‘David Almeida só veio dar close’, diz moradora de área de risco sobre prefeito de Manaus

A moradora chorou ao relembrar a trajetória de sofrimento que vive há décadas (Ricardo Oliveira/AGÊNCIA CENARIUM)
Ana Pastana – Da Revista Cenarium

MANAUS – “Sai deputado, sai prefeito, entra prefeito e, há 30 anos, minha casa é atingida pelas alagações. Toda vez é isso, desde quando eu era pequena. Ontem mesmo o prefeito David Almeida veio só dar close aqui“. A fala de revolta com a inação da Prefeitura de Manaus é de Janaína Texeira, de 30 anos, moradora da rua Pena Baixada, na Comunidade da Sharp, um dos locais afetados pelas fortes chuvas que caiu no sábado, 25.

Moradora da comunidade há 30 anos, Janaína relatou à REVISTA CENARIUM, neste domingo, 26, o ciclo eterno de luta contra a falta de infraestrutura e de políticas públicas, principalmente, por parte da Prefeitura. “Não temos acolhimento por parte de ninguém, e se fôssemos depender do prefeito David Almeida é só perda de tempo…”, alfinetou a moradora. “Para se ter uma ideia, não queriam me cadastrar (para receber auxílio) e só entrei porque fiz barraco. Queriam que eu tivesse vindo ontem (sábado, após as chuvas) mas, como que eu ia vir, com água pelas canelas?“, questionou.

Janaína Texeira, moradora da Comunidade da Sharp, Zona Leste de Manaus (Reprodução/REVISTA CENARIUM)

A moradora chorou ao relembrar a trajetória de sofrimento que vive há décadas: “Eu não aquento mais! Eles não fazem nada! Se eu fosse somar os móveis que a casa da minha mãe perdeu, que depois a minha casa perdeu, dava para abrir uma loja”, avaliou. “Eles querem nos dar rancho, mas eu pergunto: eu vou colocar minha filha morta em cima de um alimento? A população, aqui, está sofrendo e os grandes não fazem nada! Não deram nada e não estou falando de rancho”, protestou. Questionada se a defesa civil do município a procurou, ela respondeu: “Não veio ninguém até agora”, lamentou.

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A cuidadora de idosos Ana Cleia Barbosa, de 53 anos, e também moradora da Comunidade da Sharp, há quase 30 anos, criticou a Prefeitura de Manaus. “A água entra em nossas casas, alaga tudo, está tudo fedendo e o David Almeida vai dizer que está pagando aluguel para o povo que foi alagado, que deu rancho, que deu tudo. Não deu nada. A gente está precisando de ajuda. […]“, lamenta Ana Cleia.

Fomos lá [na escola] buscar assistência, as pessoas passando mal do lado de fora, não deixaram ninguém entrar, nem tomar café, dizendo que era só para o pessoal que tinha dormido lá dentro. Graças a Deus que as pessoas que perderam as casas estão dormindo lá dentro, mas, e as pessoas que perderam suas coisas? E a gente que perdeu tudo?” desabafou.

Cuidadora de idosos Ana Cléia (Priscilla Peixoto/REVISTA CENARIUM)

Essas histórias de vida são semelhantes a de seu Antônio Silva, aposentado, de 66 anos, morador da Comunidade da Sharp, desde 1995, que diz ter vivido inúmeros alagamentos e prejuízos ao longo dos anos e, até hoje, espera uma atuação efetiva do poder público. “Moro aqui há 28 anos e, nesse meio tempo, não vejo uma política de mudança, a gente pede ajuda e eles dizem que aqui não alaga e nós vamos ficando no prejuízo, perdendo móveis, eletrodomésticos. A Defesa Civil não veio aqui até agora“.

Antônio Silva, aposentado de 66 anos morador da Comunidade da Sharp desde 1995 (Reprodução/REVISTA CENARIUM)

A equipe da REVISTA CENARIUM esteve na Escola Municipal Aristóteles de Alencar, um dos locais usados como abrigo para as famílias atingidas na comunidade. A reportagem tentou contato com representantes do município, no local, (um dos poucos pontos em que os agentes municipais foram vistos) mas foi impedida de ultrapassar a parte interna da unidade. Por meio de divulgação à imprensa, a Prefeitura informou que está dando apoio às famílias atingidas pelas chuvas com atendimento psicossocial e cadastro em programas sociais.

Leia também: Ministros Waldez Góes e Marina Silva visitam áreas afetadas pelas chuvas em Manaus

A Prefeitura destacou, ainda, que por meio da Secretaria Municipal da Mulher, Assistência Social e Cidadania (Semasc) realizou, nesse sábado, atendimentos em diversas ocorrências provocadas pelas fortes chuvas do início da manhã.

