Garimpeiro que atacou agentes do Ibama em RR vai responder por tentativas de homicídio

Agente do Ibama na Terra Indígena Yanomami (Reprodução/Ibama)
Da Revista Cenarium Amazônia*

BRASÍLIA (DF) – A Justiça Federal em Roraima recebeu a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) e tornou réu Gelso Barbosa Miranda, acusado da tentativa de homicídio contra três agentes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) que atuavam na base operacional do instituto instalada na comunidade Palimiuna, na Terra Indígena Yanomami, em Roraima.

O crime aconteceu por volta das 2 horas do dia 23 de fevereiro de 2023, no Rio Uraricoera, quando o réu, que conduzia uma embarcação do tipo ‘voadeira’ – barco de pequeno porte com estrutura de metal movido a motor –, desobedeceu a ordem legal de parar dada pelos agentes do Ibama, encarregados das operações de combate ao garimpo ilegal.

Conforme apurado durante o inquérito policial, Gelso estava no comando de uma embarcação que compunha um comboio de sete ‘voadeiras’ carregadas com minério cassiterita extraído ilegalmente do interior da terra Yanomami. Todas as embarcações se dirigiram de forma coordenada, planejada e em alta velocidade em direção à barreira instalada pela equipe do Ibama.

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Após furar o bloqueio, a embarcação do réu chegou a parar de funcionar por alguns instantes, o que permitiu a aproximação dos agentes do Ibama para abordagem. No entanto, ele religou o motor, jogou a embarcação contra a dos agentes. Na sequência, Gelso jogou o barco, por mais duas vezes, contra os agentes do Ibama, o que por pouco não provocou o naufrágio da embarcação do instituto.

A denúncia do MPF salienta que a voadeira conduzida pelo réu era equipada com motor de popa 200 HP, substancialmente mais potente do que a embarcação utilizada pelos agentes do Ibama, cujo motor era de 75 HP. A voadeira conduzida por Gelso perseguiu os agentes e atingiu a embarcação em três oportunidades, com fortes colisões laterais. Na primeira batida, as vítimas quase caíram no rio e, na segunda, a embarcação quase virou. Os agentes chegaram a cair, mas a embarcação não virou e um dos agentes disparou, em sua defesa, contra a voadeira conduzida pelo réu.

No trecho do Rio Uraricoera em que aconteceu a abordagem, há forte correnteza e significativa profundidade, sendo elevado o risco de afogamento em caso de naufrágio, sobretudo em período noturno. “O crime de homicídio, na modalidade tentada, foi praticado para assegurar a impunidade e a vantagem decorrentes do crime de usurpação. Além disso, o óbito causado por afogamento devido a um naufrágio provocado é meio cruel, eis que suscetível de provocar maior sofrimento à vítima”, pontua a denúncia do MPF.

O local é o mesmo onde garimpeiros ilegais entraram em confronto com a Polícia Federal em maio de 2021 e onde foi instalado um cabo de aço no rio para impedir a passagem dos invasores.

Outros crimes 

Além de responder pelos três homicídios qualificados tentados, o réu também está sendo processado por garimpo ilegal (artigo 2º, §1º, da Lei nº 8.176/91), ou seja, crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpação ou exploração matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo, e por desobedecer a ordem legal de funcionário público (artigo nº 330 do Código Penal).

Atendendo ao pedido do MPF, a Justiça homologou o arquivamento do inquérito policial que apurava a conduta dos agentes do Ibama que chegaram a disparar contra o réu. Segundo a decisão judicial, nos termos do artigo 25 do Código Penal, entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

Garimpo ilegal

A atividade garimpeira exercida de modo irregular, além de atentar contra o patrimônio do Estado Brasileiro e o meio ambiente, resulta em consequências nefastas à saúde pública. Isso porque o processo de extração dos recursos minerais envolve a utilização de mercúrio, substância comprovadamente cancerígena e causadora de outros agravos à saúde”, aponta o MPF, na denúncia apresentada a Justiça Federal.

A tolerância com a atuação dos garimpeiros ilegais, de acordo com o órgão, contribui para potencializar a poluição dos rios e a destruição da fauna aquática, repercutindo, ainda, na qualidade de vida dos povos indígenas e das populações ribeirinhas que habitam a bacia hidrográfica e têm os peixes como base da sua dieta alimentar.

O garimpo ilegal em terras indígenas na Região Norte do país adquiriu dimensões de tragédia humanitária, atraindo a atenção de diversos organismos internacionais, a exemplo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Comissão IDH) e da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH). A Corte IDH, em resolução de 1º de julho de 2022, adotou as medidas provisórias requeridas pela comissão, determinando que o Estado Brasileiro promova ações para proteção da saúde e da vida dos povos indígenas. Na oportunidade, salientou-se a extrema gravidade da presença de garimpeiros em terras indígenas.

A ação penal foi apresentada por um dos 30 ofícios socioambientais especializados criados pelo MPF em 2022 na região amazônica. As atribuições dos novos ofícios (comuns e de administração) foram definidas pelo Conselho Superior do MPF. Na Amazônia Ocidental, que compreende os estados de Roraima, Rondônia, Acre e Amazonas, os ofícios regionais especializados no combate ao garimpo e à mineração ilegais entraram em funcionamento em agosto de 2023.

(*) Com informações do MPF

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