Justiça determina adequação de CPF e reconhecimento dos múltiplos arranjos familiares

Mulher trans mostra certidão e RG (Reprodução/Governo do Estado do Ceará)
Da Revista Cenarium*

BRASÍLIA (DF) – A Justiça Federal condenou a União a adequar os formulários relacionados ao Cadastro de Pessoa Física (CPF), reconhecendo a multiplicidade dos arranjos familiares e de identidades de gênero, assim como a existência da intersexualidade. A medida atende pedido do Ministério Público Federal (MPF) feito em ação civil pública conjunta com a Defensoria Pública da União (DPU) e entidades representativas do público LGBTQIAPN+. O prazo concedido para adequação dos formulários é de 180 dias, considerando atendimentos on-line e presencial.

Na sentença, a 5ª Vara Federal de Curitiba determinou a substituição do campo “nome da mãe” por filiação – para contemplar famílias com duas mães ou dois pais, por exemplo – assim como a inclusão das opções “não especificado”, “não binário” e “intersexo” no campo “sexo”. Além disso, deverá ser garantida ao cidadão a possibilidade de retificar os dados já existentes no documento. “A negação, mesmo que indireta, do Estado em reconhecer a condição de pessoas que não se identificam com os gêneros masculino e feminino, representa, por si só, discriminação, reforçando o estigma social”, reconhece a decisão.

Justiça. Ao fundo, foto de uma pessoa segurando a bandeira que representa a comunidade LGBTQIAPN+. Em primeiro plano, sobre essa outra imagem, a foto de uma mão segurando um cartão de CPF (Reprodução/TRF4)

Segundo as instituições autoras da ação civil pública, apesar de o CPF ser um importante instrumento na vida de brasileiros e estrangeiros residentes no País, no modelo atual de formulário para emissão do documento, há obstáculos ao reconhecimento da dignidade das pessoas que integram a comunidade LGBTQIAPN+. “A sistemática de confecção do documento atual está absolutamente descompassada com normas internacionais e com o ordenamento jurídico pátrio, por gerar o fenômeno da discriminação indireta contra as famílias LGBTI+, pelo efeito discriminatório que gera sobre elas”, apontam na inicial da ação. O modelo está baseado em uma lógica antiga, pressupondo a existência de uma mãe no vínculo familiar, o que prejudica famílias que não seguem esse modelo.

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Ao acolher o pedido, a Justiça considerou ser flagrante o dever do Estado de reconhecer as relações homoafetivas e, consequentemente, a parentalidade homoafetiva, nos mais variados planos de atuação. “A disponibilização de campos de dados, permitindo a declaração de tais situações, em documentos públicos, não representa formalismo, mas expressão de tratamento digno e isonômico, sem discriminar a orientação sexual dos indivíduos”, destaca a decisão. Na ação, o MPF e as demais instituições lembram que a união homoafetiva é reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como núcleo familiar desde 2011.

Inclusão

A ação civil pública foi ajuizada em setembro de 2021, a fim de garantir que as famílias de parentalidade homotransafetiva, formadas por pessoas LGBTQIAPN+, sejam reconhecidas pela Receita Federal no registro do Cadastro de Pessoas Físicas (CPFs) em sua orientação sexual, identidade de gênero e condição de intersexo.

Em julho de 2022, foi firmado um acordo com a Receita Federal para garantir a inclusão, alteração e retificação do nome social, no CPF, a partir de formulário on-line. Para isso, a Receita Federal firmou convênio com a Associação Nacional dos Cartórios a fim de que a alteração realizada nos registros de nascimento nos cartórios fosse retificada, automaticamente, na base de dados do CPF, a partir da comunicação do cartório.

Leia mais: Brasil tem número crescente de leis que buscam reprimir direitos de pessoas trans
(*) Com informações do Ministério Público Federal
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