IBGE: número de quilombolas no AM está subnotificado, aponta liderança

Quilombo Sacopã, na Lagoa Rodrigo de Freitas. (Tânia Rêgo/Agência Brasil)
Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS – O número de quilombolas no Amazonas está subnotificado, afirmou a presidente da Associação Criolas e membra da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) no Estado, Keilah Fonseca, à REVISTA CENARIUM, sobre os dados divulgados nesta quinta-feira, 27, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O Censo 2022 indica 2.705 quilombolas no Amazonas.

Essa foi a primeira vez que o Censo investigou o grupo, integrante dos povos e comunidades tradicionais reconhecidos pela Constituição de 1988. Fonseca afirma que o Censo não reconheceu, como quilombolas, pessoas que residem fora de territórios delimitados.

O quantitativo de pessoas quilombolas no estado do Amazonas é muito maior do que esse número representado ali. Nós sabemos disso porque esse Censo só agregou as pessoas que estavam dentro do território identificado como quilombola, e as pessoas que moram em ramificações, ou seja, por exemplo, meu irmão que é quilombola e mora no Morro da Liberdade [zona Sul de Manaus] não entrou como quilombola, porque ele não estava no perímetro da Comunidade do Barranco“, conta ela.

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Quilombo do São Benedito, em Manaus. (Arquivo pessoal)

O Quilombo do Barranco de São Benedito fica localizado no bairro da Praça 14, em Manaus, Amazonas, fundado pela escrava alforriada Maria Severa Nascimento Fonseca, a “Vó Severa”, natural de Alcântara, no Maranhão. A CENARIUM questionou o instituto sobre a notificação e aguarda resposta.

Segundo Fonseca, são 170 famílias reconhecidas como quilombolas pelo Quilombo de São Benedito. Destas, 45 famílias, cerca de 350 pessoas, vivem na localidade. Os outros residem no que se referem como “ramificações”, ou seja, outras localidades de Manaus e até do Brasil.

O número de quilombos aqui no Amazonas são quase 6 mil, a maioria não é reconhecida. Sabemos que é quilombo, mas não é reconhecido pela Fundação Palmares. Então, ainda existe muito a pesquisar, um trabalho a ser feito“, defende ela, lembrando ainda que há o desafio de fazer as pessoas se reconhecerem como pretas e quilombolas.

Nós realizamos aqui na comunidade esse trabalho de formiguinha da aceitação, fazemos esse trabalho de letramento racial e educacional dentro da comunidade, no qual você tem que se aceitar. Você tem fenótipos preta, apesar de não ter a pigmentação mais escura, mais retinta, você é preto“, conclui.

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25.mai.21 – Maria Amélia, do quilombo Santa Tereza do Matupiri, em Manicoré, no Amazonas. (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
Norte quilombola

No Amazonas, são cinco os territórios quilombolas reconhecidos: quilombos no município de Barreirinha, no interior do Amazonas; Quilombo do Tambor, em Novo Airão; Quilombo do Sagrado Coração de Jesus, em Itacoatiara; e o Quilombo do Barranco de São Benedito.

O quilombola e pesquisador Vinicius Alves da Rosa pontua que os quilombos do Amazonas são originados, principalmente, de africanos livres e escravos alforriados oriundos de outras regiões do País. “A comunidade [Barranco de São Benedito] se constitui com a migração maranhense, são homens e mulheres negros que chegam na Praça 14 no final do século 19. Que se origina a partir de uma escrava alforriada que chega em Manaus, com seus filhos, e fixa residência ali“, conta.

Já no lago de Serpa [comunidade Sagrado Coração de Jesus], o mito de origem é que se constitui a partir da chegada dos africanos livres, em 1857. São africanos enviados para o Barão de Mauá, que era um empresário, proprietário da Companhia de Navegação do Amazonas. Ele recebe esses africanos livres pra trabalhar na suas comunidades“, conta.

Para ele, apesar da subnotificação, os números mostram que a Região Norte concentra considerável número desses povos tradicionais, além dos indígenas e ribeirinhos, por exemplo. “O Norte é quilombola. O Amazonas tem uma população quilombola que pode estar subnotificada no censo oficial“, acrescenta.

Censo 2022

Segundo o IBGE, foram identificados 494 territórios quilombolas oficialmente delimitados no Brasil, que abrigam 203.518 pessoas, sendo 167.202 quilombolas (82,16%) e 36.316 (21,72%) não quilombolas. Destes, 12,6% dos quilombolas do país residiam em territórios oficialmente delimitados e 87,4% encontravam-se fora de áreas formalmente delimitadas e reconhecidas.

Os Estados com as maiores proporções de quilombolas em territórios delimitados são Amazonas (45,43%), Sergipe (45,24%) e Mato Grosso do Sul (44,97%). Os percentuais mais baixos são de Alagoas (1,83%), Minas Gerais (3,38%) e Bahia (5,23%). 

Nos municípios dos Estados da Amazônia Legal (Amazonas, Amapá, Acre, Roraima, Rondônia, Pará, Tocantins, Maranhão e Mato Grosso), encontravam-se 426.449 pessoas quilombolas, o que representa 1,6% da população residente na região e 32,11% do total de quilombolas do Brasil. 

Na região, foram recenseados 80.899 quilombolas em Territórios Quilombolas oficialmente delimitados, o que representa 48,38% da população quilombola nacional que reside em áreas oficialmente delimitadas. Além disso, enquanto na Amazônia Legal 18,97% da população quilombola reside em territórios delimitados, no total do país, esse percentual é de 12,6%.

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