Mortes ligadas a selfies sobem com a melhora da pandemia

Glen Canyon, Estados Unidos Foto: Reprodução

Com informações do Infoglobo

RIO — Tirar uma foto de si mesmo, ou apenas “fazer uma selfie”, nem sempre é inofensivo como parece. Para além dos perigos da exposição nas redes sociais, existe uma moda que cresce a cada ano: os registros em locais perigosos ou em situações arriscadas. E a preocupação de especialistas com a tendência não é à toa. Segundo um estudo publicado na última semana na revista científica Journal of Travel Medicine, pelo menos 379 pessoas morreram entre janeiro de 2008 e julho de 2021 enquanto faziam uma selfie considerada perigosa.

O número, que havia diminuído com a chegada da pandemia de Covid-19, voltou a subir de forma rápida com a melhora da situação epidemiológica em diversos países, chegando a 31 mortes apenas nos primeiros sete meses de 2021, o equivalente a, em média, um óbito por semana.

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O estudo que levantou esses números foi conduzido por pesquisadores da Fundação iO, uma organização científica de Madrid, na Espanha, especializada em medicina tropical e do viajante. Os pesquisadores observaram também quais foram os locais de maior incidência dos acidentes relacionados a selfies. O País que mais registrou mortes desse tipo foi a Índia, com 100 casos, seguida pelos Estados Unidos, com 39, e em terceiro lugar a Rússia, com 33. O Brasil ocupa o quinto lugar da lista, que conta com mais de 50 países, com 17 casos identificados durante o período analisado.

Outro dado levantado pelos pesquisadores foram os 10 lugares no mundo em que mais ocorreram mortes por selfies de risco. Foram eles as cataratas do Niágara, na divisa entre os EUA e Canadá; a catarata de Mlango, no Quênia; o Taj Mahal e o vale de Doodhpathri, na Índia; o arquipélago de Langkawi, na Malásia; os montes Urais, na Rússia; o Charco del Burro, na Colômbia; a ilha Nusa Lembongan, na Indonésia; o Glen Canyon, nos EUA e, por fim, a praia da cidade de Penha, em Santa Catarina, no Brasil.

O local, no sul do País, registrou inclusive um dos 31 óbitos no mundo em 2021, no dia 17 de janeiro, quando a professora Soliane Luiza, de 28 anos, caiu do costão da Ponta do Vigia enquanto fazia uma selfie. Após despencar da pedra, a vítima foi arrastada por uma onda e chegou a ser resgatada pelos bombeiros, mas teve uma parada cardiorrespiratória e morreu antes de chegar ao hospital.

o selfies foram decorrentes de quedas de lugares como cataratas, precipícios e telhados, que contabilizaram 216 dos 379 casos. Em seguida, as situações que envolveram meios de transporte deixaram 123 mortos; 66 pessoas morreram em afogamentos; 24 mortes foram por arma de fogo; 24 por descargas elétricas e 17 por animais selvagens. 

Cerca de 41% das vítimas eram adolescentes de até 19 anos e 37% eram jovens com idade entre 20 e 19 anos. Além disso, 60% dos casos foram de homens.

Redes sociais e os sensation seekers

Uma revisão de pesquisadores australianos sobre o fenômeno publicada em dezembro de 2020 na revista científica Tourism Management Perspectives analisou diversos estudos relacionados ao tema e apontou que o compartilhamento das selfies em redes sociais e a criação de identidade na internet são algumas causas levantados pelos especialistas como responsáveis pelo aumento desse tipo de acidente.

A pós-doutora em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e CEO da Bee Touch, startup de saúde mental, Ana Carolina Peuker, explica que há principalmente dois fatores que podem explicar o perfil da pessoa que busca essas situações de risco na hora de tirar uma selfie.

“O primeiro é um fenômeno descrito na literatura como “ausente presente”, em que as pessoas às vezes estão tão conectadas com a realidade virtual que acabam minimizando aspectos do seu ambiente imediato, como os riscos envolvidos em uma situação”, diz a especialista.

Ela explica que as redes sociais criam uma realidade mediada por filtros, por imagens e pela forma como as pessoas se apresentam nas redes sociais, o que provoca uma necessidade cada vez maior de métodos para atrair a atenção.

Segundo a especialista, já existem teóricos que enquadram as mídias digitais e os celulares como a heroína do século XXI, uma vez que os mecanismos responsáveis pelo vício de drogas são ativados também pelos estímulos propiciados pela internet. Essa ativação é ligada ao chamado sistema de recompensa cerebral, que é o circuito na mente humana que processa a informação relacionada à sensação de prazer ou de satisfação.

O segundo fator levantado pela psicóloga seria uma predisposição de algumas pessoas para comportamentos mais impulsivos, um traço da personalidade dos chamados sensation seekers (buscadores de emoção). Ana Carolina explica que essa classificação foi criada para pessoas que têm naturalmente uma busca intensa por situações de adrenalina e por estimulações externas, e que normalmente têm menor tolerância com a monotonia e a frustração.

“Estamos falando também de uma característica de personalidade, é uma interação desse traço com o ambiente criado pelas redes sociais. Hoje a gente tem uma cultura que reforça esse comportamento. Então as curtidas, o monitoramento coletivo nas redes, elas amplificam quem já é mais propenso a buscar situações de risco”.

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