Friagem no Amazonas: entenda fenômeno natural que acontece todos os anos

No Amazonas, a friagem iniciou na quinta-feira, 15. (Fernando Frazão/Agência Brasil)
Ívina Garcia – Da Revista Cenarium

MANAUS – A “friagem” atinge o Estado do Amazonas desde a última quinta-feira, 15, e em alguns municípios como Envira, Ipixuna e Guajará, a sensação térmica chegou a ficar entre 14º e 15 °C. Na capital Manaus, os termômetros caíram para 21 °C. O bacharel e mestre em Meteorologia, doutor em Biodiversidade e Biotecnologia, Jefferson Vilhena descarta a relação do tempo mais frio com fenômenos como El Niño e La Niña.

Segundo o pesquisador e gerente-geral do Núcleo de Hidrometeorologia e Energias Renováveis do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (NHMET/Iepa), a rápida queda de temperatura em locais onde normalmente não são registrados termômetros tão baixos está relacionado à “friagem“.

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Montagem feita por internautas para ilustrar frio sentido na capital amazonense (Reprodução/Twitter)

As friagens fazem a temperatura e a umidade relativa caírem rapidamente. São causadas por massas de ar frio que alcançam a Amazônia e elas são provenientes de um dos ciclones extratropicais que ocorrem na região Sul, as famosas frentes frias. Quando esses ciclones estacionam sobre a região Sul do Brasil, até mesmo próximo da Argentina, sobre os oceanos, eles acabam prendendo a massa de ar frio que deveria se deslocar e essa massa de ar frio, por ficar estacionária, começa a se deslocar para a Amazônia“, explica.

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Jefferson explica ainda que após chegar na Amazônia, a massa de ar frio se encontra com a massa de ar quente equatorial, ocasionando a friagem. O pesquisador conta que, durante pesquisas que executou na região Sul do Amazonas, foi possível identificar de três a cinco eventos de friagem, que não são relacionados com El Ninõ ou La Niña.

Esse evento de friagem é natural e ocorre todos os anos, ele não tem uma relação direta com o El Niño ou La Niña, já que esse fenômeno acontece no Oceano Pacífico“, esclarece. “Os eventos de friagens são comuns, todo ano ocorrem friagens onde essas frentes frias conseguem ter mais força, já que o Sol está aquecendo o Hemisfério Norte“, justifica.

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Esquema simplificado do comportamento dos ventos e sua influência sobre a temperatura das águas do Pacífico em anos normais e em anos de El Niño. (Reprodução/Brasil Escola)

Lã Niña é um evento climático e fenômeno oceânico-atmosférico caracterizado pelo resfriamento anormal das águas do Oceano Pacífico Equatorial. Já o El Niño, também conhecido como El Niño Oscilação-Sul (ESNO), é um fenômeno atmosférico-oceânico caracterizado por um aquecimento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico Tropical.

Mudança Climática

Com relação à mudança brusca de temperatura, o especialista explica que pode estar mais relacionadas à poluição e interações humanas, mas que o tema precisa ser mais amplamente estudado por cientistas na Amazônia.

A gente precisa ter um incentivo maior de estudos e pesquisas nos nossos Estados da Amazônia, justamente para a gente possa conseguir entender o que está acontecendo e como está acontecendo, se essas mudanças estão mesmo relacionadas às interações humanas ou se essas mudanças estão relacionadas a fenômenos naturais“, diz.

Focos de calor em área próxima aos limites da Terra Indígena Kaxarari, município de Lábrea (AM) (Christian Braga/Greenpeace)

Temos aí muitas queimadas na Amazônia e desmatamento, muitas vezes a gente percebe a mudança do microclima em certa intensidade por conta desse desmatamento por conta dessas queimadas. O temor dos pesquisadores está justamente no número de ocorrências de queimadas ser tão grande a ponto de não só influenciar o microclima de pequenas cidades ou um mesoclima de certas localidades, mas sim um clima já em escala planetária”, revela.

Friagem

Segundo a doutora em Ciências Atmosféricas pela Universidade do Colorado e professora na Universidade de São Paulo, Maria Assunção Faus da Silva Dias, que escreveu para o “Tempo de Aprender em Clima de Ensinar“, criado pela equipe do Laboratório de Meteorologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Lamet/UENF), a friagem pode causar enorme impacto na população amazônica e até mesmo na fauna da região.

“As pessoas sentem muito frio, não tem agasalhos adequados, sofrem por uns dias e há grande mortandade de peixes associada à passagem do ar frio. Como qualquer região próxima do Equador, a Amazônia se caracteriza por pequenas variações de temperatura. Tanto a amplitude diária de variação da temperatura como a anual, são pequenas quando comparadas com regiões de latitudes subtropicais e latitudes médias. A friagem muda essa situação de forma surpreendente”, escreve.

A especialista ressalta que o fenômeno é histórico, servindo, inclusive, de inspirações para antigas lendas amazônicas. “As populações indígenas de Rondônia, Acre e Alto do Rio Negro têm lendas a respeito das friagens envolvendo os seus impactos e os deuses que as mandam para castigar os homens. A morte dos peixes é vista como um sinal poderoso dos céus”, acrescenta.

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