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MPF pede cancelamento de audiência pública da Eneva por falta de transparência
Trabalhadores da Eneva observam duto de gás. (Imagem: Divulgação/ Eneva)
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01 de setembro de 2023
Da Revista Cenarium Amazônia*
MANAUS (AM) – O Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) e à empresa Eneva S/A que cancele as audiências públicas convocadas para este fim de semana, com o objetivo de apresentar o projeto de instalação da Usina Termelétrica Azulão na Bacia do Amazonas. Apesar das irregularidades apontadas pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) no processo de licenciamento ambiental do empreendimento, na consulta aos povos indígenas e tradicionais da região, as reuniões foram agendadas para este sábado (2) e domingo (3), nos municípios de Silves e Itapiranga, cidades impactadas pelo empreendimento.
O projeto prevê que a nova usina de exploração de gás seja instalada a 200 km de Manaus (AM), no município de Silves, com potencial impacto na vida de aproximadamente 190 famílias indígenas e nas comunidades tradicionais que vivem na região, como populações ribeirinhas e extrativistas. Na recomendação, o MPF, na mesma linha que Funai e MPI, pede que as audiências sejam suspensas até que seja elaborado o Estudo de Componente Indígena (ECI), procedimento obrigatório para a concessão de licença ambiental, que busca garantir o direito dos povos indígenas impactados pelo empreendimento. Também orienta que o debate só seja convocado após a realização de consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas e comunidades tradicionais da região, conforme prevê a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
O adiamento das audiências é necessário, segundo MPI, Funai e MPF, diante do risco de acirramento de conflitos e ameaças contra os povos indígenas e tradicionais da região. Além disso, conforme aponta a recomendação, não foram disponibilizadas à população local as informações necessárias para uma efetiva participação democrática e transparente nas audiências, nem há motivo de urgência para justificar a realização do evento neste final de semana. O documento foi enviado nesta sexta-feira (1) ao Ipaam e à Eneva S/A, empresa responsável pela usina. Ambos têm 24 horas, a contar do recebimento da notificação, para informar se vão acatar a recomendação e encaminhar ao MPF esclarecimentos detalhados acerca das providências adotadas.
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A medida tomou por base informações colhidas no inquérito conduzido pelo MPF sobre os possíveis impactos a povos indígenas e comunidades tradicionais decorrentes da exploração.
de petróleo e gás na Bacia do Amazonas. Outro procedimento em trâmite no Ministério Público acompanha o processo de criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Saracá-Piranga, no município de Silves – onde a termelétrica pretende ser instalada juntamente com todo o complexo do Azulão – e a garantia dos direitos das comunidades envolvidas.
Desde 2022, indígenas e populações tradicionais apontam uma série de problemas referentes à implantação do “Complexo Azulão” na região. Eles reclamam que não foram consultados sobre o projeto, o que contraria a Convenção nº 169 da OIT. O artigo 6º do normativo, incorporado à legislação brasileira, determina aos governos o dever de consultar previamente e respeitando a cultura de cada população, povos indígenas e tradicionais em qualquer caso de medidas administrativas ou legislativas que potencialmente afetem seus interesses. O problema levou duas associações locais a ajuizarem ação civil pública na Justiça exigindo a realização da consulta e do estudo de componente indígena.
Além de não terem informações sobre as decisões referentes à implantação projeto, as comunidades carecem de esclarecimentos acerca de eventuais impactos nos seus modos de vida, bem como sobre medidas compensadoras, mitigadoras ou indenizatórias. O MPF também recebeu informações do Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos do Amazonas (PPDDH/AM) e de lideranças da região sobre pressões e ameaças recebidas por indígenas e representantes de povos tradicionais locais, em razão das críticas à construção do empreendimento.
As populações afetadas reclamam, ainda, que não foram informadas sobre a realização das audiências deste final de semana, o que demonstra a ausência de publicidade e transparência do tema, conforme aponta o MPF no documento. O Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) publicado na página do Ipaam menciona apenas os territórios indígenas homologados na região, sem fazer qualquer referência aos demais territórios indígenas e tradicionais existentes no município de Silves e Itapiranga potencialmente impactados pela termelétrica.
Órgãos federais
Após ser questionada pelo Ministério Público, a Funai confirmou que não foi elaborado estudo sobre os impactos ambientais e sociais do empreendimento na vida das populações indígenas da região, nem realizada consulta prévia e informada nos moldes do previsto pela OIT. A Funai também informou que pediu ao Ipaam e à Eneva S/A, em junho deste ano, as documentações necessárias para a verificação do perímetro completo das atividades e as distâncias em relação às terras indígenas, mas que até o momento não obteve resposta. No início deste mês, a Funai reiterou à empresa e ao instituto ambiental do Amazonas a necessidade de suspender o processo de licenciamento ambiental em razão das irregularidades.
Na última quarta-feira (30), o Ministério dos Povos Indígenas também enviou ao Ipaam, à Eneva S/A e às prefeituras de Silves e Itapiranga ofício alertando sobre as graves irregularidades detectadas e solicitou o cancelamento das duas audiências públicas deste fim de semana. De acordo com o órgão, a ausência de informações adequadas sobre o empreendimento inviabiliza a realização do evento.
Segundo o MPI, os problemas têm impedido a participação efetiva nos debates das etnias Mura, Munduruku e Gavião, assim como de integrantes das Aldeias Vila Barbosa, São Francisco, Curuá e Mura-Karará. O Ministério ressalta, ainda, o clima de aflição e incerteza nas aldeias e o acirramento de conflitos na região, em razão da falta de informações concretas sobre a implementação do Complexo do Azulão.
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