Estudo aponta que mineração em TIs na Amazônia Legal aumentou 1.217% nos últimos 35 anos

A fim de identificar as áreas de mineração em terras indígenas, os pesquisadores usaram um conjunto de dados referentes ao período de 1985 a 2020 fornecido pelo projeto MapBiomas (Reprodução/ISA)
Da Revista Cenarium*

SÃO PAULO – A mineração em terras indígenas na Amazônia Legal aumentou 1.217% nos últimos 35 anos, saltando de 7,45 quilômetros quadrados (km²) ocupados por essa atividade, em 1985, para 102,16 quilômetros quadrados em 2020. Quase a totalidade (95%) dessas áreas de garimpo ilegal está concentrada em três terras indígenas: Kayapó, seguida pela Munduruku e a Yanomami.

Os dados são de um estudo feito por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e da Universidade do Sul do Alabama, dos Estados Unidos. Os resultados do trabalho foram publicados na revista Remote Sensing.

Registro fotográfico feito em 26 de novembro de 2020, quando foi deflagrada, pela Polícia Federal, a Operação Rêmora no intuito de desarticular uma associação criminosa suspeita de coordenar atividade de garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami (TIY) (Divulgação/PF)

“Observamos um crescimento constante da mineração em terras indígenas, entre 1985 e 2020, que se agravou a partir de 2017. Naquele ano, o garimpo ilegal ocupava 35 quilômetros quadrados em terras indígenas e, em 2020, saltou para quase 103 quilômetros quadrados”, diz à Agência Fapesp Guilherme Augusto Verola Mataveli, pós-doutorando na Divisão de Observação da Terra e Geoinformática do Inpe, bolsista da Fapesp e primeiro autor do estudo.

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Outros autores do artigo são Michel Eustáquio Dantas Chaves, também pesquisador do Inpe, e Elton Vicente Escobar Silva, doutorando na instituição.

A fim de identificar as áreas de mineração em terras indígenas, os pesquisadores usaram um conjunto de dados referentes ao período de 1985 a 2020 fornecido pelo projeto MapBiomas – uma rede colaborativa formada por organizações não governamentais, universidades e startups de tecnologia que mapeiam a cobertura e o uso do solo no Brasil.

A iniciativa classifica o tipo de uso e cobertura da terra em todo o Brasil, por meio da análise automática, feita por algoritmos, de imagens obtidas por satélites, com resolução espacial de 30 metros.

“Com base na classificação automática das imagens, o sistema é capaz de distinguir uma área de floresta de outra, com mineração consolidada, que tem solo exposto e características muito diferentes da cobertura vegetal”, explica Mataveli.

Uma das limitações do sistema para identificar mineração em terras indígenas, contudo, é a impossibilidade de classificar o garimpo em embarcações ancoradas em rios ou em pequenas áreas onde não ocorreu a conversão da floresta para essa atividade.

“Esse número alarmante do avanço da mineração em terras indígenas, na Amazônia Legal, que levantamos, provavelmente é ainda maior se levarmos em conta essas limitações do conjunto de dados utilizados”, afirma Mataveli.

Nova Fronteira do Garimpo

De acordo com dados do estudo, a maior parte do garimpo ilegal dentro das terras indígenas, na Amazônia Legal, está relacionada à mineração de ouro (99,5%) e apenas 0,5% à mineração de estanho.

Essa atividade está mais intensa na Terra Indígena Kayapó, onde a estimativa da ocupação da área por garimpeiros em 2020 – de 77,1 quilômetros quadrados – foi quase 1.000% superior à encontrada em 1985, de 7,2 quilômetros quadrados.

Já na Terra Indígena Munduruku, a atividade mineradora apresentou forte crescimento a partir de 2016, saltando de 4,6 quilômetros quadrados para 15,6 quilômetros quadrados em apenas cinco anos. O mesmo padrão foi encontrado na Terra Indígena Yanomami, onde o garimpo ilegal ocupava 0,1 quilômetros quadrados, em 2016, e avançou para 4,2 quilômetros quadrados em 2020.

“São nessas três terras indígenas que o poder público tem que, de fato, atuar, por meio da intensificação de ações de fiscalização, para impedir o avanço da mineração ilegal”, avalia Mataveli.

De acordo com o pesquisador, a Terra Indígena Yanomami, demarcada em 1992, é a mais isolada entre as três. Esse isolamento dificultou, por muito tempo, o acesso de garimpeiros ilegais. O aumento da cotação do ouro, no mercado internacional, e o enfraquecimento da proteção da Amazônia Legal, nos últimos anos, contudo, estimularam os investimentos em infraestrutura de acesso a essa área protegida.

“Essa combinação de fatores culminou na transformação da Terra Indígena Yanomami em uma nova fronteira da mineração”, afirma Mataveli.

Segundo dados do estudo, em 2018, a mineração ultrapassou, pela primeira vez, 2 quilômetros quadrados na Terra Indígena Yanomami. Desde então, o aumento exponencial dessa ilegalidade resultou em um cenário de invasões e violações de direitos humanos.

Em 2022, a Polícia Federal identificou um aumento de 505% na mineração às margens do Rio Uraricoera. As lideranças Yanomami estimam a presença de mais de 20 mil garimpeiros ilegais dentro do território indígena, enquanto o número total de indígenas é de cerca de 30 mil. Além disso, a presença de garimpeiros ampliou os casos de malária e espalhou outras doenças infecciosas para os povos indígenas.

“A tragédia que estamos vendo, hoje, com a crise humanitária dos Yanomami, já era previsível”, diz Mataveli.

Para reverter esse cenário é preciso, em um primeiro momento, identificar e monitorar as terras indígenas onde o garimpo ilegal tem aumentado de forma mais expressiva nos últimos anos. Além disso, é preciso coibir o desmatamento.

Normalmente, a mineração, na Amazônia Legal, incluindo nas terras indígenas, ocorre após o desmatamento, diz Mataveli.

“A mineração ilegal na Amazônia está muito ligada ao desmatamento, porque é preciso desmatar a floresta para depois explorar o solo”, afirma.

(*) Com informações da Folhapress
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