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Ocupação de terras, Transamazônica e ZFM são heranças deixadas pela ditadura
A construção da Transamazônica. (Reprodução/ Internet)
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31 de março de 2023
Marcela Leiros – Da Revista Cenarium
MANAUS – A Amazônia é uma região que vive, até hoje, com “heranças” deixadas pela ditadura militar, regime político de 21 anos quando os governos militares estiveram à frente do Brasil. Do período conhecido como “Anos de Chumbo” e marcado pela forte repressão e violência militar, obras como a rodovia Transamazônica e a instituição da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), além da ocupação desenfreada de terras na região, são memórias tangíveis nestes 59 anos desde o dia da instituição do regime.
A ditadura militar foi instituída com um golpe de Estado em 31 de março de 1964, perdurando até 1985, com mecanismos legais que se sobrepunham à Constituição. O golpe pôs fim ao governo de João Goulart, o “Jango”, quando tanques do Exército foram enviados ao Rio de Janeiro, onde estava o presidente. Três dias depois, ele partiu para o exílio no Uruguai e uma junta militar assumiu o poder do Brasil.
Sob o lema de “integrar para não entregar” e valendo-se do mito de que a região amazônica era um “vazio demográfico“, o regime militar lançou o Programa de Integração Nacional (PIN), em 1970, que previa a construção de rodovias e projetos de colonização. Anúncios veiculados em jornais, à época, prometiam incentivos fiscais e financiamento para quem ocupasse a Amazônia.
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“Toque sua boiada para o maior pasto do mundo“, dizia uma propaganda. “Na Amazônia, a terra é barata e sua fazenda pode ter todo o pasto que os bois precisam“.
“Além de criar gado, eles vão explorar centenas de jazidas de minérios que já foram descobertas“, dizia outro. “Dependendo da região que você escolher, os governos estaduais e municipais dão até a terra de graça“.
Transamazônica
A ocupação da Amazônia e destruição da floresta ganhou força, também, com a construção da Transamazônica, entre os anos de 1969 e 1974, conhecida como BR-230. A rodovia tem mais de 4 mil quilômetros e extensão, com início em Cabedelo, na Paraíba, até Lábrea, no Amazonas. Foi a partir dela que assentamentos como o de Santo Antônio do Matupi, em Manicoré, distante 332,08 quilômetros de Manaus, no Amazonas, surgiram.
O historiador Cleomar Lima destaca que os militares tinham um “plano mirabolante” para integrar a Amazônia ao Brasil, pois consideravam a região esquecida.
“O que gente vê do ponto de vista da herança da ditadura militar foi a questão do meio ambiente“, explica o historiador. “Achavam que aqui era uma região de abandono, de miséria, de que nunca teve desenvolvimento nenhum. Negaram o meio ambiente, negaram os povos indígenas, começaram a fazer obras de integração, principalmente as estrada e as rodovias. Eles queriam fazer aqui um agronegócio“.
Dizimação levou ao “vazio”
Cleomar Lima explica ainda que o suposto vazio demográfico da região amazônica se deu, principalmente, pela dizimação de povos tradicionais impetrada pelos colonizadores. “O conquistador chegou e não viu mais nada, e achou que não tinha mais nada aqui. Então, os militares tinham essa impressão, de que a Amazônia era um abandono, não tinha nada, não se desenvolveu nada“, contou.
O professor do Departamento de História da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) César Augusto Queirós afirma que se percebe, na ditadura militar, nenhuma preocupação ambiental com a Amazônia.
“A intenção era fazer uma ocupação predominantemente predatória, a partir de uma ocupação orientada pelo Estado em dois aspectos: a organização de obras públicas e a vinda de migrantes de outras regiões para o vale amazônico. Nesse sentido, esses projetos desenvolvimentistas que se estabeleceram na região vão ter um impacto muito negativo tanto sobre a floresta quanto sobre os povos que aqui viviam”, explica.
Desenvolvimento industrial
A política de incentivos para o desenvolvimento econômico da Amazônia também se voltou para o setor industrial. O governo militar criou a Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), com a Lei 5.173, de 27 de outubro de 1966, para estimular a fixação da população nas regiões de fronteira e selecionar e apoiar polos propícios ao desenvolvimento econômico.
Foi no contexto desse programa que a Zona Franca de Manaus (ZFM) foi reformulada. Apesar de ter sido criada em 1957, quase dez anos depois, o presidente Castello Branco, primeiro presidente brasileiro durante o período da ditadura militar, assinou o Decreto Lei nº 288, que alterou as disposições da legislação de 1957 e reformulou a ZFM para um centro industrial, comercial e agropecuário.
“Podemos apontar, inegavelmente, um dos pontos de herança, a ideia de que deveria se desenvolver a região a partir de um polo de incentivos fiscais, de empresas que se montassem aqui, que é a Zona Franca de Manaus. Apesar de todas as mudanças, ela sobrevive e passar, hoje, pelo crivo na questão da reforma tributária que vai ser lançada agora pelo governo“, destaca.
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