que nos garantem, juridicamente, uma imprensa livre e respeitável, se assim quiser.

Outrossim, não desconhecemos: os meios de comunicação vêm sofrendo alterações  com o desenvolvimento e aplicação das novas tecnologias, o que altera os modelos de negócio; a imprensa, nos países capitalistas, é uma instituição ligada ao mercado e o jornalismo tornou-se a sua mercadoria;  alteram-se as formas de distribuição dos produtos da imprensa e o feedback (a resposta dos receptores); foram alterados os formatos de apresentação dos conteúdos para bem servir aos públicos segmentados; foram modificados os modos de constituição jurídica e formal das instituições ou empresas do jornalismo, isto é, aquele veículo de jornalismo que tinha um dono, ou donos organizados em empresa de capital limitado ou aberto, tinha uma sede, assinantes e locais de distribuição e venda.

Mas, nada disso altera os objetivos e os compromissos de quem faz jornalismo, seja na sua forma tradicional, seja por novos modos que a internet, hoje, proporciona: on-line, streaming, via Blogs ou Portais de Notícias, nas redes sociais, no rádio e TV, via internet ou mesmo em redes abertas.

As facilidades para a expansão das atividades do jornalismo, reguladas ou não, fazem a diferença de qualidade, visto que a captação, tratamento, formatação, edição ou distribuição têm custos e, em alguns casos, muito altos, o que nem sempre pode ser arcado pelo jornalista independente, daí a associação aos meios usuais de financiamento e distribuição da notícia, próprios de uma sociedade capitalista, tal como ela se apresenta em cada momento histórico. E, quando escapam dos meios de controle, caem no uso indevido dos conteúdos, seja para doutrinação ou para a infâmia, que é a mentira em forma de notícia.

Com o crescimento da violência de grupos ou de Estados, dos preconceitos, dos confrontos políticos e identitários, e para agradar os públicos fragmentados e os interesses hegemônicos do capital, o jornalismo, na sua feição liberal, vem renunciando ao seu dever, aos seus princípios, e enfrenta os fatos falsificando a história, fazendo um terrorismo sobre tudo que chega a seu alcance, sem explicar porque precisa superar a concorrência.

É a primazia do jornalismo de “bastidor” (portanto incompleto), banal, meramente opinativo, na direção dos interesses dos financiadores e dos segmentos sociais que buscam conquistar. Exemplos de tudo é a atual cobertura da guerra que interessa, fazendo crer que o massacre operado por um Estado é lícito, desde que o outro seja o oprimido, o  bárbaro e perigoso, que precisa ser exterminado em  benefício da indústria do ódio e das armas!

(*) Walmir de Albuquerque Barbosa é jornalista profissional, graduado pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo e professor emérito da Ufam.
PUBLICIDADE
(*)Jornalista Profissional, graduado pela Universidade do Amazonas; Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo; Professor Emérito da Universidade Federal do Amazonas.

O que você achou deste conteúdo?

Compartilhe:

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie. Leia as perguntas mais frequentes para saber o que é impróprio ou ilegal.