No Dia de Combate à LGBTfobia, casais homoafetivos celebram união e relatam luta contra preconceitos

Em 2013, o CNJ proibiu que cartórios dificultassem os casamentos. (Divulgação)
Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS – A autorização para união civil estável em cartórios no Brasil completou dez anos com os números de casamentos homoafetivos em constante ascensão. Em parte da Amazônia — Estados do Pará, Mato Grosso e Amazonas — foram registrados 3.552 casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Em 2013, foram “apenas” 61 uniões.

Nesta quarta-feira, 17, Dia de Combate à LGBTfobia, casais homoafetivos ouvidos pela REVISTA CENARIUM comemoraram a primeira década da conquista, mas relembram os desafios, principalmente preconceitos, enfrentados para celebrar o amor.

Os números constam na Central de Informações do Registro Civil (CRC Nacional). Dos três Estados, o Pará foi o que contabilizou o maior número, até abril de 2023: foram 1.435 casamentos. Mato Grosso e Amazonas registraram 1.173 e 944, respectivamente.

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De acordo com Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais, que responde pelos cartórios, em 2013, primeiro ano de obrigatoriedade nacional, ocorreram 3.700 celebrações em todo o País. Já em 2022, foram 12.987.

André Porto Faleiros (à esquerda) e Murilo Faleiros no casamento, em 2017. (Reprodução/Instagram)

Um desses casais é dos empresários André Porto Faleiros e Murilo Faleiros, casados há seis anos e com quase 13 anos de história. Com a cerimônia feita apenas para a família e amigos, os ataques surgiram após a celebração, por meio das redes sociais.

“Nosso casamento saiu em algumas mídias e jornais e lá tiveram comentários homofóbicos. Estávamos cercado só de coisas boas e saber que existia gente querendo o mal ou torcendo contra foi um choque de realidade”, conta André.

André e Murilo: matrimônio aconteceu em 2017. (Reprodução/Instagram)

Segundo André, além da união civil assegurar direitos básicos inerentes a qualquer casal após o matrimônio — divisão de bens, plano de saúde — o casamento representou conquista de uma luta histórica.

“No início, o casamento foi para gente, porque não fazia sentido não comemorar e celebrar o nosso amor, mas depois entendemos que o que fizemos foi representativo e muitos que acham que talvez não pudessem, tinham um exemplo de que era possível”, afirmou.

Fortalecimento da relação

Keicyane Neves e a companheira Emily Athayde se uniram há 11 anos, mas foi somente em 2015 que formalizaram oficialmente a união. Elas viram, no casamento, uma forma de fortalecer a relação. Elas casaram em uma cerimônia coletiva, no dia 22 de julho.

“Em 2015, fizemos nossa primeira viagem juntas, foi tudo incrível. Quando voltamos da viagem, vimos uma reportagem que haveria um casamento coletivo tanto heterossexual quanto homoafetivo, na OAB [Ordem dos Advogados do Brasil]. Foi então que decidimos fazer parte dessa história, nos cadastramos, participamos da reunião. Nosso coração transbordava de alegria, pois iríamos fortalecer mais ainda nossa relação”, contou.

Keicyane Neves (à esq) e Emily Athayde se casaram em 2015. (Arquivo Pessoal)

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Apesar da certeza da união, o relacionamento também teve seus desafios. Comentários homofóbicos já foram direcionados às duas, e Emily já chegou a ser agredida por causa da orientação sexual. “Teve gente que quando ficou sabendo da orientação sexual dela disse: ‘Ah, tudo bem, eu te aceito, mas não faça nada na frente do meu filho’, como se a gente fosse influenciar a criança a ser alguma coisa”, contou Keicyane.

“Antes de se relacionar comigo, ela já foi agredida [por um familiar] porque viu ela almoçando com outra moça, deu chutes nela. Na rua, a gente não sofre esse tipo de preconceito, a gente é muito reservada porque a gente sabe como é a maldade humana e assim a gente vai superando, mas isso não atinge o nosso amor. Quanto mais a gente vê essas coisas, mais o nosso amor fortalece”, disse ainda.

Keicyane Neves e Emily Athayde enfrentam, diariamente, os desafios da união homoafetiva. (Arquivo Pessoal)

Aumento constante

A Resolução 175, publicada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), proíbe as autoridades competentes de se recusarem a habilitar, celebrar casamento civil ou de converter união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo.

No primeiro ano da autorização nacional, o Pará contou com 25 celebrações. Em 2023, até o mês passado, foram 124 casamentos. No Mato Grosso, naquele ano, foram 29 celebrações. Neste ano, 136 uniões. Por fim, no Amazonas, apenas sete casamentos foram oficializados em 2013, contra os 99 casamentos em 2023.

“O casamento entre pessoas do mesmo sexo é mais uma conquista cidadã que é celebrada nos Cartórios de Registro Civil do Brasil”, destaca o presidente da Arpen-Brasil, Gustavo Fiscarelli. “É aqui que nascem os direitos dos cidadãos brasileiros, como seu primeiro registro e como a Certidão de Nascimento, e também é aqui que nasce esta nova família brasileira, formada por pessoas que se amam e que tem seu direito de convivência assegurado com o casamento civil”.

Até a publicação da Resolução 175, os cartórios eram obrigados a solicitar autorização judicial para celebrar os casamentos, que muitas vezes eram negados pelos magistrados pela ausência de lei, até hoje não editada pelo Congresso Nacional, mas superada pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em 2011, equiparou as uniões estáveis homoafetivas às heteroafetivas.

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