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Mesmo população parda superando a branca, especialistas veem democracia racial distante
Pessoas de variadas etnias transitam em rua de cidade brasileira (Reprodução/Agência RBS)
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26 de dezembro de 2023
Beatriz Araújo – Da Revista Cenarium Amazônia
MANAUS (AM) – Apesar do Censo 2022 ter apontado que a população parda supera a branca pela primeira vez, desde 1991, cientistas sociais consultados pela REVISTA CENARIUM AMAZÔNIA apontam que a democracia racial comemorada em vários discursos políticos ainda está longe de ser uma realidade no Brasil.
Em paralelo, segundo os especialistas, o crescente número de autodeclarações de pessoas pardas aponta para um possível fenômeno de aceitação social e cultural da população que pode estar em ascensão no País. O fenômeno é reflexo dos dados levantados pelo “Censo Demográfico 2022: Identificação étnico-racial da população, por sexo e idade: Resultados do universo”, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), onde cerca de 92,1 milhões de brasileiros se declararam pardos, o equivalente a 45,3% da população do País, no ano de 2022.
Para o sociólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas, (Ufam), Marcelo Seráfico, o aumento na autodeclaração de brasileiros como pardos, negros e indígenas pode ser resultado de uma maior conscientização étnica da população brasileira a respeito dos processos históricos que culminaram na dominação da cultura europeia sobre a africana e indígena. Esse domínio é entendido na sociologia como hegemonia e explica o sentido de minoria, na prática.
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“Nesse cenário, há duas hipóteses, o primeiro é o aumento da consciência acerca de nossas origens étnicas, ou seja, reafirmando o Brasil, que nasce, em grande medida, de uma miscigenação, que envolve muita violência de dominação e gera uma nova realidade étnica com novos valores e práticas, com povos diferentes, e em segundo lugar, há uma estratégia, onde os grupos, entendendo o papel do reconhecimento do quadro das políticas públicas, passam a definir cenários a essa parcela da população”, declarou.
O sociólogo também apontou que o conceito de democracia racial é interpretado “ao pé da letra” por conservadores que entendem que, apenas pelo fato de pessoas negras, pardas e brancas conviverem em um Estado Democrático, já se pode dizer que elas integram estruturas de poder como, por exemplo, cargos eletivos.
“A ideia de democracia racial é uma grande ilusão formada desde a década de 1930. Esse conceito foi marcado por uma série de polêmicas, devido às teorias do branqueamento, que foi contestada pela teoria da miscigenação e de seus efeitos, mas essa tese era extremamente conservadora. Outros estudos mostram que a miscigenação não resolve a desigualdade social; reconhecer a participação de negros, indígenas e brancos, na cultura nacional, não é o mesmo que reconhecer essa construção múltipla que resulta em uma democracia; na verdade, havia a manutenção de exploração de indígenas, negros e pardos dentro de um regime cruel que possui efeitos até hoje”, completou Seráfico.
Na avaliação do historiador e mestre Juarez Clementino, o aumento no índice de autodeclarações de pessoas pardas está diretamente ligado ao acesso a pautas raciais que cresceram na sociedade brasileira nos últimos anos.
“O atual crescimento da categoria parda em quase 12%, na última década, tem muito a ver com a conscientização negra, ou seja, de que ‘claro’ não significa ‘branco’, que em termos biológicos e sociais não há ‘coluna do meio’ e, por fim, pela possibilidade de ser incluído(a) em ações afirmativas educacionais e de ocupação”, analisou.
IBGE
Segundo o Censo 2022 do IBGE, desde 1991, o contingente de pessoas pardas não superava a população branca, que chegou a 88,2 milhões (ou 43,5% da população do País). Outras 20,6 milhões se declaram pretas (10,2%), enquanto 1,7 milhões se declararam indígenas (0,8%) e 850,1 mil se declaram amarelas (0,4%).
A autodeclaração de pessoas negras também teve um aumento, comparado ao Censo realizado em 2010. Desde então, a população preta aumentou 42,3% e sua proporção no total da população subiu de 7,6% para 10,2%. Já a população parda cresceu 11,9% e sua proporção na população do País subiu de 43,1% para 45,3%. Houve, ainda, aumento de 89% da população indígena, com sua participação subindo de 0,5% para 0,8%.
A autodeclaração étnico-racial é um processo em que um indivíduo se identifica como pertencente à determinada raça ou etnia. Além de ser uma forma de reflexão e afirmação da própria identidade racial e, muitas vezes, usada para promover políticas de ação afirmativa, políticas públicas, pesquisas demográficas, entre outros, no Brasil, a autodeclaração racial também é utilizada em diversos contextos, como em universidades que adotam políticas de cotas raciais, dentre outros.
Política
Mesmo com a conscientização racial crescendo entre os brasileiros, os cargos eletivos e a representação política continua sendo dominada por homens que se declaram brancos. O levantamento foi feito pelo Grupo de Trabalho de Afinidade de Raça e do Comitê Permanente pela Promoção da Igualdade de Gênero e Raça do Senado Federal.
O Grupo de Trabalho (GT) também apontou que nos Três Poderes da República, homens brancos predominam em cargos de comando. Além disso, na composição étnico-racial dos deputados federais eleitos para a 56ª legislatura, 125 autodeclaram-se negros (104 pardos e 21 pretos), o que corresponde a 24,3% do total. Os brancos chegam a 75%.
Em 2020, o TSE aprovou que a distribuição dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão deve ser proporcional ao total de candidatos negros que o partido apresentar para a disputa eleitoral. Já nas candidaturas das eleições de 2022, o número de candidatos negros, 14.712, superou o de brancos, o que representa 50,27% do total de inscrições (29.262).
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