Deputada bolsonarista do AM espalha fake news sobre povo Yanomami

Deputada foi eleita, em 2022, com 32.406 votos, defendendo o slogan "Deus, Pátria e Família" (Reprodução/Facebook
Daniel Amorim – Da Revista Cenarium

MANAUS – Um dia antes de assumir o cargo de deputada estadual pelo Amazonas, maior Estado indígena do Brasil, Débora Menezes (PL) divulgou ‘fake news’ sobre a origem dos Yanomami que enfrentam a crise humanitária em Roraima. Na terça-feira, 31, Menezes compartilhou postagem em sua conta no Instagram com declaração do deputado da Assembleia Nacional Venezuelana, Romel Guzamama, afirmando que os indígenas fugiram do país para escapar da desnutrição.

Romel Guzamana, deputado da Assembleia Nacional da Venezuela, denunciou a grave desnutrição de nossos irmãos indígenas Yanomami do Estado Bolivar. Cruzaram ao Brasil (sic) em busca de comida, outra violação aos direitos humanos indígenas por culpa do regime de Maduro“, escreveu Menezes. “A esquerda tenta emplacar tais narrativas contra o Governo Bolsonaro que muito trabalhou em favor dos povos indígenas no Brasil. Chega de mentiras!!!

Guzamama, no entanto, não apresentou provas da declaração, que contraria posicionamentos de autoridades brasileiras. Ele integra o partido Vontade Popular, liderado por Juan Guaidó, principal opositor do governo de Nicolás Maduro que se autoproclamou presidente da Venezuela, em 2019.

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O ex-presidente Jair Bolsonaro e dirigentes de outros países apoiaram a investida de Guaidó. A Assembleia Nacional venezuelana, porém, revogou o mandato interino no final de 2022.

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Menezes compartilhou postagem de deputado venezuelano que contraria posicionamento de autoridade brasileiras (Reprodução/Instagram)

A declaração da parlamentar ocorre duas semanas após o governo federal criar uma força-tarefa para buscar soluções para uma das maiores crises humanitárias deixada pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), com a morte de crianças desnutridas em Terra Yanomami, em Roraima.

No Amazonas, a Defensoria Pública do Estado (DPE-AM) informou que indígenas do povo Yanomami precisam de atendimento de saúde e assistencial nos municípios de São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos. Ainda há um “apagão” de informações sobre o número de indígenas em situação de vulnerabilidade no Estado amazonense.

Uma equipe da REVISTA CENARIUM está em Roraima acompanhando a crise humanitária do povo Yanomami, onde pelo menos 44 crianças estão internadas no hospital infantil da capital. No total, 54 indígenas estavam internados até essa terça-feira, 31. As principais causas das internações são: doença diarreica aguda, gastroenterocolite aguda, desnutrição, desnutrição grave, pneumonia, acidente ofídico e malária.

A crise humanitária indígena que afeta os Yanomami levou, somente em 2022, a 703 internações de indígenas no Hospital da Criança de Boa Vista. Desses, 58 foram por desnutrição. Uma enfermaria foi preparada para receber os indígenas da etnia Yanomami, na tentativa de respeitar a cultura e a tradição dos indígenas, inclusive, com leitos-rede para crianças e acompanhantes.

Leia também: Em RR, mais de 40 crianças Yanomami estão internadas; oito delas na Unidade de Terapia Intensiva

(Ricardo Oliveira / Revista Cenarium)

Direito imemorial

Antes de tomar posse na Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam), Débora declarou que a defesa de projetos voltados a indígenas e pessoas LGBTQIAP+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Queer, Intersexuais, Assexuais, sendo que o símbolo “+” acolhe as demais orientações sexuais) não seriam a prioridade de seu mandato, mas que vai “respeitar os colegas que propuserem projetos nesse sentido”. A advogada foi eleita, em 2022, com 32.406 votos, defendendo o slogan “Deus, Pátria e Família“.

A fake news desconsidera o direito imemorial dos povos indígenas às terras que ocupam“, afirma a historiadora Elisangela Martins, mestre em História Social pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam). “Isso significa que as terras foram ocupadas muito antes da invenção do Brasil, da Venezuela e de fronteiras pelos colonizadores. O segundo erro consiste em desconsiderar que nós, brasileiros, temos uma Terra Indígena Yanomami demarcada e homologada desde 1991“.

Segundo Elisangela, trata-se de outra tentativa de um grupo que “pretende se basear em mentiras para continuar promover o descalabro na Amazônia e no Brasil. Gente que domina a mentalidade de outras pessoas dizendo que não houve falta de cuidado e responsabilidade criminosa dos governantes brasileiros em relação a isso.

Falta grave

A jornalista e cientista política Liege Albuquerque enfatiza algumas orientações básicas para evitar a divulgação de informações falsas na internet. “Os usuários devem checar as informações em sites com credibilidade, extensão de domínio “ponto com”, reportagens assinadas e expediente”. De acordo com a especialista, o posicionamento indica uma falta grave por se tratar de uma autoridade parlamentar.

É lamentável que uma deputada não conheça as fronteiras entre Roraima e Venezuela e, além disso, não saiba que houve 19 pedidos de ajuda dos indígenas ao governo brasileiro. Até então, nunca se levantou a hipótese de que eram venezuelanos. Nenhum deles pediu ajuda em espanhol ao Congresso e à ex-ministra (dos Direitos Humanos) Damares Alves“.

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