Brasileiros adotam conceito menos é mais em moradias alternativas e ecológicas, durante a pandemia

Nova alternativa de lar é uma casa feita a partir de um reboque e tem cerca de 30 metros quadrados. (Edilson Dantas / Agência O Globo)

Com informações do InfoGlobo

SÃO PAULO — Há quatro anos, o estatístico Robson Lunardi, 39 anos, e a especialista em turismo Bel Albernoz, 45, viviam com o filho João Pedro, 6, em uma bela casa de 167 metros quadrados na Zona Oeste de São Paulo. Eram, definem, “uma família típica de classe média, com sonhos idem”.

“Ou seja, trabalhávamos cada vez mais, para consumir cada vez mais e ter mais coisas. Até que tivemos burnout. Foi em nossas licenças médicas que percebemos que o custo daquela vida era muito alto. Era preciso mudar. Mudar mesmo”, conta Lunardi.

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O casal investiu em alimentação saudável, com menos carne. Depois, veio a busca pela sustentabilidade e o lixo zero. Logo, estavam usando apenas metade do espaço que viviam, até que o algoritmo os apresentou ao minimalismo das tiny houses.

“No começo, a Bel se assustou: “será que não é radical demais morar em um espaço de 27 metros quadrados?”. Mas não se trata apenas de viver em uma casinha, é uma filosofia de vida, um movimento”, diz Lunardi.

Eles largaram os empregos, doaram ou venderam tudo que tinham em São Paulo e partiram para os EUA, com o intuito de pesquisar e entender a vida em casas de até 37 metros quadrados, construídas de forma personalizada, desenvolvidas para simplificar a vida dos moradores, conceito que já atraía americanos interessados em uma vida mais prática, funcional, sustentável e, juram os tiners, muito, mas muito mais livre (inclusive com isenção de IPTU e IPVA).

Não há contagem oficial, mas o mercado estima que já são hoje cerca de 10 mil tiny houses nos EUA, com produção de 700 ao ano, com crescimento constante, desde a crise financeira global de 2008. E os modelos mais baratos começam a ser utilizados por prefeituras, especialmente na Costa Oeste, como uma das soluções para os sem-teto.

“A tiny house é uma casa feita a partir de um reboque, que oferece também a possibilidade de mobilidade. E, ao contrário dos trailers e motor homes, o foco é na moradia, não na viagem. Você pode viver cinco anos em um terreno na Mata Atlântica e, depois, mudar para outro no Cerrado, por exemplo” conta Lunardi.

Aumenta o interesse por moradias menores, mais simples e com baixo impacto ambiental, por conta da pandemia. (Edilson Dantas / Agência O Globo)

Menos é mais

Desde agosto de 2019, ele vive com a família na Araraúna, a primeira tiny homologada no País, que também abriga a filha da dupla, Lara, 3. Os móveis são multifuncionais, como a escada-armário, e a limpeza é “um passeio”: o “menos é mais” se reflete na facilidade de deixar tudo em ordem.

As paredes são de madeira legal, o material é reciclável ou de engenharia reversa e há mais janelas por metro quadrado do que em uma construção convencional, com ampla iluminação. Erguida sobre pedestais e a partir de um chassi de automóvel, não contamina o solo, com uso de privada seca e composteira.

“A pegada ambiental é central. Não há espaço para tralhas. Você vê e jamais esquece tudo que tem. Sabe o que foi mais complicado de se adaptar? Como a cama de casal fica num mezanino, acima da sala-cozinha, sem o pé-direito convencional, arrumá-la exige certa arte. Ah, e descer de noite para fazer xixi. Mas, você se acostuma”, garante.

Após um hiato durante a pandemia (“para ver o que iria acontecer”) as encomendas e pedidos de informação aumentaram tanto que a dupla reabriu a empresa, em 2020, e planeja a mudança da estrutura fabril, de um galpão em Porangaba, no interior paulista, para um espaço maior em Campinas. E de passar a produzir quatro, e não só duas casas por vez.

Eles já venderam cinco tiny e fabricam hoje outras quatro (uma para uma família do PA, outra do interior de SP, um Airbnb móvel na Serra Gaúcha e dois home offices, em SC e MG). Os preços vão de R$ 80 mil a R$ 400 mil, dependendo do projeto.

Impulsionados pelo êxodo urbano na pandemia e o desejo de ocupar espaços sem agredir o meio ambiente, mais brasileiros têm buscado soluções alternativas de moradia como a encontrada pelos Lunardi.

Foi o que aconteceu com o mestre de kung-fu e ex- integrante do Cirque du Soleil Luiz Pellegrini. Quem dorme em sua cabana na Serra da Cantareira, dentro da Mata Atlântica, não deixa o Airbnb sem perguntar como se faz para morar com simplicidade e “dentro da natureza”. O espaço de dois andares e pouco mais de 20 metros quadrados foi erguido em junho ao lado da casa convencional em que ainda vive com a mulher, Silvia, naturóloga, e os filhos, Theo, 6, e Ian, 3.

“O aluguel ajuda a recuperar o investimento, mas o plano é morar na cabana, que pode ser adaptada para quatro rodas. Queremos mostrar pros filhos a importância da simplicidade, da natureza, de se consumir o que se necessita”, diz.

A uma hora de carro do centro da capital, a cabana leva a assinatura do engenheiro-agrônomo Ricardo Afiune e do arquiteto e paisagista Peter Burmester, do Estúdio Okko. Suas microcasas de 15 a 50 metros quadrados são feitas de madeira reflorestada (pinus e eucalipto) e destoam dos casarões vizinhos.

A dupla, que já ergueu três unidades na Cantareira, negocia com uma centena de interessados, gente que comprou terrenos durante a pandemia em áreas verdes em endereços como o sul de Minas, a Chapada dos Veadeiros e a Bahia.

Preservar corpo e mente

A sustentabilidade das cabanas começa na construção. Elas são suspensas, com módulos que se encaixam a qualquer tipo de terreno.

“São sim pequenas, mas a casa segue no entorno. Os clientes preservam a natureza e, ao mesmo tempo, preservam, o corpo e a mente”, dizem os sócios.

Para a cabana de Pellegrini, nenhuma árvore foi derrubada. O paisagismo se resolveu com galhos e pedras. As peças de madeira semiprontas foram montadas no local e os móveis feitos sob medida.

A bioarquitetura inclui ventilação cruzada, reúso da água com captação da chuva, tratamento de esgoto com fossa séptica e uso de energia eólica ou solar. Mais limpa, a construção exige menos mão de obra e é mais rápida do que a convencional — um mês no modelo de 20 metros quadrados, por R$ 100 mil, e 45 dias no de 40 metros quadrados, a R$ 200 mil. O licenciamento ambiental é o mais demorado: pode chegar a um ano.

Há oito meses, a artista plástica Aline Soares também decidiu investir em uma casa alternativa, mas de forma independente. Ela registra o passo a passo da construção de sua motor home nas redes sociais. E assegura que “a morada transcende o material”. Leia a matéria completa no InfoGlobo.

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