MPF no Pará sugere imediata realocação de não indígenas retirados de TI Alto Rio Guamá

Família retiradas de Terras Indígenas no Pará (Reprodução/MPF)
Raisa de Araújo – Da Revista Cenarium Amazônia*

BELÉM (PA) – O Ministério Público Federal (MPF) recomenda que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) conclua o processo de realocação de não indígenas retirados da Terra Indígena Alto Rio Guamá (TIARG), no Pará.

Na primeira fase da operação de desintrusão, de abril a maio deste ano, o Incra já havia cadastrado 350 famílias desta região, das quais as famílias aptas foram encaminhadas a programas sociais do governo federal e orientadas a saírem de forma voluntária das terras. Em junho, a autarquia já havia registrado 700 famílias.

Após quase quatro meses da retirada dos ocupantes, não há informações de que o instituto tenha realizado ações administrativas concretas para a realocação das famílias com perfil de beneficiárias do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) em terras federais sob sua gestão na região.

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No documento assinado no dia 17 pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão, Sadi Flores Machado, e pelos procuradores da República Felipe de Moura Palha e Silva e Nathalia Mariel Ferreira de Souza Pereira, as famílias encontram-se em estado de vulnerabilidade, o que requer urgência na adoção de providências.

O MPF pede ainda que o Incra conclua o processo e o envio da lista das famílias não indígenas que deixaram a Terra Indígena Alto Rio Guamá e poderão ser assentadas por possuírem o perfil de beneficiárias do Programa Nacional de Reforma Agrária.

“É de extrema importância que o Incra intervenha de maneira imediata para assegurar o assentamento dessas famílias de ocupantes não indígenas que deixaram a Terra Indígena Alto Rio Guamá devido a uma decisão judicial, visto que essas famílias continuam a sofrer prejuízos constantes, tanto de natureza moral quanto material, devido à negligência por parte dessa autarquia”, afirmam os procuradores na recomendação.

Em reunião realizada pelo MPF em 19 de setembro, a superintendente substituta do Incra no Pará informou que, devido à urgência da situação dos ocupantes retirados da Terra Indígena Alto Rio Guamá por conta da desintrusão, a administração regional do instituto assumiu a responsabilidade pelo cadastramento das famílias, enquanto a seleção ficou a cargo da sede do Incra em Brasília. Porém, destacou que não há informações disponíveis sobre a conclusão desse processo nem sobre lotes disponíveis para o assentamento das famílias, devido à suspensão das atividades de supervisão ocupacional.

Segundo o MPF, o instituto deve, ainda, adotar as medidas administrativas e judiciais cabíveis para retomar eventuais áreas irregularmente ocupadas por terceiros que não constam na relação de beneficiários do PNRA; destinar os lotes vagos às famílias que aguardam na fila para serem beneficiadas no PNRA, em especial e com prioridade, às famílias de boa-fé selecionadas que desocuparam a Terra Indígena Alto Rio Guamá devido à desintrusão; e estabelecer cronograma para alocação dessas famílias na área onde serão assentadas.

A recomendação prevê prazo de dez dias após o recebimento do documento para que o Incra se manifeste.

Assentamento

A responsabilidade do Incra tem previsão constitucional e está expressamente prevista no Plano Integrado de Desintrusão da Terra Indígena Alto Rio Guamá, apresentado em abril pela União, a partir do qual foi iniciado o procedimento de retirada dos ocupantes não indígenas. Elaborado em conjunto com entidades e órgãos federais para cumprimento da sentença judicial publicada em 2014, o plano determina que o Incra deve fornecer informações aos órgãos e agências envolvidos na operação, relativas aos assentamentos no interior e entorno do território indígena; realizar o cadastramento e a seleção das famílias não indígenas que poderão ser assentadas; identificar áreas onde as famílias poderão ser assentadas; disponibilizar apoio logístico para as famílias que serão assentadas; prever a liberação de crédito instalação para as famílias que serão assentadas; disponibilizar cestas básicas e também os meios necessários para sua atuação.

Desintrução

O plano de desintrusão e outras ações dentro da terra indígena são conduzidas a partir de estudos que apontam, entre outros dados, assentamentos de reforma agrária existentes no entorno; glebas públicas federais; processos minerários; parcelas de regularização fundiária; imóveis privados certificados e Cadastro Ambiental Rural (CAR).

Também foram indicados pontos de aldeias indígenas; malha rodoviária; hidrografia; ramais de acesso; presença de escolas públicas; seções eleitorais; ponto do Censo Agropecuário de 2017; embargos ambientais e uso do solo.

Espera

A Terra Indígena Alto Rio Guamá é habitada por cerca de 2,5 mil indígenas das etnias Tembé, Timbira e Kaapor, distribuídos em 42 aldeias. A área fica localizada nos municípios de Santa Luzia do Pará, Nova Esperança do Piriá e Paragominas.

A TIARG foi reconhecida em 1945 e homologada em 1993. Na época da homologação, havia não indígenas no território e o processo de retirada foi realizado no fim dos anos 1990 até começo dos anos 2000, com pagamento de indenização por construções feitas na terra e assentamento em projetos de reforma agrária.

Mesmo assim, famílias não indígenas permaneceram na área, o que levou o Ministério Público Federal do Pará a ajuizar ação de reintegração de posse. Uma decisão judicial liminar de 2003, confirmada por sentença de 2014, determinou que a União providenciasse a retirada dos invasores da área para que os indígenas tivessem plena posse de suas terras e pudessem viver de acordo com os seus costumes e tradições, como lhes garante a Constituição Federal.

Em 2018, a Justiça Federal determinou que a União apresentasse um plano de retirada dos invasores, sob pena de multa de 2 mil por dia de atraso na apresentação do plano, até um total de R$ 400 mil em multas.

(*) Com informações do MPF no Pará
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Editado por Jefferson Ramos
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