STF derruba licenciamento ambiental automático de Bolsonaro por unanimidade

Yusseff Abrahim – Da Revista Cenarium

BRASÍLIA – Em novo julgamento do Pacote Verde, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que a emissão de licenciamento ambiental automático para atividades tipificadas como de médio risco é inconstitucional. De autoria do Partido Socialista Brasileiro (PSB), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6808 foi aprovada pelo placar de 10 a 0. O ministro Dias Toffoli não participou da votação.

A ADI 6808 questionou as alterações da Medida Provisória 1040/2021, da Presidência da República, sobre a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim). Além da concessão automática sem análise humana para alvarás de funcionamento e licenças, na prática a norma impossibilitou a solicitação de informações adicionais dos empreendimentos por parte dos órgãos de licenciamento.

Para o advogado do PSB, Felipe Santos Correia, a norma inverte a lógica do sistema de controle ao impedir o monitoramento prévio das atividades nos processos de licenciamento. “Isso relega todo o controle do risco do impacto das atividades para atividade fiscalizatória, que no País é altamente deficitária, sobretudo a ambiental”.

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Correia advertiu que o Termo de Consentimento da Empresa, previsto na norma, dentro das interpretações possíveis, ultrapassou outras medidas prévias ao licenciamento ambiental, como a Autorização de Supressão de Vegetação (ASV), a Autorização Ambiental para Transporte de Produtos Perigosos e a Licença para Porte e Uso de Motosserra (LPU).

“A simples previsão na lei de que o licenciamento ambiental deve ser cumprido não afasta o risco de violações ao meio ambiente, ao qual estamos expostos com a manutenção dessa norma, uma vez que existem outros tipos de autorização e concessões que estão vinculadas ao procedimento legal de licenciamento ambiental”, esclareceu.

Na defesa de que a medida desburocratiza a atividade econômica, a Advocacia-Geral da União (AGU) argumentou que a medida não dispensa documentos necessários e reforçou que os empresários devem prezar pelo cumprimento da legislação ambiental.

“Não obstante, à concessão mais célere, isso não retira a obrigação do empresário de comprovar, antes do início das atividades empresariais, o cumprimento de toda a legislação, seja ela sanitária, ambiental ou mesmo de prevenção contra incêndios”.

Ministros contestam licenciamento

Relatora do processo, a ministra Cármen Lúcia votou enfatizando o princípio da prevenção, contida na legislação ambiental brasileira.

“Não se pode atuar em direção à mitigação dos riscos ambientais {…} tenho para mim que pela interpretação das normas da Constituição de 1988, há de se adotar, por diretriz, o que for necessário para antecipar-se aos riscos de danos que se possam causar ao meio ambiente. Não se resolve crise econômica com a criação de outras crises”.

A relatora também contestou que o empresário fiscalize a própria atividade. “Se é só pelo empresário, nós temos aqui uma possibilidade de não se ter um controle feito de maneira eficaz”.

Para o ministro Alexandre de Morais, a necessidade do Brasil desburocratizar a atividade econômica não pode incidir sobre as licenças ambientais, considerando-as incomparáveis a outras modalidades de licença por não haver retorno para o comprometimento ambiental.

“O que fez a norma jurídica foi inovar o ordenamento, ou seja, uma criação automática para atividades de risco médio sem uma análise humana, uma análise concreta específica daquele caso. Isso não é propriamente desburocratizar, isso é colocar em risco toda a questão ambiental”.

Mesmo reconhecendo que as pequenas e médias empresas são os grandes empregadores da economia brasileira, o ministro Gilmar Mendes ponderou pelo respeito ao rito preventivo de licenciamento.

“A necessidade de cautela e da prevenção não dispensa o poder público de dar uma dinâmica adequada para que esses processos e procedimentos sejam devidamente expedidos”.

Conclusão da ADPF 651

Ainda no início da sessão, o ministro Luis Fux concluiu o julgamento da ADPF 651, proposta pela rede Sustentabilidade, proferindo o voto que consolidou o placar de 10×1 pela admissão da inconstitucionalidade do decreto presidencial 10.224/2020 e decidindo em favor da participação da sociedade civil no conselho deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente.

“A participação popular é impositiva, e sendo impositiva houve uma violação da Constituição Federal que prevê a participação popular direta na definição das políticas públicas voltadas à preservação do meio ambiente”.

Pacote Verde

O Pacote Verde é o conjunto de sete ações que pretende frear os retrocessos na política ambiental do País como efeito de ações e omissões do governo federal. O julgamento é considerado um dos mais importantes já realizados sobre a pauta do meio ambiente, mobilizando lideranças indígenas e representantes da sociedade civil.

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