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Funai flagra invasores na TI Tanaru, em Rondônia, logo após sepultamento do ‘Índio do Buraco’
(Fotos; Reprodução/Folha de São Paulo/ Montagem: Thiago Alencar/CENARIUM)
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02 de fevereiro de 2023
Iury Lima – Da Revista Cenarium
VILHENA (RO) – O ataque não poderia ter sido mais desrespeitoso. Fazendeiros invadiram o túmulo do ‘Índio do Buraco’, último habitante da Terra Indígena (TI) Tanaru, horas depois do sepultamento dele. Eles foram flagrados por câmeras instaladas no território pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) para monitorar o homem de etnia desconhecida.
O descaso e a especulação sobre a TI Tanaru não é de agora: o homem, que viveu sozinho por quase 30 anos depois de ver todo seu grupo ser assassinado por invasores, foi encontrado morto por servidores da Funai, em agosto de 2022, e levou cerca de três meses para ser enterrado em uma cova no interior da palhoça onde morava.
A cerimônia, conduzida por indígenas da etnia Kanoé, que também habitam mais ao sul do Estado, ocorreu pela manhã do dia 4 de novembro, uma sexta-feira. Já na tarde daquele mesmo dia, homens começaram a perambular pela área. Fotos dos invasores foram divulgadas pelo jornal Folha de São Paulo.
Nas fotos obtidas e publicadas pela Folha, nota-se que os homens circulavam pelo exterior da palhoça, olhando para dentro da casa. Um deles levava um facão pendurado na cintura, quase sempre com o celular na mão.
A REVISTA CENARIUM procurou a Funai e questionou sobre o caso, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
‘Vilipêndio’
O Ministério Público Federal (MPF) classifica que “invasores podem responder pelos crimes de dano qualificado, dano em coisa de valor arqueológico e histórico e vilipêndio a cadáver”. “Na área está a maloca em que o Índio do Buraco foi sepultado e outros locais sagrados, além de sítios de valor histórico, cultural e ambiental”, afirma.
A nota é de dezembro do ano passado, um mês depois da invasão registrada pela Funai, mas só agora o MPF confirmou que o posicionamento foi tomado por conta deste episódio. Na época, o órgão notificou fazendeiros sobre a proibição de entrar na TI Tanaru.
Destino socioambiental
A existência do ‘Índio do Buraco’, ainda que sozinho, protegeu o território de invasores por quase três décadas. A terra, no entanto, nunca foi demarcada. Localizada entre quatro municípios do sul rondoniense, ela é protegida apenas por portaria de Restrição de Uso e Ingresso. São 8 mil hectares cercados por cinco fazendas com áreas desmatadas para atividades de criação de gado e lavoura mecanizada, segundo o MPF.
Também, em dezembro, a Procuradoria entrou com uma ação civil pública, na Justiça federal, obrigando a Funai a garantir a proteção e preservação da Terra Indígena Tanaru com demarcação do território. O que o MPF quer é que a área ganhe destinação socioambiental.
“O caso é inédito porque o ‘Índio do Buraco’ foi o último sobrevivente de genocídio de um povo indígena desconhecido, recusou a todas as tentativas de contato e aproximação de não indígenas e resistiu sozinho na terra indígena durante 27 anos”, disse órgão por meio de nota.
Para os procuradores da República Daniel Luis Dalberto e Leonardo Caberlon, a destinação da área à proteção como Terra Indígena demarcada pode significar a reparação dos atos de violência e usurpação pelos quais a etnia [popularmente chamada] Tanaru e outras passaram. “A destinação a particulares pode significar o oposto: uma premiação a atos ilícitos”, critica o Ministério Público Federal.
Morto cerca de 40 dias antes de ser encontrado, o ‘Índio do Buraco’ só foi sepultado quase três meses depois por causa de uma disputa judicial com a Funai. Os restos mortais chegaram a ser examinados em Brasília e depois foram enviados de volta para Rondônia, onde ficaram, segundo sites de notícias, armazenados no prédio da Polícia Federal (PF) na cidade de Vilhena, a 705 quilômetros de Porto Velho – versão que a PF negou, quando questionada pela CENARIUM.
O ‘Índio do Buraco’ ganhou este nome porque ficou conhecido por abrir covas na mata, comportamento que até hoje os indigenistas não entendem. Ele nunca aceitou estabelecer contato com o homem não indígena, nunca aceitou presentes, como ferramentas e alimentos, e também nunca reproduziu um único som, ao encontrar pessoas que vieram de fora da floresta. Visto poucas vezes, quase não existem registros dele, em vídeo.
Quando encontrado morto, ele estava deitado numa rede, vestido com roupas tradicionais e adereços feitos com penas de araras, como se esperasse pela morte. Para o mundo, a perda do homem tido como símbolo da resistência dos povos isolados de todo o Brasil, repercutiu como o exemplo do completo genocídio de uma população originária da Amazônia.
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