Em expansão, garimpo em terras indígenas avançou 632% em 11 anos, revela MapBiomas

Garimpo de ouro na região do Alto Tapajós, na Amazônia paraense (Gustavo Basso/National Geographic Brasil)
Bruno Pacheco e Karol Rocha – Da Revista Cenarium

MANAUS – Um novo estudo do MapBiomas, divulgado nessa terça-feira, 27, mostrou que o garimpo em terras indígenas avançou 632%, no período de 2010 a 2021. Os dados revelam, ainda, que a atividade dobrou em uma década, expandindo de 99 mil hectares para 196 mil hectares entre 2010 e 2021, sendo o bioma Amazônia com a maior área garimpada no Brasil, 91,6%.

A mineração industrial, conforme o estudo, também teve um salto significativo, mas menos acentuado. Em dez anos, a atividade ocupou 170 mil hectares, em 2021. Os dados chamam a atenção de especialistas, que apontaram a concentração das atividades na Amazônia.

“A série histórica mostra um crescimento ininterrupto do garimpo e um ritmo mais acentuado que a mineração industrial na última década, além de uma inequívoca tendência de concentração na Amazônia, onde se localizam 91,6% da área garimpada no Brasil, em 2021”, afirmou Cesar Diniz, coordenador técnico do mapeamento.

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O doutor em Clima e Ambiente, professor Rogério Marinho, comenta que os resultados refletem bem a expansão da atividade garimpeira em diferentes áreas do Bioma Amazônia, principalmente em Estados como Pará e Roraima. Ele ressaltou, ainda, que a ausência de fiscalização por parte de órgãos faz com que acelere o processo da atividade na região.

“Nos últimos anos, a atividade de garimpo, principalmente de ouro, tem se expandido de forma descontrolada e muitas vezes é facilitada pela ausência de ações de comando e controle do poder público, em especial pelo enfraquecimento proposital de instituições federais como o Ibama, Funai e ICMBio”, disse o especialista, denunciando colaboração de prefeitos que atuam em favor de cooperativas de garimpeiros.

De acordo com o estudo, dois Estados específicos – Pará e Mato Grosso – respondem por 71,6% das áreas mineradas no País, ou seja, quando somado a mineração industrial e a atividade garimpeira. Mas quando o garimpo é considerado isoladamente, o percentual sobe para 91,9%. Em números detalhados, são 113.777 hectares de garimpo no Pará e 59.624 hectares no Mato Grosso.

Quatro dos cinco municípios brasileiros com maior área de garimpo ficam no Pará: Itaituba (57.215 hectares), Jacareacanga (15.265 hectares), São Félix do Xingu (8.126 hectares) e Ourilândia do Norte (7.642 hectares). Em terceiro lugar, ficou Peixoto do Azevedo, no Mato Grosso, com 11.221 hectares.

Foto: BRUNO KELLY/REUTERS
Helicóptero patrulha pista utilizada pelos garimpeiros durante operação do Ibama contra a mineração ilegal de ouro em terras indígenas (Foto: Bruno Kelly/REUTERS)

Unidades de Conservação

A expansão garimpeira na Amazônia foi mais intensa em áreas protegidas, como territórios indígenas
e Unidades de Conservação. Conforme o estudo, entre 2010 e 2021, as áreas de garimpo em terras indígenas cresceram 632%, ocupando quase 20 mil hectares no ano passado. Quanto as Unidades de Conservação, o garimpo cresceu 352%, entre 2010 e 2021.

O professor Rogério Marinho enumerou as Unidades de Conservação em que são ocupadas pelo garimpo de ouro e disse que, ‘grandes grupos organizados e capitalizados atuam na manutenção de exploração de ouro de forma predatória’.

Ainda segundo o especialista, apesar de as UCs serem destinadas para proteção da biodiversidade e uso sustentável de seus recursos, muitas vezes sua função não é respeitada pela rede de agentes que desenvolvem a atividade garimpeira na região, na maioria das ocasiões de forma ilícita.

“Cabe destacar que a atividade de mineração pode ocorrer em unidades de conservação, como por exemplo, a mineração de cassiterita na Floresta Nacional Jamari, em Rondônia, com licenciamento previsto em seu plano de manejo. Porém, o garimpo de ouro, desde a década de 1970, é realizado na Amazônia de forma predatória com significativos impactos sobre a floresta, fauna, recursos hídricos e a população, e sem gerar tributos”, afirmou ele.

A terra indígena mais explorada foi a Kayapó, na qual 11.542 hectares foram tomados pelo garimpo até 2021. Em seguida, vem o território Munduruku, com 4.743 hectares, a terra Yanomami, com 1.556 hectares, a Tenharim do Igarapé Preto, com 1.044 hectares, e o território Apyterewa, com 172 hectares.

Em relação a Unidades de Conservação, 43.266 hectares de garimpo são ocupadas na APA do Tapajós. Em segundo lugar, vem a Flona do Amanã, com 5.400 hectares, seguida pela Flona do Crepori (1.686 hectares), a Parna do Rio Novo (1.637 hectares) e a Flona do Jamari (1.191 hectares).

Mineração ilegal na terra indígena Munduruku, no Pará (Vinícius Mendonça/Ibama/via Agência Senado)

Aquecimento de mercado

Para o ambientalista mestre em Ecologia, Carlos Durigan, os dados do MapBiomas corroboram com os fatos de que a Amazônia tem vivenciado nos últimos anos e com especial gravidade ao estimar a extensão do problema. Na análise do especialista, a expansão da atividade garimpeira ilegal “é resultado do aquecimento do mercado do ouro no mundo” que tem perdido o controle.

“A expansão da atividade garimpeira ilegal é resultado do mercado do ouro no mundo, aliado a uma total falta de controle sobre esta atividade, cuja expansão ainda acontecendo até com apoio de governos e políticos, inclui a tomada de territórios protegidos (Unidades de Conservação e Terras Indígenas), terras públicas não destinadas e ainda leitos de rios e APPs (Áreas de Proteção Permanente)”, destacou.

Durigan salienta ainda que a disseminação da atividade sobre áreas de domínio público onde, lembra ele, qualquer atividade degradante é proibida por lei, demonstra a grave situação de ineficácia do poder público em conter o avanço do crime organizado na Amazônia.

“UCs e TIs são terras públicas destinadas e que contam em teoria com o aparato de estado para a sua proteção e o fato do garimpo ilegal avançar sobre estas áreas mostra o nível de fragilização que chegaram as instituições de Estado que têm a proteção destes territórios como sua principal missão”, frisou Carlos Durigan.

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