No Amazonas, ato antidemocrático em frente ao CMA enfraquece, mas ameaças em grupos continuam
03 de dezembro de 2022
A quantidade de manifestantes acampados em frente ao Comando Militar da Amazônia (CMA) reduziu desde o início do protesto, no dia 2 de novembro (Revista Cenarium - 03.11.2022)
Da Revista Cenarium
MANAUS – O protesto antidemocrático em frente ao Comando Militar da Amazônia (CMA), na zona Oeste da capital do Amazonas, completou um mês no último dia 2 de dezembro com movimento mais enfraquecido, mas ainda baseado no discurso de ódio.
A REVISTA CENARIUM esteve no local neste sábado, 3, e constatou que a mobilização concentra menos pessoas do que anteriormente. Em aplicativos de mensagens, o incentivo ao uso da violência para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é frequente.
O ato antidemocrático em frente ao Comando Militar da Amazônia (CMA), em Manaus, em dois momentos diferentes. (Revista Cenarium)
Os atos são considerados antidemocráticos porque pedem intervenção federal para impedir um governo legitimamente constituído, conforme a Lei Nº 14.197, conhecida como Lei do Estado Democrático de Direito. Manifestantes pedem que as Forças Armadas ajam para interromper a posse de Lula.
O Artigo 359-L do dispositivo indica que é crime “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais“, e o Artigo 359-M afirma que é passível de penalização “tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído“.
Movimento MUITO pequeno em frente ao CMA, em Manaus. Tem mais barraca que gente. Os patriotas abandonaram a causa Bolsonarista pra ver a Copa do Mundo em casa, pela Globolixo. pic.twitter.com/TQUKfxEJaE
Em grupos de aplicativo de mensagens ainda circulam mensagens afirmando que, em algum momento, o “sistema vai cair” por ações das Forças Armadas. No grupo “Patriotas Amazonas“, um membro afirma que vai “rolar sangue” e que o objetivo é impedir que os eleitos tomem posse. “Vai rolar sangue, inevitável porque vai ter reação de guerrilheiros, terroristas e assassinos e esses devem ser abatidos“, diz em uma mensagem.
Em grupos de aplicativo de mensagens, o discurso de ódio e violência continua sendo compartilhado com frequência. (Reprodução/ Internet/03.02.2022)
O advogado Melillo Diniz lembra que o princípio da livre manifestação é garantido pela Constituição, mas esse direito não pode servir para liquidar o direito das demais pessoas e a destruição do estado democrático de direito.
“A Constituição brasileira não tolera que para garantir um direito, o da livre manifestação, se destrua o estado democrático de direito, que é o que está sendo pedido, como intervenção militar, intervenção federal. De todo modo, até o emprego de violência é punido pelo Código Penal e tem que ser combatido com dureza. O pessoal pede lei e ordem com base em medidas antilegais e desordeiras“, critica ele.
Placa em frente ao Comando Militar da Amazônia (CMA), em Manaus, pede a ação das Forças Armadas. (Revista Cenarium – 03.12.2022)
Reação dos órgãos
Conforme mostrou a REVISTA CENARIUM anteriormente, a manifestação no CMA já foi alvo de inspeção por causa da identificação de ilegalidades como a presença de menores de idade, poluição sonora e infrações de trânsito. A juíza federal Jaiza Fraxe determinou, em 15 de novembro, que a União, o Estado e o município coibissem as práticas na manifestação sob pena de multa diária, para cada um, de R$ 10 mil.
À reportagem, a magistrada informou, neste sábado, que as inspeções no local são diárias e que a presença das crianças no ato antidemocrático é fiscalizada, agora, pela Vara da Infância e Juventude. Segundo ela, novas decisões serão tomadas em breve.
Para o advogado Melillo Diniz há prudência e até cumplicidade dos órgãos fiscalizadores e repressores ao coibir as manifestações. Mesmo com o direito de livre manifestação garantido, tem que se ter o que ele chama de qualidade na gestão dos conflitos para evitar a intensificação dos atos.
“Em grande parte há uma prudência, não tenho dúvida disso, há uma cumplicidade, o que demonstra o grau de hesitação institucional em que nós estamos inseridos e autoridades vão ter que tomar alguma medida. Impressiona, por exemplo, a leniência do Ministério Público com isso, a dificuldade dos Executivos de adotarem providencias e a falta de qualidade na gestão de conflitos em alguns espaços em que realmente a situação fica cada vez mais difícil“, afirma ele.
Delírio coletivo
A advogada Carolina Castello Branco chama os atos antidemocráticos de “delírio coletivo” e afirma que os excessos devem ser punidos. A jurista lembra que mesmo nos Estados Unidos, quando houve a invasão do Capitólio, em 6 de janeiro do ano passado, por partidários do ex-presidente americano Donald Trump que não aceitavam a vitória de Joe Biden, o Congresso considerou os atos uma ofensa à democracia, que resistiu porque as instituições funcionaram.
“No nosso caso, me parece mais um delírio coletivo, uma retroalimentação desse tipo de pensamento do que, propriamente, uma capacidade de fazer algo realmente“, diz ela. “O que eles [os manifestantes] fazem em termos de manifestação é amparado pela Constituição e os excessos podem e devem ser punidos, porque junto com a liberdade de expressão vem a responsabilidade. Discursos de ódio e antidemocráticos não são tolerados pelo nosso sistema constitucional“, pontua ela.
Castello Branco também destaca que há dispositivos, na Constituição, que tratam sobre intervenção federal, mas se referem especificamente a situações de crise como estado de sítio e o estado de defesa. “Em uma interpretação sistemática, as Forças Armadas servem para a defesa nacional, garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem“, explica.
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