MPF pede que Eletronorte forneça água potável a indígenas Assurini, no Pará

Dois indígenas no pôr do sol (Luís Nova/Reprodução)
Da Revista Cenarium Amazônia*

BELÉM (PA) – Acatando pedido do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça determinou que a empresa Eletronorte forneça, imediatamente, e em caráter emergencial, água potável aos indígenas Assurini, da Terra Indígena Trocará e de mais três comunidades, no Pará, em razão dos danos materiais e coletivos causados pela construção da usina hidrelétrica de Tucuruí. De acordo com a decisão, emitida durante audiência judicial realizada no último dia 4, a empresa deve fornecer, por meio de caminhões-pipa, 40 mil litros de água por dia às comunidades Trocará, Marawitawa, Ororitawa e Oimotawara, com início em 16 de outubro. O objetivo é garantir o direito à vida digna para cerca de 800 indígenas, sendo aproximadamente 100 crianças.

A decisão é decorrente de ação civil pública ajuizada pelo MPF, em 2010, na Justiça Federal, com pedido de implementação de um programa de medidas mitigadoras e compensatórias pela Eletronorte, que incluíam obras para abastecimento de água nas aldeias. Durante audiência conciliatória, realizada em agosto de 2011, a empresa celebrou acordo com o MPF e demais partes envolvidas e se comprometeu a apresentar o cronograma das atividades a serem implementadas. Entre os compromissos assumidos, estava o atendimento às demandas emergenciais da Comunidade Assurini, que deveria ser prestado, em caráter contínuo, até o efetivo início das medidas previstas no programa.

Entretanto, diante do cumprimento parcial do acordo, referente às medidas emergenciais, tendo sido efetivada apenas a entrega da Unidade Básica de Saúde Indígena e a aquisição de um ônibus, a Justiça realizou nova audiência, em abril de 2016. Nesta oportunidade, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o MPF fizeram várias críticas e questionamentos acerca do novo cronograma apresentado pela empresa para conclusão do programa de medidas.

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Em reunião realizada em 2018, na Procuradoria da República de Tucuruí, lideranças indígenas também manifestaram descontentamento com a demora do processo e pela não realização das medidas emergenciais por parte da Eletronorte. No mesmo ano, o órgão promoveu acordo judicial com a empresa, mas um ano depois, a operadora da usina não havia concluído todas as etapas previstas no Plano de Trabalho Anual acordado.

Indígenas Assurini do Estado do Pará (Reprodução/Folha do Progresso)

O MPF não aceitou as justificativas apresentadas e se manifestou judicialmente pelo descumprimento do acordo. Para o órgão, apesar do cumprimento de alguns itens do cronograma, ainda que houvesse atraso na contratação de algumas obras, “havia outras atividades previstas no plano, ou mesmo em outras linhas temáticas do acordo, que poderiam ter sido objeto de execução”.

Ficou constatado, em parecer técnico elaborado pelo MPF, em 2022, que mais de 10 anos depois do início da ação civil pública, as ações de compensação socioambiental referentes ao Termo de Acordo Judicial entre a Eletronorte, o MPF e a comunidade indígena Assurini, ainda não alcançaram o objetivo principal: o fornecimento de água potável suficiente, obtido por meio das construções de poços e trincheiras, para abastecer as aldeias.

A perícia realizada pelo MPF demonstrou falta de efetividade e inoperância dos sistemas disponibilizados pela Eletronorte. O relatório apresenta diagnóstico dos poços das aldeias Trocará, Oimotawara, Ororytawa e Mararytawa, com as soluções necessárias para o sistema de abastecimento de cada aldeia.

Decisão judicial

Diante da ausência de justificativas para os atrasos, o órgão recorreu, novamente, e foi realizada, no dia 4 de outubro deste ano, a audiência judicial mais recente. No entanto, mesmo após devidamente intimada, a Eletronorte não compareceu. Representando o MPF, o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Sadi Flores Machado, formulou vários pedidos em favor das comunidades, entre eles, que a empresa fosse obrigada a fornecer água potável aos indígenas Assurini, em caráter emergencial, por meio de caminhões-pipa.

Em razão dos prejuízos causados ao processo pela ausência da empresa, o procurador reiterou a necessidade de aplicação de multa, calculada em 2% do valor de R$ 10 milhões atribuídos à causa. Os pedidos foram aceitos pelo juiz, que determinou o pagamento de R$ 200 mil pela Eletronorte por ato atentatório à Justiça.

O juiz da Vara Cível e Criminal de Tucuruí (PA), Rodrigo Mendes Cerqueira, determinou, ainda, multa diária de R$ 100 mil para cada dia em que a água não for fornecida às comunidades. A Eletronorte deverá realizar, também, a limpeza e sanitização das cisternas, poços e reservatórios nas aldeias, assim como custear e fornecer, ao menos, 5 exames de potabilidade da água na forma e laboratórios indicados pela Secretaria de Saúde Indígena. Além disso, foi deferido o pedido do MPF para nomeação de engenheiro sanitarista para realizar perícia na Terra Indígena Trocará, e nova audiência foi remarcada para o dia 20 de novembro.

O MPF segue realizando trabalho pericial no local para detectar eventuais danos ambientais causados por possíveis obras mal executadas nas aldeias.

Eletronorte

A Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A, conhecida como Eletronorte, é uma empresa do setor elétrico brasileiro, subsidiária da Eletrobras, que atua no segmento de geração e transmissão de energia elétrica na região amazônica. A empresa é responsável pela operação da usina hidrelétrica de Tucuruí, uma das maiores do mundo, cujas obras foram iniciadas no período da ditadura militar, em 1974, e causaram alagamento de milhares de quilômetros de florestas. A matéria orgânica submersa pelas águas, além de causar sérios riscos à saúde, pode tornar a água inservível ao consumo humano e provocar mortandade da fauna aquática.

Leia também: Indígenas pedem que governo federal declare emergência climática em meio à seca na Amazônia
(*) Com informações do MPF
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