MPF elabora propostas para combater racismo institucional na atividade policial

Grupos fazem protesto contra o racismo e o fascismo dentro das corporações policiais, em Salvador, Bahia (Clériston Santana/TV Bahia)
Da Revista Cenarium Amazônia*

BRASÍLIA (DF) – Com o intuito de atuar no enfrentamento do racismo institucional nas polícias, o Ministério Público Federal (MPF), por meio do Grupo Interinstitucional Contra o Racismo na Atividade Policial, ligado à Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional (7CCR), elaborou documento contendo 43 propostas de ação. O documento foi enviado pelo coordenador em exercício da 7CCR, subprocurador-geral da República José Adonis Callou de Araújo Sá, ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, à ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e ao ministro dos Direitos Humanos, Sílvio Almeida. A expectativa do MPF é de que os resultados apresentados no relatório apontem para a construção de um arcabouço normativo que forje nas instituições federais os compromissos com a transparência de dados, com a eliminação de desigualdades internas e de práticas discriminatórias no exercício de suas funções.

Previamente à construção das 43 propostas de ação foi feito diagnóstico a partir do levantamento e de análise de diversos dados, como o perfil étnico-racial e de gênero de integrantes das carreiras policiais da União, sobre as academias federais de polícia, o perfil étnico-racial, de gênero e etário de pessoas autuadas ou indiciadas e dados sobre a letalidade decorrente da atuação das polícias federais. A evidência mais relevante na análise das informações, segundo o GTI, é a conclusão de que não há tratamento adequado de informações sobre a atuação policial.

“Não existe forte cultura organizacional de transparência de dados em nenhuma das instituições, contudo, se trata de instrumentos de prestação de contas à sociedade e aos demais órgãos estatais que se relacionam com o planejamento, monitoramento e controle das polícias. Os poucos dados existentes, muitas vezes, não permitem análises cruzadas. Essas lacunas deixam evidente que as polícias federais são pouco engajadas em reflexividade, isto é, pensar o planejamento de ações a partir de diagnóstico dos resultados de ações passadas”, afirma o grupo no documento.

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Imagem de policiais e os dizeres: racismo institucional (Divulgação/Ascom/MPF)

Diante desse cenário e das dificuldades encontradas pelos membros do GTI para realizar a coleta de dados necessários para identificar as práticas de racismo institucional, foram elaboradas as 43 propostas voltadas à eliminação de condutas discriminatórias. Dividido em três eixos principais – perfil racial e étnico dos sistemas prisionais e da segurança pública; formação policial e protocolo de atuação antirracista – o compilado surgiu a partir de esforço conjunto e de uma série de debates. “Material relevante do estado da discussão interna sobre a superação do racismo institucional foi obtido, indicando a necessidade da cobrança social de transparência e monitoramento de desigualdade nas instituições policiais federais”, destaca o relatório.

Ações

As propostas apresentadas pelo GTI da 7CCR envolvem a criação de normativos, recomendações, notas técnicas, campanhas e planos educativos. Entre elas, destacam-se a orientação às polícias pela proibição de perfilamento racial nas abordagens policiais; a identificação dos indivíduos envolvidos em casos de mortes decorrentes por intervenção da atividade policial e recorrente uso da força; a criação de um banco de boas práticas a ser divulgado de forma ampla aos membros do MPF. Além disso, também foram propostas diretrizes voltadas para a equidade étnico-racial na composição das carreiras de servidores, nos cargos de chefias e na relação com o público no desempenho de suas ações; o equilíbrio da carga horária e a quantidade de cursos voltados para direitos humanos e educação humanística com os cursos dedicados à transmissão de técnicas de uso da força e outras definidas como “operacionais”.

Outras estratégias também envolvem a realização de atividades de forma a colocar os policiais em escuta direta e constante de populações vulnerabilizadas; implementação, em caráter de urgência, de sistema de gestão acadêmica que possibilite transparência em relação aos dados; recomendação para que os editais e regulamentos dos concursos públicos e as normativas internas das instituições policiais não incorram em qualquer tipo de discriminação, como características corporais e capilares dos policiais; garantia às pessoas privadas de liberdade praticantes de religiões de matriz africana à liberdade de culto e o acesso à assistência religiosa; e adoção de protocolo que determine o uso ininterrupto das câmeras corporais pelos agentes durante o exercício da atividade exigida.

Sobre o GTI

Lançado em 2020, o Grupo de Trabalho Interinstitucional contra o Racismo na Atividade Policial reúne integrantes do Ministério Público Federal (MPF), das Polícias Federal (PF) e Rodoviária Federal (PRF), da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) e da Defensoria Pública da União (DPU). Também participam representantes do Instituto Cidade Segura, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), da Luta pela Paz, da Rede Nacional de Mães e Familiares Vítimas do Terrorismo de Estado e da Educafro, além de pesquisadoras universitárias especialistas em segurança pública e direitos humanos.

Em agosto deste ano, o GTI promoveu o seminário Racismo na Atividade Policial: Perspectivas e Desafios, no Rio de Janeiro, com a participação de especialistas em segurança pública e direitos humanos de instituições estatais e da sociedade civil. Nesse evento, foram construídas as propostas para o enfrentamento do racismo na atividade policial. O evento também marcou o lançamento do livro digital Racismo na Atividade Policial, coletânea de artigos para disseminar e ampliar o debate, no MPF e fora dele, sobre o racismo e seus efeitos para a segurança pública. O livro está disponível no site do MPF.

Leia mais: Secretária do MEC afirma que escola é a 1ª experiência de crianças negras com racismo institucional
(*) Com informações do MPF
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