‘Líder’ do gabinete paralelo, ex-assessor admite que aconselhou Bolsonaro sobre Covid-19

Alvo da CPI, Arthur Weintraub afirma que se ofereceu ao presidente para pesquisar medicamentos para combater a doença (Reprodução)

Com informações do O Globo

BRASÍLIA — Apontado como um dos líderes do chamado “gabinete paralelo” que aconselhava o presidente Jair Bolsonaro a respeito da Covid-19, o ex-assessor especial da Presidência Arthur Weintraub divulgou um vídeo neste sábado no qual confirma que se ofereceu ao presidente para levantar informações sobre medicamentos a serem usados no combate à doença, apesar de nenhum deles ter a eficácia comprovada, e admite que não chegou a fornecer informações ao presidente sobre as vacinas em desenvolvimento.

No vídeo divulgado nas redes sociais, Arthur aparece ao lado do seu irmão, o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub. Ambos se mudaram para os Estados Unidos após deixarem o governo. Arthur nega a existência de um “gabinete paralelo”, mas admite seu papel de aconselhamento junto ao presidente sobre a Covid-19. Por causa disso, ele entrou na mira da CPI da Covid e deverá ter que prestar depoimento aos senadores.

PUBLICIDADE

No início do seu relato, Arthur Weintraub revela que, após ter contato com as primeiras pesquisas sobre o uso da cloroquina, comprou o medicamento por conta própria em uma farmácia, apesar de sua eficácia contra a Covid-19 não ter nenhuma comprovação. Ele evita citar o nome do medicamento, ao qual se refere apenas como “o remédio da malária”.

— Existia o remédio da malária, que estava começando a ser aventado como uma possibilidade. Mas, dentre esse cenário de guerra, era uma possibilidade. O que eu fiz? Eu li os artigos que existiam, o que havia de coisa publicada, e fui falar com o presidente. Antes de mais nada, eu fui, passei na farmácia e comprei esses remédios da malária, sem receita, e eu tomei por dois dias. (…) E eu fui comentar com o presidente que havia coisas publicadas sobre o assunto e eu estava entrando em contato com médicos e pesquisadores dessa area. E o presidente disse assim: ‘Você que tem esse histórico passa a estudar e você vai me trazer o que você for encontrando e você vai vendo os contatos’ — relatou no vídeo.

Na gravação, Arthur alegou que tem “histórico acadêmico e cientista” e, por isso, possuía competência para assessorar Bolsonaro na área de pesquisa. Formado em direito, ele acrescentou que tem pós-graduação em Neurologia. Em suas publicações acadêmicas, no entanto, a sua área de atuação é focada em Previdência. O tema, inclusive, foi o que motivou a sua entrada no governo, em 2018, ainda no período de transição.

Abraham conta que assessorou Bolsonaro entre março e agosto do ano passado sobre a Covid-19. Ele diz que o “remédio da malária” era uma das únicas possibilidades e que não se discutia vacinas naquele momento. Entretanto, as primeiras propostas do Butantan e da Pfizer para venda de vacinas ao governo federal ocorreram em julho e agosto de 2020. Naquela ocasião, as pesquisas científicas já estavam em andamento em diversos institutos pelo mundo.

Ele, entretanto, nega a existência de um “gabinete paralelo” para abastecer o presidente.

— Eu não organizei gabinete (paralelo), eu fazia contatos científicos e trazia informações pro presidente. Dentro disso, eu fiz um evento, em agosto de 2020, no Palácio do Planalto, porque eu acabei tendo contato com em torno de 10 mil médicos de linha de frente — disse.

‘Cepa agressiva’

O ex-assessor conta que fazia resumos das informações que recebia e as repassava ao presidente da República, citando como exemplo um suposto uso da vitamina D. Arthur disse, ainda, que defendia a autonomia médica de receitar fármacos para os pacientes com Covid-19.

— Por ter uma formação de pesquisa, eu fazia para o presidente resumos, dos remédios, inclusive, de vitaminas, que eram importantes, vitamina D para o sistema respiratório, vão dizer para mim que é mentira? – questionou – Eu não estava defendendo um tratamento, era o que existia no momento como uma alternativa que havia ali alguma coisa publicada — justificou.

Arthur e Abraham também anunciaram que contraíram uma “cepa agressiva” da Covid-19 e que por isso não puderam se vacinar. Afirmam que, após curados, pretendem se vacinar no país e acreditam que provavelmente será com o imunizante da Pfizer.

— Nesse processo de escolher (a vacina), e aqui nos Estados Unidos a vacina da Pfizer é a que mais está sendo dada, nós estávamos escolhendo pela Pfizer, é muito simples de tomar. Quando houve a decisão de tomar a da Pfizer em maio, eu comecei com sintomas, não sabia o que era, estava só com febre, e dado o sintoma a gente achou melhor não tomar a vacina. Foi isso o que aconteceu. Não tomamos coquetel, nada disso — declarou Arthur.

‘Gabinete das sombras’

O virologista Paolo Zanotto, que apareceu em vídeo sugerindo a formação de um “shadow cabinet” (gabinete das sombras, em português) durante reunião com o presidente Jair Bolsonaro, diz que nem o colegiado nem esse encontro são evidências de um gabinete paralelo, e classificou como “loucura” a insinuação. A divulgação da gravação deve resultar na convocação dele para comparecer à CPI da Covid.

— Se isso é uma coisa que eu tenho que fazer, eu vou fazer. Veja, eu não vou mudar o meu discurso. Meu discurso é esse, você ouviu o que eu tinha para falar – declarou Zanotto ao GLOBO.

O virologista afirma que a questão política está se sobrepondo ao debate técnico sobre a pandemia. A avaliação feita pela cúpula da CPI da Covid é de que a sugestão de um “gabinete das sombras” comprova a existência de um aconselhamento alternativo sobre saúde no Palácio do Planalto. Zanotto discorda e afirma que o gabinete sugerido por ele seria um grupo anônimo para revisar e analisar as políticas adotadas pelo governo.

— Estão tentando fazer acreditar que aquilo era uma reunião secreta. É a primeira reunião secreta pública que eu ouvi falar na minha vida, para você ver o nível de loucura. Eles pegaram a questão do “shadow cabinet”, que é uma metáfora, que mostra como você vai espelhar. Porque se você tem pessoas do governo fazendo avaliação de vacina, essa avaliação está sendo “double checked”, checada novamente, por revisores anônimos que acabariam sendo os melhores vacinologistas do Brasil – justificou ao GLOBO.

PUBLICIDADE

O que você achou deste conteúdo?

Compartilhe:

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie. Leia as perguntas mais frequentes para saber o que é impróprio ou ilegal.