A Escola Municipal Aristóteles Comte de Alencar foi um dos locais usados como abrigo para famílias atingidas pelas chuvas na comunidade
(Ricardo Oliveira/REVISTA CENARIUM)

Dezessete famílias foram alojadas na escola municipal Aristóteles Comte de Alencar, com o apoio de equipes da Secretaria Municipal de Educação (Semed). Desse total, para nove famílias, a Semasc fez o cadastro da ficha social, já que não são contempladas pelo programa“, diz a publicação divulgada para a imprensa.

As equipes da Semasc continuam nos bairros Zumbi, Zona Leste, e Japiim, na Zona Sul, atendendo as famílias que sofreram prejuízos por conta das chuvas, e também na localidade Manaus 2000“. Além disso, a Prefeitura de Manaus anunciou, neste domingo, 26, o início de uma campanha de doação para ajudar as famílias vítimas das fortes chuvas que atingiram a cidade no último sábado, 25.

Amparo do Governo

Conforme o Governo do Amazonas, ainda no sábado, foi estabelecido a criação de uma força-tarefa para acompanhar e amparar as famílias atingidas pelas chuvas. De acordo com a secretária de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc), Jussara Pedrosa, as famílias encaminhadas aos abrigos terão atendimento social, psicológico e toda estrutura necessária para o momento.

“No primeiro momento, retiramos as famílias e trazemos para as escolas e para os abrigos para dar o atendimento social, psicológico e [fazer] cadastro. Boa parte das famílias já estavam na área de intervenção dos programas. Tanto aqui na Sharp, quanto na Manaus 2000, então, o que está sendo feito, agora, é a confirmação dos cadastros, e vão partir para o aluguel, até terça-feira. Toda a estrutura do Estado está mobilizada para até terça-feira isso tudo ser resolvido. Nessa escola, Aristóteles de Alencar, tem uma média de 200 pessoas (40 famílias) e lá na Manaus 2000, nós temos 20 pessoas (seis famílias). Todas abrigadas, alimentadas. Todas. O Estado está se comprometendo“, explicou a secretária.

Área afetada pelas chuvas na Comunidade da Sharp (Ricardo Oliveira/REVISTA CENARIUM)

Ainda segundo o governo, serão antecipados reassentamento de moradores das comunidades da Sharp e Manaus 2000 (que também foram afetadas pelas chuvas), com concessão de bolsa moradia transitória. A Superintendência Estadual de Habitação (Suhab), assim como a Unidade Gestora de Projetos Especiais (UGPE), responsável pelo Prosamin+, devem acelerar o processo de reassentamento para essas famílias que perderam suas casas.

Nessa área da Sharp, o total do atendimento será de 2.382 famílias. Algumas delas, entraram depois do cadastramento que realizamos, e terão um atendimento apartado. Na terça-feira, haverá uma entrega para mais de 200 famílias, e àquelas que foram afetadas pelo ocorrido de ontem, e que o processo na Suhab já esteja fechado, serão incluídas a partir da semana que vem, independente do evento de terça, e começarão a receber seus definidos benefícios“, explica o diretor-executivo UGPE, Marcellus Campelo.

Comunidade da Sharp (Ricardo Oliveira/REVISTA CENARIUM)

Chuva e prejuízos

A forte chuva que atingiu Manaus, nesse sábado, transbordou igarapés (pequenos riachos que cortam a cidade) que invadiram e arrastaram residências nas zonas Sul e Leste da capital amazonense. Três crianças ficaram soterradas e foram encaminhadas a uma unidade de saúde na cidade. De acordo com a Defesa Civil municipal, até as 12h de ontem choveu, em média, 78,6 milímetros na capital. A zona mais afetada foi a Leste, com 122 milímetros de chuva.

Na ocasião, três crianças e três adultos ficaram feridos após um barranco desabar sobre residências na rua Projetada, bairro Armando Mendes, Zona Leste de Manaus. Três crianças ficaram soterradas e foram socorridas pelos vizinhos. Pelo menos mais quatro residências estão condenadas pela Defesa Civil. Duas casas ficaram completamente destruídas e outras duas foram parcialmente afetadas.

Casa que desabou no bairro Armando Mendes, onde as crianças foram resgatadas com vida (Ricardo Oliveira/REVISTA CENARIUM)

No bairro Zumbi dos Palmares, também na Zona Leste, casas foram invadidas pelas águas. Situação parecida ocorreu na Comunidade Manaus 2000, Zona Sul da capital amazonense, onde residências de madeira também foram arrastadas pelas águas de um igarapé próximo à comunidade. Na Zona Centro-Sul da capital, o muro do Condomínio Residencial Amazônia, na rua Mouzart Guarnieri, bairro Parque 10, desabou após a terra ceder.

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