Decisão do STF autoriza bancos a tomarem imóveis de devedores em 30 dias

Construção de prédio na avenida Sumaré, em Perdizes, bairro que vive nova onda de verticalização - Danilo Verpa - 21.jul.23/Folhapress
Da Revista Cenarium Amazônia*

SÃO PAULO – O  Supremo Tribunal Federal (STF) validou nesta quinta-feira, 26, a possibilidade de bancos tomarem, sem decisão judicial, imóveis financiados com parcelas atrasadas. Sem chance de contestação do devedor, o processo pode ser feito em 30 dias.

A decisão seguiu o entendimento do ministro relator, Luiz Fux. Foram oito votos a dois contra a contestação da constitucionalidade da chamada alienação fiduciária.

Esse instrumento, fundamentado em lei de 1997, permite que o credor assuma a propriedade no cartório, com base em acordo firmado no financiamento. Entenda os impactos da decisão.

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Ministro Luiz Fux em sessão plenária do STF em 7 de junho. Ele é um homem branco, de cabelo grisalhos, toga e terno.
Ministro Luiz Fux em sessão plenária do STF em 7 de junho – Carlos Moura/SCO/STF
O QUE MUDA COM A DECISÃO?

A decisão diz respeito apenas a imóveis financiados pelo Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), modalidade de créditos sem subsídios destinada a quem já tem bens imóveis ou quer comprar um bem avaliado em mais de R$ 1,5 milhão.

Imóveis abaixo desse valor, entretanto, podem ser financiados pelo SFI, uma vez que esse sistema apresenta mais flexibilidade do que a modalidade subsidiada, Sistema Financeiro de Habitação Sistema Financeiro de Habitação.

O imóvel citado no recurso extraordinário julgado, por exemplo, era avaliado em pouco mais de R$ 60 mil —a ação era de 2007.

Advogados ouvidos pela Folha afirmam que a recuperação do imóvel no cartório já é a prática padrão no mercado. A decisão do STF apenas garante a constitucionalidade do instrumento.

Em seu voto, o ministro relator Luiz Fux disse que a alienação fiduciária passou a ser usada em mais de 94% dos contratos ainda no ano de 2017.

EM QUAL PRAZO OS BANCOS PODEM TOMAR O IMÓVEL?

Os bancos podem procurar o cartório para executar esse contrato, segundo a lei, após três parcelas em atraso. Em geral, os contratos determinam de oito a nove meses para solicitar a recuperação do imóvel no cartório.

Uma vez acionado, o cartório notifica o devedor, que tem até 15 dias para quitar os valores pendentes, com juros, multas e encargos. Em mais 15 dias, o banco já em posse da propriedade pode leiloá-la.

Para evitar o leilão, o devedor precisa procurar a Justiça para contestar a alienação fiduciária com pedido de cautelar. Isso ainda depende de decisão judicial favorável.

O QUE DIZ QUEM É CONTRA E A FAVOR DA MEDIDA?

No STF, Edson Fachin e Cármen Lúcia foram as vozes dissonantes. Segundo Fachin, a medida “confere poderes excepcionais a uma das partes do negócio jurídico, restringe de forma desproporcional o âmbito de proteção do direito fundamental à moradia”.

Em sustentação oral, a Defesoria Pública da União defendeu que o instrumento desrespeita o devido processo legal, o direito ao contraditório e a ampla defesa e, por isso, seria inconstitucional.

O banco define o quanto o inadimplente deve e executa esse instrumento de maneira unilateral“, afirmou a Defensoria.

Os ministros que votaram junto a Fux argumentam que o direito ao devido processo legal fica mantido, já que o devedor pode procurar a Justiça para suspender a alienação fiduciária.

O defensor público Gustavo Zortéa diz que tal posição não considera as dificuldade de acesso à Justiça no país.

Nos casos em que o inadimplente vive no imóvel, ainda há desrespeito ao direito social a moradia, segundo Zortéa.

Questionado pela Folha, o Procon-SP afirmou que não comentará a decisão antes de avaliar seu inteiro teor.

O presidente da Associação Brasileira de Mutuários da Habitação (ABMH), Vinícius Costa, não respondeu ao pedido de comentário da reportagem. Ele atuou como amicus curiae no recurso extraordinário.

Moradores da ocupação Jorge Hereda, na Penha, noza leste de São Paulo; a comunidade surgiu em julho de 2021, na esteira da pandemia de Covid-19
Moradores da ocupação Jorge Hereda, na Penha, noza leste de São Paulo; a comunidade surgiu em julho de 2021, na esteira da pandemia. (Covid Karime Xavier/Folhapress)
O QUE É A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA?

Formalizada por lei de 1997, a alienação fiduciária é uma das de garantia possíveis no SFI, em que o próprio imóvel serve de caução.

O instrumento também pode ser usado em financiamentos subsidiados do SFH, que, em geral, usa Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e caderneta de poupança como garantias.

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Na alienação fiduciária, o bem imóvel fica no nome da instituição financeira até a quitação da dívida. O comprador, até o fim do financiamento, ganha direito de uso. Após liquidar o débito, a pessoa precisa ir ao cartório fazer uma averbação para consolidar o imóvel em seu nome.

Esse instrumento foi uma alternativa à hipoteca, criada pelo decreto-lei nº 70 de 1966, instituído pelo presidente militar Humberto de Alencar Castelo Branco. Nesse caso, o imóvel ficava no nome do financiador e o banco precisava buscar a Justiça para reavê-lo.

A alienação fiduciária também é diferente da hipoteca porque evita que o mesmo bem seja usado como garantia em diferentes instituições financeiras. Isso desincentiva tentativas de refinanciamento que podem gerar novas dívidas.

(*) Com informações da Folhapress

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